Superintendente do CTC - Centro de Tecnologia Canavieira
Op-AA-26
Quando falamos sobre biorrefinarias, estamos, na verdade, falando em trocar uma série de produtos, que hoje vêm pela rota do petróleo, por rotas de produtos renováveis. Isso quer dizer que teremos que ser competitivos diante de uma indústria bem estabelecida e extremamente eficiente, a indústria do petróleo, as refinarias e a indústria química em geral. Poderemos contar, no começo, talvez, com subsídios e com política, mas, ao longo do tempo, vamos precisar ser eficientes, competitivos e vantajosos, para o meio ambiente, comércio, indústria e para os usuários desses produtos.
Temos uma grande quantidade de bagaço disponível, mas, na nova fronteira pesquisada no CTC, a palha amplia o potencial da biomassa ainda mais. No que se refere a variedades, estamos estudando não só as canas de alta eficiência no Centro-Sul, mas principalmente as canas regionais. O CTC implantou polos em todas as fronteiras da cana-de-açúcar no Brasil.
Temos 140 usinas associadas que utilizam, em forma de cooperação, esses polos regionais. Testamos as nossas canas em praticamente 98% dos solos e climas que o Brasil tem, possibilitando a identificação da cana superior para cada unidade.Temos, hoje, no Brasil, sete milhões de hectares plantados com cana-de-açúcar, 60% desse volume processados pelos associados do CTC.
Quando se dispõe de uma carta de solo em um ambiente edafoclimático, pode-se identificar a variedade ideal para aquela região, pois uma variedade errada pode gerar uma produtividade até 25% inferior. Outros fatores a considerar são o regime de chuva, a ocorrência de pragas e doenças na região. Já estamos com dois milhões de hectares mapeados, usina por usina, talhão por talhão. Nosso propósito é mapear 100% dos solos e dos climas de todos os nossos associados até 2013.
Dentre as principais características que buscamos na cana, a primeira é a resistência a insetos. O melhoramento convencional dá ganhos médios de produtividade de 2% ao ano. É um bom ganho, porém vamos precisar usar outros recursos para conseguir um crescimento significativo da produtividade. Um deles é a transgenia, asssunto que estamos estudando com vários parceiros de peso no mundo.
Na busca de uma variedade resistente a insetos, fomos buscar o melhor parceiro em nível mundial: a Dow Agrosciences. Já temos resultados em laboratório e testes de campo. Teremos um efetivo aumento de produtividade com a solução dessa questão. No que se refere à tolerância à seca, desenvolvemos com a Basf outra parceria, buscando alcançar um menor dano e uma mais rápida regeneração do canavial quando dessa ocorrência.
Outra parceria muito interessante é com a Bayer, que tem gens que fazem com que a cana possa acumular mais sacarose e outros açúcares. Buscamos uma cana que possa dar até 25% a mais de sacarose do que as atuais. Todas essas parcerias são com empresas líderes mundiais no mercado. O CTC entra com o seu know-how, com seu germoplasma, e elas, com seus gens, num pacote tecnológico, na busca de uma performance superior.
Possivelmente, em três anos, teremos as primeiras canas transgênicas prontas para certificação, para entrar no mercado de cinco a dez anos. Hoje, nós pesquisamos canas que acumulam sacarose e biomassa no início e no final da safra, na busca de um melhor equilíbrio em todo período de colheita. Para isso, usamos marcadores moleculares, que são parte do DNA em que se identificam as características de desempenho, sabendo se aquela cana será ereta, se vai acumular açúcar, gerar mais raízes, mais folha, mais fibra.
Enfim, entendendo como funcionam os marcadores, você consegue direcionar os cruzamentos, acelerando todo o processo, reduzindo, assim, o tempo do melhoramento de uma nova cana, dos atuais dez anos para algo como cinco anos, num ganho de produtividade fantástico, para acelerar a chegada dessas canas superiores ao mercado. Como rotas para a maximização do uso da biomassa, os avanços da mecanização do plantio e da colheita consolidam ganhos significativos.
No que se refere à palha, se conseguíssemos pegar metade dela de maneira eficiente em termos de custo para as usinas, seria como montar uma nova Itaipu. É um volume imenso de energia desperdiçado através da queimada. Existem várias combinações possíveis de se transportar a palha: junto com a cana ou deixá-la no campo e depois recolhê-la, ou um misto das duas.
É preciso avaliar as várias combinações possíveis envolvendo a coleta, a carga e o transporte. Fizemos uma parceria com a Fiat e a New Holland há quase um ano e planejamos, para o final de 2011, conseguirmos os primeiros resultados para a viabilização desse processo. A biomassa está chegando a preço cada vez mais competitivo, formando um cenário muito atraente para a usina.
A maioria das usinas que tem disponibilidade de biomassa está indo pela rota convencional, porque é o que está dando retorno econômico e é a tecnologia disponível agora. O CTC participa de um consórcio para tentar uma rota da gaseificação da biomassa, que pode gerar mais eletricidade do que os métodos convencionais, mas é uma tecnologia que pode demorar ainda dez ou quinze anos para se tornar competitiva.
Com relação à hidrólise da biomassa, o etanol de segunda geração é algo que está num horizonte próximo. Já evoluímos bastante e queremos compartilhar o entusiasmo com relação a esses resultados. Simplificando bem a equação, quando quebramos a biomassa da cana em componentes básicos, temos a lignina, os açúcares C5 e C6. A lignina é um carvão vegetal de alto poder calorífico. Os açúcares C6 são o que fermentamos através das leveduras convencionais, processo altamente desenvolvido.
Os açúcares C5 não são hoje fermentáveis, e é essa tecnologia que todos buscamos. Os desafios da hidrólise enzimática é chegar a uma celulose que seja eficiente. Primeiro, na preparação da matéria-prima, o bagaço e a palha, para que ela seja facilmente digerida pela enzima. Precisamos também ter enzimas de alta eficiência – responsabilidade que está nas mãos de nosso parceiro nesse projeto, a Novozymes, que tem correspondido de maneira brilhante, reduzindo os custos das enzimas e aumentando sua eficiência em termos de conversão.
As cepas para fermentação de pentose vão demorar um pouco para que sejam eficientes e tenham baixo custo, mas isso pode chegar numa fase seguinte. O projeto busca adaptar todos os recursos já existentes nas usinas, aproveitando a infraestrutura, a logística e a disponibilidade da matéria-prima. O importante, ao final, é que sejamos competitivos em custos, mantendo a sustentabilidade. É importante observar que o novo processo não vai retirar a biomassa disponível atualmente. Ele vai emprestar essa biomassa e fazer a separação dos componentes.
A lignina, depois de separada, será concentrada e devolvida para as caldeiras, em condições de queima com energia superior à forma in natura. Com o suco hidrolisado das hexoses, faremos o processo convencional, usando as leveduras que temos hoje disponíveis, e separaremos o C5 da vinhaça. Não precisamos reinventar a roda. É possível fazer essas adaptações e gerar, hoje, 30% mais de etanol que o gerado pelo processo atual.
Quando começamos em 2007, o custo era oito vezes mais do que o custo do etanol convencional. Estamos chegando ao final deste ano a duas vezes o custo. Nesses três anos, aprendemos muito: como cozinhar bem essa biomassa, como extrair a lignina e separar o C5 e C6, de maneira eficiente. No final de 2012, teremos uma planta de demonstração e, em 2014, deveremos ter o custo do etanol de segunda geração compatível com o de primeira, sem qualquer subsídio, benefícios ou proteção.
No processo de fermentação extrativa que o CTC está desenvolvendo numa planta piloto em Piracicaba, planejamos que, à medida que o etanol seja produzido num circuito fechado, ele seja retirado para não sobrecarregar as leveduras que estão convertendo esses açúcares em etanol. Com isso, teremos menos vinhaça no processo, baixando a relação de 12 para 4 litros de vinhaça para cada litro de etanol produzido. Estamos apenas começando a tocar o potencial que temos na cana-de-açúcar.
A biorrefinaria, hoje, já é uma realidade. O açúcar, o etanol, a eletricidade, os plásticos verdes já estão disponíveis, mas o potencial disso está só no começo. Estamos só tocando a ponta desse iceberg, estamos no jardim de infância dessa tecnologia. A sociedade vai se orgulhar desse setor por ter matérias-primas eficientes e renováveis, em substituição a vários produtos hoje gerados através da queima de carbono.