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Alessandro Gardemann

CEO da Geo Biogás & Tech

OpAA72

Biogás: liderança mundial
O biogás brasileiro ganhou uma política pública inédita no mês de março, a partir da instituição da Estratégia Federal de Incentivo ao Uso Sustentável de Biogás e Biometano, uma iniciativa que reuniu esforços dos Ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente, em que os representantes do setor participaram com bastante interesse e engajamento ao longo dos últimos anos.  
 
Com a iniciativa, o Governo Federal reconhece o potencial do Brasil para o desenvolvimento do biogás e dá um passo estratégico importante em um momento em que o mundo fica em sinal de alerta para soluções que garantam a segurança energética e de fornecimento de insumos agrícolas alinhados à agenda de transição para um futuro de baixo carbono. 

Do ponto de vista prático, as medidas envolveram a inclusão dos investimentos em biometano no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi), que isenta novos projetos da alíquota de 9% do PIS/Cofins, e a criação do Programa Metano Zero, que abre linhas de crédito e financiamento específicas ao desenvolvimento de ações e atividades ligadas à cadeia do biogás e do biometano. 

Mas não paramos por aí. Em iniciativa pioneira no mundo, o governo brasileiro deu um passo importante ao propor regras para a contabilização de emissão de metano, possibilitando a criação de um mercado futuro de crédito de metano, e não apenas de  carbono. O movimento é relevante, porque o metano tem impacto para o aquecimento global 30 vezes maior do que o carbono. Acreditamos que o biogás e o biometano brasileiros, com potencial tão grande quanto o do pré-sal, possam ser soluções para descarbonização do Brasil, nas áreas da indústria, transporte, energia, fertilizantes agrícolas, entre outras. 

Além disso, pode posicionar o Brasil no caminho da transição energética mundial, especialmente diante de uma nova geopolítica energética que se configura impulsionada pelo conflito da Rússia na Ucrânia e no contexto em que a prioridade da agenda mundial, inclusive a brasileira, passa a ser dirigida a alternativas sustentáveis, com foco na garantia da independência energética. 
 
No 11º relatório estatístico da European Biogas Association (EBA), há uma aprofundada análise sobre as perspectivas para o biogás e o biometano no continente, olhando para as próximas décadas. O documento mostra que o biometano deve ser um dos protagonistas em energias renováveis na Europa nos próximos 30 anos, com a estimativa de que cerca de 30% a 40% do consumo de gás nos países europeus possam ser supridos por biometano, produzido a partir de plantas de geração de biogás atreladas à base de produção agrícola dos países.  
 
Nesse cenário, uma das grandes vantagens do biogás brasileiro é a previsibilidade de preços, que garante um uso estável da fonte como matriz energética para o País. Nossa solução, feita a partir do aproveitamento de resíduos da cana-de-açúcar – como a vinhaça, a torta de filtro e a palha –, abre uma perspectiva de oferta de biometano em escala, sustentável, além de garantir a independência energética sustentável do nosso País. A integração da produção de biogás também pode aumentar a produção de matéria orgânica e a redução de custo de fertilizante com a utilização de adubos orgânicos. 

Hoje, a monetização do biogás também já se dá de diversas maneiras, sendo capaz de viabilizar operações sólidas e de interesse para o setor do agronegócio brasileiro. Além da energia elétrica, é possível que o biometano seja transportado via GNC para substituição de GLP, ou atue como substituto do diesel em frota pesada. Isso sem contar com a possibilidade de o biometano ser injetado e transportado via gasodutos, como é o caso da nossa parceria com o Grupo Cocal, cuja planta já está em operação, mas que, no segundo semestre, servirá como fonte de injeção do gás renovável em infraestrutura construída pela distribuidora GasBrasiliano para atendimento da população na região de Presidente Prudente, no interior de São Paulo. O projeto se sagrará como a primeira experiência de gasoduto verde do mundo.  
 
Segundo os cálculos da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás), o Brasil possui o maior potencial de produção do gás renovável no mundo, da ordem de 120 milhões de metros cúbicos por dia (m³/dia). Se todo esse potencial fosse utilizado, seria possível suprir 70% do consumo de óleo diesel no País, ou 34,5% da demanda de energia elétrica. Hoje, estamos longe desse potencial, porém o crescimento é exponencial. A ABiogás projeta que, até 2030, vamos chegar a pelo menos 30 milhões de m³/dia e 19 gigawatts (GW) de capacidade instalada, com investimentos da ordem de R$ 50 bilhões. 

Ainda que o ritmo da mudança ocorra em passos muitos diferentes em relação a países em desenvolvimento e desenvolvidos, a certeza que temos é de que todos os mercados, inclusive o brasileiro, exigirão investimentos sem precedentes em tecnologias de descarbonização e temos condições de aproveitar esses recursos para o desenvolvimento das operações sustentáveis energéticas ligadas ao agronegócio. 

Exemplo disso é o fato de o biometano ser uma excelente rota para a produção do hidrogênio verde. Hoje, 95% do hidrogênio mundial é feito a partir da reforma do metano fóssil, e a proposta é fazer isso no Brasil, a partir do metano renovável, utilizando a infraestrutura e as unidades fabris existentes, atualmente usadas para produções com base no gás natural fóssil.  
 
Hoje, com a mistura de biometano no gás natural, já é possível ter teores renováveis de hidrogênio, mas ele pode ser totalmente verde se o gás natural for substituído pelo biometano.

A Geo Biogás & Tech, por meio de seus laboratórios de pesquisa e desenvolvimento, também estuda soluções nessa e em outras frentes para ampliar as fontes de resíduos orgânicos que possam ser utilizadas para a produção de biogás e biometano, além de já trabalhar com rotas e infraestruturas do gás fóssil existentes para produzir insumos a partir do gás renovável.  Uma dessas frentes, na qual estamos já posicionados, é para a produção de biofertilizantes a partir do biogás.

Por meio de nossa parceria com a Raízen, iremos fornecer biometano para substituição do gás renovável fóssil na produção nacional de amônia da fabricante Yara. É o que demonstra na prática o potencial de uso do biogás e do biometano aproveitando a mesma infraestrutura fabril e técnica do gás natural fóssil, mas substituído por gás renovável, visando à produção de biofertilizantes. Nesse projeto, vamos construir uma nova planta para purificar o biogás e conectar sua distribuição à rede de gás que abastece o complexo fabril da Yara, em Cubatão (SP). A perspectiva é entregar 20 mil metros cúbicos de gás natural renovável por dia, o que irá substituir parte do atual volume de gás natural fóssil usado na fabricação de amônia, abrindo, assim, caminho para a descarbonização do fertilizante. 
 
Diante do contexto que temos em perspectiva, é importante ressaltar que passa a ser cada vez mais necessária às empresas dos diversos setores industriais uma preparação para integralizar alternativas sustentáveis em suas rotas de produção, principalmente se quiserem crescer acessando o mercado de capitais – cada vez mais atento às práticas sustentáveis em suas decisões de investimentos. 
 
Os players do biogás, por sua vez, também devem encontrar soluções viáveis para expandir sua produção e atender a clientes com compromissos já definidos para alcançar a Net Zero, seja por meio de tecnologias incrementais e/ou até inovadoras, a partir do biogás e do biometano. Essa é a maneira mais concreta e escalável para criarmos uma economia verde que seja justa e tenha condições viáveis para direcionar o mundo a um futuro mais sustentável e sem discórdias sociais.  Por isso, a iniciativa do governo brasileiro com o Programa Metano Zero pode ser, atualmente, o ponto de virada para que possamos perseguir metas ainda mais ambiciosas em prol da descarbonização, e que a sociedade brasileira tenha condições de acesso a fontes de energias confiáveis, limpas e com previsibilidade de preços.