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Márcio Antonio Nono

Diretor Agrícola da Usina Diana

Op-AA-56

Queimada controlada & doenças e pragas
As regiões canavicultoras foram se adaptando à realidade da colheita de cana crua em diferentes momentos. Regiões tradicionais como Piracicaba e Ribeirão Preto foram as primeiras a enfrentar a situação. Implantaram a colheita mecanizada de cana crua com ênfase e, consequentemente, enfrentaram os problemas de desequilíbrio nutricional e fitossanitários. 

O ataque das cigarrinhas foi a primeira surpresa! Atualmente, praticamente todas as regiões que estabeleceram a colheita mecanizada de cana crua como procedimento enfrentam os problemas desse desequilíbrio. Tornar esse ambiente equilibrado fitossanitária e biologicamente é o desafio do setor.

Considero 3 pilares para o manejo integrado de pragas e doenças como caminho para o sucesso: nutrição, viveiros sadios e equilíbrio ecológico dos canaviais. O manejo integrado de pragas e doenças é um grande desafio, é uma mudança de cultura, quebra de paradigma. A cana era “facilmente” cultivada; plantio em épocas definidas, safra mais curta que a atual, adubação, herbicida e era só. Disse “facilmente” porque, hoje, as coisas se complicaram e, a exemplo dos cereais, temos que ficar atentos a todas as etapas de produção, começando pelo velho e bom planejamento.
 
Esse manejo integrado a que me refiro inicia-se na nutrição das plantas.  Os solos brasileiros, de maneira geral e principalmente nas áreas de expansão do setor, são pobres nutricionalmente. Nesse caso, temos que trabalhar na correção e no balanço nutricional, buscando não só os macro, como também os micronutrientes, principalmente Mn, Cu, Zn e B. Podemos contar com eles na proteção 
das plantas. 
 
É comprovado o efeito na manutenção da integridade das membranas e na formação de compostos fenólicos, a exemplo da lignina e das fitoalexinas. O uso racional de torta de filtro e de vinhaça, que são nossos subprodutos, ou qualquer fonte de adubação orgânica, deve ser implementado (embora nem sempre esses resíduos tenham o equilíbrio nutricional exigido pela cultura e devam ser complementados com os químicos) para incrementar a matéria orgânica que é responsável por estimular a atividade biológica no perfil do solo.  A nutrição das plantas é a base para canaviais sadios e produtivos.
 
Outro ponto importante é o planejamento para manter viveiros de mudas, procedimento respeitadíssimo nos anos 1980 e 1990 e esquecido (ou menosprezado) na última década. Temos que voltar a respeitar a resistência genética que a variedade nos traz e montar viveiros com tecnologia suficiente para nos livrar de doenças nessa fase do processo. 
 
As MPB (mudas pré-brotadas) nos ajudaram muito nisso e, apesar do custo unitário alto, podemos abatê-lo montando viveiros estratégicos em áreas de reforma com 2 anos de antecedência (com o bom planejamento), aumentando a taxa de multiplicação dessas mudas do atual 1:8 para 1:70, ou até mais. A garantia de trazermos variedades atuais, com vigor e sanidade, é imprescindível. Além disso, tornam-se novamente importantes os viveiros básicos e primários, optando-se pelo uso de tratamento térmico. Devemos ter o cuidado de treinamento de equipes para a confecção de roguing nos viveiros.
 
O equilíbrio ecológico deve ser restabelecido com o uso racional de defensivos químicos e a introdução dos bioquímicos e naturais. Empresas constataram que o microambiente proporcionado pela palha com a manutenção de umidade torna-se agradável a pragas e a doenças, roubando o ATR/hectare. Essa palha, que se acumula ano após ano, mantém e preserva os ovos e os esporos, e, mesmo com o recolhimento para virar energia elétrica e/ou a colheita da cana integral, o remanescente permanece no terreno.

Nesse cenário, acredito que a microbiologia e a fitopatologia devem ajudar os canaviais. Temos que fomentar as instituições e os profissionais de pesquisas nesse cenário (de fungos benéficos; inimigos naturais; bioquímica) – e tem que ser a virada de página. Noto que o esforço e o apelo nessa linguagem dos naturais e dos bioquímicos têm avançado. Muitas empresas estão preocupadas buscando soluções e produtos que nos auxiliam desde a brotação e o enraizamento até o controle efetivo das doenças e das pragas. A bioquímica deve nos ajudar inclusive no combate às doenças fúngicas, que não respeitam a resistência de variedades e estão no nosso convívio.  O uso de fungicida passou a ser necessário, mas não deve ser a única solução.   
 
Cito de maneira resumida as principais doenças que preocupam o setor e as principais intervenções aplicadas atualmente:
• Podridões: doenças fúngicas, talvez com o Colletotrichum falcatum como o principal causador e que atinge praticamente todas as variedades comerciais, que apresenta difícil controle e falta de estudos para conhecimento da fisiologia e modo de ação; há a importância do uso dos 3 pilares que citei acima para maior efetividade no combate e monitoramento para possível antecipação de colheita.  
• Bactérias, como a estria vermelha na RB 86 7515 e na RB 83 5453; podem-se evitar com o uso de variedades resistentes e manejo dos ambientes de produção.
• Doenças de folhas: principalmente a ferrugem alaranjada (Puccinia kuehnii), se restringe às variedades sensíveis, principalmente a SP 81 3250, e tem aplicações de fungicida com controle eficiente. Deve-se atentar para o uso racional de variedades tolerantes que atingem notas acima de 3 na escala de nível de dano.
• Carvão: pode preocupar novamente; a quantidade de inóculo vem aumentando, e variedades tolerantes acabam apresentando-a. Atenção com as variedades!
• Mosaico e a escaldadura são doenças importantes, que, em maior ou menor grau, têm sido controladas pelos programas de melhoramento através da seleção de variedades resistentes.
E as principais pragas:
• Broca-da-cana: possui métodos de controle eficientes, com o uso de inimigos naturais (cotésia e trichograma) e de inseticidas. Tem aumentado a pressão de ataque pela negligência do setor.  Favorece os danos causados pelo Colletotrichum.
• Sphenophorus levis: o bicudo-da-cana se apresenta em praticamente todas as áreas canavieiras. Cuidados na avaliação das mudas (para não transportar a praga de uma área a outra) evitam a disseminação. O preparo de solo destruindo as socas para o plantio e o controle químico no corte de soqueiras são medidas de controle que, quando usadas em conjunto, apresentam eficiência.
• Migdolus fryanus: com ataques em manchas, devem ser mapeados para efetivo controle na época de preparo de solo e adequar o manejo de colheita precoce para evitar morte das soqueiras.
• Cigarrinha-das-raízes (Mahanarva fimbriolata): deve ser monitorada e controlada preventivamente, de acordo com o histórico da área, por via terrestre, preferencialmente, com maior eficiência no controle químico. Deve-se introduzir e monitorar a presença de Metarizhium anisopliae para incrementar o manejo integrado e aumentar a população desse importante inimigo natural da praga. Tem sido relacionada como potencializadora no ataque do Colletotrichum.
 
Saliento que visitas ao campo por técnicos responsáveis pela produção é importantíssimo. Saber identificar sintomas de doenças, deficiências nutricionais, ataques de pragas e atuar imediatamente são ações que não podem ser deixados de lado. O uso das tecnologias modernas (softwares, apps, tratamento de imagens de satélites, drones) é importante, mas não deve nos tirar do campo. Treinar equipes, retomar procedimentos adequados à produção. Incentivar a tomada de decisão. Planejar e aplicar as técnicas no momento correto e com capricho são diretrizes para se retomar o caminho da produtividade. 
 
A avaliação periódica e sistemática dos canaviais deve ser rotina. O momento correto para intervenções no controle de pragas e doenças se tornou fundamental para a cultura.