Presidente da ABAG e Diretor da Canaplan
Op-AA-44
Eram os primeiros ventos no início do século XXI, a oferta de etanol estagnada no Brasil e uma luta incrível do setor privado canavieiro em despertar o Governo FHC para definir políticas ao etanol. O setor havia sido totalmente desregulado, e havia somente a política da mistura do etanol anidro na gasolina na forma de lei (Governo Itamar, em 1992). Com a desregulamentação ocorrida em face da superprodução, o setor vinha sofrendo, sem perspectivas, somente com crescimento do açúcar e baixos preços internacionais.
Foi um horror. Sob a liderança e a pressão do Governo Covas (SP), o Presidente FHC lança, após o relatório da Comissão Nacional Público-Privada, sob a coordenação do Ministro da Indústria e do Comércio, Celso Lafer, as políticas públicas de 2002. O que acontece, com isso, foi o estímulo à atuação privada, com a indústria lançando o carro flexível em 2003, e, assim, um novo ciclo virtuoso na agroindústria da cana-de-açúcar. No nível federal, a Frente da Defesa do Etanol atuando no difícil momento econômico do País dava o respaldo do Legislativo ao Executivo, até porque participavam juntos da citada Comissão Nacional.
Transformou-se uma longa crise em um longo seguinte período virtuoso. As bases para isso foram o relacionamento das externalidades positivas do etanol (lançamento da Cide, menor imposto ao carro flexível, fim dos subsídios ao hidratado e liberdade ao produtor) e maior competitividade na produção. Nesse período, após janeiro de 2004, os preços do petróleo iniciam uma subida espetacular, indo de US$ 30/b a US$ 70/b em 2006 e a US$ 140/b em 2008.
Houve forte crescimento do consumo mundial do petróleo com fraca expansão da oferta, após anos de preços baixos, com o comando da Ásia no crescimento econômico mundial, principalmente China, além dos EUA. Era um período com uma característica diferente, pois a subida dos preços do petróleo e das commodities parecia não abalar inflação e economias, como em crises de oferta anteriores.
A visão do controle das emissões de carbono (aquecimento global) associada ao etanol extremamente competitivo do Brasil e à bioeletricidade competitiva do bagaço da cana gerou a “Arábia Saudita Verde” das Américas, com enorme volume de capital estrangeiro aplicado no setor canavieiro brasileiro nas suas regiões Centro-Oeste e Sudeste. Tudo isso sob a política de FHC e os discursos positivos do Lula, então verdadeiro defensor da bioenergia (sob a inspiração do seu Ministro Roberto Rodrigues).
Em 2007, o Governo Lula anuncia a descoberta do pré-sal (campo de Tupi). Entre as falas oficiais do Governo Lula, “o Brasil será exportador de petróleo com uma capacidade que ainda não foi dimensionada, e, além disso, tem recursos alternativos para sua sustentabilidade, a previsão do governo brasileiro é a de aumentar a produção de etanol em mais de 150% até 2020; o gigante adormecido acordou, investe no futuro e tem fortes possibilidades de ser a próxima Arábia Saudita, mas Verde”.
Com preços subindo vertiginosamente desde 2004, a partir de 2007, no imbróglio de uma nova regulação, de partilha de produção de petróleo, com a Petrobras sendo operadora em todos os contratos de partilha (mínima de 30%) no consórcio contratado, nova empresa pública e mínimo elevado de produto nacional, com o BNDES elegendo os campeões nacionais em campos escolhidos, com subsídios, em fase de superciclo de commodities em alta, o céu era o limite.
Pois bem, veio 2008, e o inferno abriu as suas portas. A reação do Governo Lula foi falar da “marolinha” que seria a crise no Brasil, além de iniciar forte flerte com uma nova matriz econômica que enfeitiçou o voto popular, na esteira dos subsídios aos mais necessitados e ao consumidor, o novo integrante de uma classe social tão buscada. Seria um ciclo invencível. Tinha o Brasil energia; alimentados nas várias regiões; empregos; boa imagem internacional e forte presença no setor de commodities.
Resolveu montar 4 refinarias novas de petróleo, além de comprar também no exterior. Resolveu apoiar o bolivarianismo e acabar com o problema no Irã. Não fez acordos comerciais com terceiros países. Tudo isso ocorreu em sequência a estudos realizados nos EUA sobre um quadro de escassez do petróleo convencional. Os preços subiram ainda mais. Os impactos de mídia internacional levaram o Cristo Redentor para a capa da The Economist, subindo como um foguete.
Pouco tempo depois, em nova capa, perdia o voo e voltava; logo em seguida, o Brasil atolado no pântano. O que aconteceu? Qual seria o novo Brasil, em nova matriz econômica e com inúmeras frentes de combate e, obviamente, com limitações físicas, financeiras, de coordenação e com populismo?
1. Menor prioridade inicial ao renovável... cada vez menor... medo da inflação e congelamento dos preços da gasolina, até zerar a Cide. Culpa do produtor de etanol que não conseguiu mais ter margem com custos subindo?
2. Sangrando a Petrobras, sem capacidade de dar conta de insanidade e ainda vivendo um caos de desmandos e corrupção, hoje claramente avaliados.
3. Atraso no pré-sal; estagnação do etanol.
Enquanto isso, o Brasil travou sua produção de cana, e a Ásia passou a subsidiar (Índia e Tailândia, em especial) o açúcar, crescendo sobre o Brasil em fase de preços baixíssimos no mercado internacional. As perspectivas para 2015 são ainda de preços baixos do açúcar, e os do etanol dependerão do que acontecerá com os preços da gasolina. O futuro a Deus pertence: Uma nova realidade energética se impôs de forma definitiva.
Os EUA e gás e petróleo assumiram a liderança, e a expansão da oferta (shale/tight) e os preços caíram fortemente, juntamente com o novo ciclo de baixa das commodities agrícolas e minerais. Vive-se, portanto, uma nova realidade energética. O velho olhar: A primeira iniciativa de divulgação do álcool no Brasil foi promovida pela Sociedade Nacional da Agricultura (SNA), em outubro de 1903 – Exposição Internacional de Aparelhos de Álcool e, paralelamente, o Congresso Internacional de Álcool –, com o objetivo de apresentar propostas para ampliar o uso do produto na matriz energética, destacando sua utilização em veículos automotores.
Em 1922, o presidente Epitácio Pessoa criticou a dependência brasileira de gasolina importada e propôs sua substituição pelo álcool, prevendo que efeitos positivos seriam sentidos pela indústria canavieira. Entre 1937 e 1941, leis e decretos incentivaram a produção de álcool anidro e, em 1941, o teor de mistura desse produto na gasolina passou a ser de 20%. Desde 1933, já havia o IAA.
Até 1972, o setor canavieiro nacional não era competitivo, só a partir daí, com a criação dos programas de P&D e dos programas de modernização do parque industrial e, em seguida, com o Proálcool. Segundo estudos do Pery F. A. Shikida, em “Evolução e Fases da Agroindústria Canavieira do Brasil”, três são as principais fases da oferta de etanol pós-Plano Real (1993/1994):
• Adormecido (1995/96 a 2002/03) – 1995 = 2002
• Revolução Flex (2003/04 a 2008/09) – 2008 = 2 x 2003
• Incerteza/Estagnação (2009/10 a 2013/14) – 2013 = 2010
O fato é que a produtividade setorial despencou. A fase atual (incerteza/estagnação) é função das citadas agruras grosseiras do último Governo Federal. As mudanças que abalaram as convicções do empresariado do setor são muito mais profundas que as crises de antes e de difícil retorno. Não se trata de acreditar, ou de ter esperanças no modelo de gestão de governo.
O Brasil das ruas, nos movimentos sociais, tem mais força que a desordem de 39 Ministérios e de um agronegócio canavieiro dividido em 5 deles. O Brasil perde a sua capacidade de engenharia no setor de bens de capital para açúcar e etanol e se torna vítima de uma ocupação política de domínio, não de transformação. A luta política pelo enfraquecimento do Governo Federal após 3 meses eleito (!!!) não dará espaço à lógica econômica, impactando-se mutuamente e fragilizando-se também.
Tem que se contar com suas próprias pernas, coragem e determinação. O negócio, agora, é privado e é de produtividade. Há que se reduzir custos à espera da volta dos preços, pois o governo completou suas medidas. Quais as questões-chave envolvidas na necessária gestão privada ao ambiente criado? É, pois, momento de reflexão e de moção do mundo real. Sonhar com alicerces de ilusão não constrói o futuro. O presente constrói o futuro.
Será preciso um grande esforço privado na cadeia produtiva, somando os elos e buscando, também, o mercado internacional. Somar com os norte-americanos, abrindo mercados na Ásia e na Europa.
Maior Cide ajudaria muito. Menor ICMS alivia e dá perspectiva. Lutar contra o Custo Brasil juntamente com todo o agronegócio. São outras medidas essenciais.Também fundamental será conversar com a sociedade brasileira e monitorar os movimentos todos, nacionais e internacionais, via redes sociais. Esse é o novo mundo da gestão setorial.