De acordo com a 7ª edição da pesquisa Hábitos do Produtor Rural ABMRA (Associação Brasileira de Marketing Rural e Agronegócio), 4 em cada 10 produtores rurais acessam a internet e, destes, 93% acessam as redes sociais, o que mostra uma mudança no perfil do homem do campo, apontando o seu envolvimento com as novas tecnologias e as mídias consultadas para sua informação pessoal e profissional.
Também podemos lembrar que, alguns anos atrás, os produtores e os proprietários agrícolas trabalhavam no campo e viam o êxodo como futuro, ou seja, ele plantava e colhia, mas seu filho não iria fazer o mesmo e sim estudar para se tornar médico, dentista ou engenheiro. Sem sucessão, o produtor se via em outro problema, afinal quem iria cuidar da propriedade e da plantação? Porém, atualmente, o campo é um lugar atrativo e tecnológico. Um pulverizador uniport, por exemplo, tem 12 computadores, oito quilômetros de fios e 60 sensores, sendo necessário um considerável nível de tecnificação para operá-lo.
O mesmo vale para uma colhedora, e o produtor precisa pagar um profissional para operar esses equipamentos com um salário competitivo e compatível com o mercado. Novos tempos que demandam profissionalização, recursos e investimentos, pois o que antes parecia distante das lavouras, como internet das coisas, satélites, drones, tratores autônomos e outros, já está aí e faz parte do dia a dia dos produtores rurais.
Com a renovação e a remodelagem do setor, é importante que o produtor rural esteja atento à questão do futuro, pois essa é uma das principais premissas para ele, as associações e as empresas que o atendem para se manterem na atividade. Nesse contexto, precisamos pensar também no ato de vizinhar. Hoje, se não trabalharmos o ganho de escala, não é possível ser sustentável. E ser sustentável não é ser amigo do meio ambiente. A sustentabilidade engloba a questão econômica, social e ambiental: é ser racional com o uso dos recursos financeiros, gerar emprego e renda para a sociedade e contribuir para a conservação do meio ambiente, fechando os três pilares.
Ainda na questão econômica, seria interessante os produtores criarem uma cadeia de economia circular. Um produtor pode não ter condições de adquirir um pulverizador uniport, mas, se se juntarem dez produtores de cana, talvez um tenha o pulverizador, um outro, a colhedora, e assim por diante.
Com essa união, é possível atender à necessidade de todos. A ação de vizinhar permite processos que levam à eficiência e equilibram os padrões de negociação, ao mesmo tempo em que nos faz refletir sobre o conhecido ditado de que “uma andorinha só não faz verão”.
Há a necessidade de se pensar em escala e não mais de forma individual. Um exemplo é a formação de blocos de condomínio. Quando se entende geograficamente a região, também se começa a montar blocos de negociação. Se uma usina está localizada em determinada área, há grande tendência de colher a sua safra na região, chegando até mesmo a pagar mais pela matéria-prima devido à proximidade e à qualidade.
A ajuda e a orientação de uma associação como a Canaoeste, por exemplo, é primordial para isso, pois, na hora de recomendar as variedades, um bloco pode ter canas precoces, média e tardia para uma estratégia de autossustentabilidade durante toda a safra. A gestão profissional é outra questão defendida e adotada pela associação. Com a profissionalização, os resultados começam a mudar, e o produtor precisa ter essa visão. Não dá mais para pensar em ser o agricultor das cavernas e nem o agricultor executivo de terno. Tem que ser agrogestor e estar no campo atento à tecnologia, à gestão, aos índices, aos resultados e aos padrões, pois é isso que fará com que a atividade seja sustentável.
Estamos em uma nova realidade, onde é preciso se adaptar. Além disso, a comunicação (tanto no setor como do setor para a sociedade) precisa ser muito assertiva e ter uma estratégia conjunta. A questão das queimadas, por exemplo, é algo mal comunicado para a sociedade. O setor não queima cana há anos, e muitas pessoas ainda não têm conhecimento sobre isso. Elas precisam saber, por exemplo, de todo o trabalho que é realizado para a prevenção de incêndios, muitos deles criminosos. Temos muito a fazer na área de comunicação.
Em paralelo, é preciso trabalhar em outras questões. O atual sistema de pagamento entrou em um impasse que está difícil de ser resolvido, e um ponto que precisa ser levado em consideração é a questão da fibra da cana, visto que o sistema está fundamentado no tempo em que se fazia apenas açúcar e etanol e o bagaço produzia energia elétrica apenas para uso próprio da usina.
A questão da bioenergia é uma certeza no setor sucroenergético e, com base nisso, deveria ser agregado algo para o produtor de cana. Se, até então, só se remunerava o caldo, a fibra também, em um contexto mais moderno, deveria fazer parte da remuneração da cana.
O RenovaBio poderá ser uma oportunidade de ganho para o setor, através de créditos que englobam desde o plantio da cana até a produção final de açúcar e de etanol. O produtor de cana, por sua vez, deve ter direito a parte desses créditos, por ser um importante ator da cadeia sucroenergética.
Segundo trabalhos realizados pelo Pecege, existe uma diferença significativa na questão do pagamento de cana, em parte compensada por acordos individuais entre produtores e usinas. Contudo seria salutar um preço mais justo, similar a um critério como o Consecana e com valores que deem aos produtores a oportunidade de investirem nos canaviais, de forma a garantirem uma cana com maior produtividade para as indústrias.
Há de haver um foco na recuperação da produtividade dos canaviais. É certo que fatores como clima e preço interferem, mas passamos por um crescimento do setor um tanto apressado, abdicando de tecnologia, bem como tivemos a implementação do plantio e da colheita mecanizados, que também contribuíram para reduzir a produtividade.
A concentração de grandes áreas nas mãos dos grandes grupos também pesa nessa questão. Temos exemplos de grupos que passaram áreas de cana para os produtores e, ao que tudo indica, têm tido melhores resultados.Temos que continuar insistindo no RenovaBio para que ele se torne uma realidade e dê ao setor a tão aguardada previsibilidade para investimentos. Se o programa entrar em execução, com certeza, o setor terá uma guinada substancial.
Também é preciso investir mais em pesquisa, porque entendemos que os ganhos, obtidos com custos cada vez menores, virão do aumento de produtividade e de eficiência por unidade, seja em hectare no campo, seja em rendimento na indústria. O setor deve crescer o mais verticalmente possível, pois avançou muito ao expandir em áreas, mas retrocedeu em ganhos de produtividade. Com o RenovaBio, o incentivo à pesquisa e uma melhor remuneração para os produtores de cana, o setor poderá sim alavancar, bem como conquistar a confiança de todos para o retorno dos investimentos necessários.