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Ismael Perina Junior

Produtor Rural

Op-AA-60

Breve relato
Mais uma vez convidado para escrever nesta conceituada revista, confesso que a apreensão é grande, pois, nos vários artigos escritos no passado, esses temas foram abordados de uma forma dispersa e que, neste artigo, tentarei agregá-los falando um pouco da trajetória dos últimos quarenta anos. E me permitam, com isso, fazer um retrospecto do meu histórico de vida na produção de cana-de-açúcar, vivenciado diretamente desde a minha formatura em agronomia, em julho de 1980, até os dias de hoje. Parece pouco tempo, mas veremos o tamanho da evolução e o que esperar de inovações nesses próximos períodos.
 
Um breve relato do início onde tínhamos poucas planilhas eletrônicas e muita gente no campo. Período esse, em que as informações, conceitos e inovações eram tratados em seminários e cursos promovidos principalmente pelo Planalsucar, com ênfase no estudo e nas distintas fases de produção agrícola, sempre buscando cuidados na formação e ganhos de produtividade. Praticamente toda empresa prezava por uma atenção muito grande ao canavial.
 
Época em que o crescimento de área plantada foi praticamente exponencial, devido aos incentivos criados pelo Proálcool. O nosso parque varietal era bastante restrito, onde utilizávamos ainda muitas variedades oriundas de outros países, e a Coopersucar iniciava grandes investimentos na área de pesquisa e desenvolvimento, principalmente na obtenção de variedades nacionais se somando ao Planalsucar, e, a partir de então, inicia-se todo um processo de substituições de variedades importadas pelas nacionais, e os reflexos começam a aparecer nos ganhos de produtividade.

Relatar esse período e verificar o quanto tínhamos de dificuldades com relação a máquinas e equipamentos, insumos de uma maneira geral, colheita manual quase em 100% da área com algumas poucas iniciativas de mecanização, enfim, uma condição muito mais complexa do que temos nos dias de hoje. Ao longo de todos esses anos, os investimentos em P&D foram se tornando muito escassos, principalmente após a extinção do Instituto do Açúcar e do Álcool e, mais adiante, com a desregulamentação dos preços, muitas dificuldades de ordem econômica são suficientes para explicar um pouco a situação da produtividade agrícola atual. 
 
Lembramos que, no início da década de 1980, com a implantação do Pagamento de Cana por Teor de Sacarose, passamos a ter um grande avanço na qualidade da produção e, a partir daí até o advento da mecanização quase plena, fomos deixando um pouco de lado os aspectos qualitativos pela necessidade da mecanização, de maneira abrupta. Mas, na verdade, as coisas caminharam, e chegamos aos dias de hoje com a certeza de que, com o que temos em mãos, dá para virar o jogo quando falamos em produzir mais e melhor.
 
Avaliando alguns pontos separadamente, podemos verificar tranquilamente que a oferta de modernidade para a produção é muito grande. Começando pelo parque de máquinas para uso no preparo do solo, cultivos, tratos culturais e colheitas, ultramodernos, com piloto automático que praticamente elimina todos os problemas de operação que se encontravam na mão do operador, cuja maior dificuldade, no momento, seja talvez o de capacitação para a operação.

Os implementos acoplados a essas máquinas, cada vez mais precisos e permitindo realizar as operações e controles de uma forma mais efetiva, com mapeamentos de solos para melhor utilização das inúmeras variedades de cana que temos, chegando até as colhedoras, que também são equipadas com piloto automático, permite uma colheita que, cada vez menos, danifica as soqueiras, permitindo melhorar a longevidade dos canaviais e finalizando com todo o aparato de transporte que temos em todas as fases, com suas variantes, também com equipamentos acoplados e muito modernos e eficazes.

Creio que, com todo esse aparato de máquinas e equipamentos, nossa grande tarefa está em capacitar pessoas para uma operação mais eficiente. Citaria à parte o imenso avanço que tivemos a partir do desenvolvimento de pulverizadores com altíssima tecnologia, que também nos permite efetuar as pulverizações de uma maneira muito mais eficiente, com aplicações dirigidas nos permitindo melhor uso e maiores controles.
 
Sob a ótica dos insumos, aqui sim uma evolução extraordinária. Não dá para comparar os fertilizantes que utilizávamos na década de 1980 (Nossa, como empedravam! Sacos de 50 kg, “chapa” e entrega complicada) com os produtos que temos hoje. Formulações muito mais específicas, nas quais os nutrientes estão juntos, num mesmo grânulo agregado a micronutrientes específicos para cada situação e com  uma grande agilidade para ser produzido e chegar ao campo.

Uma facilidade muito grande para se trabalhar. O que nos falta nesse quesito, no meu entendimento, são mais pesquisas para que as recomendações sejam mais bem elaboradas. Quando avaliamos os produtos e as formulações disponíveis hoje para complementações foliares, atestamos a sua ótima qualidade e eficiência comprovada. 
 
Ainda com relação a insumos, mas olhando agora para os agroquímicos, um diferencial monstruoso ao que tínhamos décadas passadas. Produtos muito mais eficazes, muito menos tóxicos e muito mais específicos, permitindo que, mesmo com uma grande mudança na operação de colheita de cana de queimada para cana crua, com aparecimento de novas pragas e doenças, tivéssemos a oportunidade de controlá-las também com eficiência.

Apenas um parêntese para lembrar que só não caminhou mais rápido o desenvolvimento e a liberação de novas moléculas e produtos por conta da burocracia e da ideologia dos responsáveis pela avaliação e pela liberação dos mesmos nos organismos públicos (ressaltaria aqui o brilhante trabalho da atual ministra Tereza Cristina, ainda na Câmara Federal, por tratar esse tema de maneira técnica e isenta nas discussões, para que esse problema seja resolvido).

Agregado ao que falei anteriormente, sobre a qualidade dos pulverizadores, conseguimos avançar muito nesses aspectos que dizem respeito ao controle de pragas, doenças e ervas daninhas e, logicamente também, com a utilização de produtos que aceleram a maturação da cana-de-açúcar.
 
De forma que, como vemos, temos um grande aparato moderno que nos permitirá trabalhar e evoluir de maneira satisfatória. Gostaria, ainda, de comentar alguns pontos que imagino ser trabalhado para modernizar, de forma mais efetiva, daqui para frente. Sem dúvida nenhuma, os produtos de origem biológica que vêm sendo desenvolvidos e já têm sua utilização iniciando na produção de cana-de-açúcar, com resultados bastante expressivos, deverão estar no foco de nossos trabalhos.

Um olhar mais atento à microbiologia do solo permitirá avanços significativos nessa área, trazendo, com certeza, ganhos de produtividade. O monitoramento através de VANTs, drones e satélites já é uma realidade e certamente serão usados em grande escala, permitindo um acompanhamento mais preciso e dinâmico de nossas lavouras.

Os centros de pesquisa e desenvolvimento de novas variedades de cana, com o uso de tecnologias mais recentes, como transgenia, colocará para uso comercial variedades resistentes a pragas, a doenças, a seca e com maior teor de sacarose, além de muito mais. Melhorar o aproveitamento dos resíduos de nossa produção já passou por inúmeras mudanças, e certamente é um tema a ser trabalhado constantemente. 
 
Claro que muito mais coisas estarão disponíveis num curto intervalo de tempo, e entendo que o grande desafio para o produtor se voltará para o como fazer uso de todas essas tecnologias, buscando sempre os ganhos de qualidade e produtividade. O desafio é enorme e está lançado. Mãos à obra.