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Raphaella Gomes

CEO da Raízen Biogás

AsAA22

A energia e o progresso
Desde os primórdios da humanidade que energia e progresso estão intrinsicamente interligados. Cada salto evolucionário foi balizado numa nova fonte de energia, desde a descoberta do fogo há 400 mil anos, passando pela revolução agrícola há 10 mil anos, com o domínio da força motora de animais e da energia da água e do vento, até ao uso de combustíveis fósseis na Revolução Industrial no final do século XIX. Ao longo da nossa jornada civilizatória, o acesso a uma fonte de energia acessível, eficiente e confiável suportou o aumento do crescimento populacional, o desenvolvimento tecnológico e até permitiu que a humanidade se aventurasse na exploração espacial.
 
Infelizmente, esse progresso não veio sem custo. Hoje, entendemos que a queima de grandes quantidades de combustíveis fósseis aumentou a quantidade de CO2 no ar em níveis que o planeta não consegue mais equilibrar.

Reconhecendo o impacto dessa situação, o mundo se uniu para enfrentar o problema, e, em 2015, foi assinado o Acordo de Paris. Nele, os países se comprometeram a manter o aquecimento global abaixo de 2 °C, alcançando a neutralidade de carbono até 2050. Na COP26, realizada em 2021, os países concordaram em ir além do acordo, limitando o aquecimento global a 1,5 ºC.  

Para atingir essas metas, o mundo precisa enfrentar três enormes desafios: (1) limpar a matriz energética; (2) garantir que as (crescentes) necessidades de energia sejam atendidas por fontes renováveis; (3) não desestabilizar o fornecimento de energia e a potência de base, garantindo acesso justo de energia para todos. 

Não são tarefas fáceis. Para uma sociedade baseada em combustíveis fósseis, isso significa mudar a essência de como fazemos as coisas. Da produção, transmissão e distribuição de energia aos sistemas econômicos e hábitos e consumo, tudo precisará ser adaptado se quisermos abraçar o caminho para essa nova realidade. 

No Brasil, segundo dados da EPE de 2020, a matriz energética é quase 50% renovável, sendo a matriz elétrica 83% renovável, com grande participação de hidro (mais de 65%), térmicas a biomassa e energia eólica e solar (~10% e 6%, respectivamente). Comparado à matriz energética mundial, que possui apenas 14% de fontes renováveis, o Brasil já é uma referência.

Solar e eólica, apesar do custo competitivo, são fontes intermitentes não despacháveis, ou seja, quando não há sol ou vento, não há geração de energia elétrica. Por isso, elas precisam ser complementadas por outras fontes renováveis ou por soluções de armazenamento.

A biomassa é um ótimo complemento às fontes intermitentes. A energia térmica a partir da queima da biomassa já é utilizada no Reino Unido, Holanda, Alemanha e Japão. No Brasil, a geração de energia elétrica a partir da biomassa representa quase 10% da matriz elétrica e, segundo a Unica – União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia, apenas no primeiro semestre de 2020, evitou-se a emissão de 2.8MM toneladas de CO2, equivalente a 20 milhões de árvores por 20 anos. 

Os resíduos agrícolas também podem ser destinados à produção de biogás, um biocombustível gerado a partir da biodigestão da matéria orgânica. Segundo dados da ABiogás (Associação Brasileira de Biogás), o Brasil possui um potencial de produção de biogás de ~120MM m3/dia, comparável à oferta de gás do Pré-sal, o que levou o biocombustível a ser apelidado de “Pré-sal caipira”. 

O biogás pode ser utilizado para diversas aplicações, como a geração de energia elétrica ou como metano renovável para substituição de combustíveis fósseis, como o gás natural, GLP, diesel, óleo combustível (com redução de emissões de até 95%), ou ainda como insumo para a produção de hidrogênio, amônia verde e biometanol.

O Brasil também é um dos maiores produtores de etanol, com uma produção de aproximadamente 30 bilhões de litros por ano, e possui a maior frota de veículos flex-fuel (~80%) do mundo. Quando comparado à gasolina, o etanol reduz mais de 80% das emissões de CO2.

A realidade é que não há uma resposta única e certa para a transição energética, e, qualquer que seja o caminho, só há uma certeza: a de que precisamos ir mais rápido. No Brasil, já temos inúmeros exemplos de energia renovável abundante e eficiente, que, além de descarbonizar a nossa matriz energética, pode apoiar o mundo rumo à próxima revolução.