Me chame no WhatsApp Agora!

Marco Antonio Nogueira e Mariangela Hungria

Pesquisadores da Embrapa Soja

OpAA85

Inovação no uso de bioinsumos para nutrição de plantas
De acordo com a OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, inovação pode ser definida como um produto ou processo novo ou aprimorado (ou uma combinação dos dois) que difere significativamente dos produtos ou processos anteriores da empresa e que tenha sido introduzido no mercado ou colocado em uso pela empresa.

No caso dos insumos biológicos, ou bioinsumos, vivemos nos últimos anos uma tendência cada vez maior de adoção nos sistemas de produção agropecuários, visando o aumento da eficiência dos sistemas produtivos em termos econômicos e ambientais. 
 
Essa expansão do uso de insumos biológicos no Brasil é evidenciada por um aumento expressivo do registro no Mistério da Agricultura e Pecuária de indústrias de insumos biológicos, de 16 em 2011 para mais de 170 em 2025, um mercado estimado em cerca de R$ 17 bilhões para 2030, de acordo com especialistas. 

No Brasil, até o início dos anos 2010, os bioinsumos para nutrição de plantas eram baseados, quase exclusivamente, nos rizóbios para a fixação biológica de nitrogênio em leguminosas, principalmente a soja. 

Atualmente, a soja ainda é a líder em inoculantes registrados no MAPA, com cerca de 75% do mercado, mas outras culturas vêm tendo à sua disposição esses insumos, como o milho (16%), cana-de-açúcar (4%), seguidos por trigo e pastagens, com cerca de 1% de mercado cada. 

Destaca-se que a inoculação da soja com Bradyrhizobium spp., o caso mais bem sucedido mundialmente de aplicação de microrganismos na agricultura, permite produzir sem a necessidade de fertilizantes nitrogenados, o que gerou para o País uma economia de cerca de US$ 25 bilhões e emissões evitadas de mais de 230 milhões de toneladas de CO2-equivalentes na safra 2023/2024. 

A experiência dos agricultores brasileiros com essa tecnologia facilita a adoção de outras tecnologias biológicas para a nutrição de plantas, não apenas para a soja, mas também para outras culturas.

A Embrapa Soja foi inovadora em pesquisas com outros microrganismos que permitiram expandir o uso de tecnologias biológicas para a nutrição de plantas, além dos rizóbios em leguminosas. No início dos anos 2000, pesquisas em parceria com a Universidade Federal do Paraná disponibilizaram às indústrias estirpes de Azospirillum brasilense (Ab-V5 e Ab-V6), bactérias conhecidas pela capacidade de promoção de crescimento de plantas, sendo lançados em 2009, por duas empresas privadas, os primeiros inoculantes comerciais para milho, arroz e trigo. Posteriormente, a tecnologia foi expandida para a coinoculação da soja em 2014, inoculação de pastagens via sementes em 2017, inoculação de pastagens via sementes e foliar em 2021, e a redução de 25% da adubação nitrogenada de cobertura do milho pela inoculação com Azospirillum em 2022. 

Tanto na soja, quanto em outras culturas, o Azospirillum estimula o desenvolvimento das raízes, o que resulta em mais nodulação na soja e no aumento da eficiência de uso de nutrientes nas gramíneas pela maior eficiência das raízes em explorar o solo. A inoculação de A. brasilense em pastagens com Brachiaria brizantha e B. ruziziensis promove aumentos médios de 13% nos teores de N e 10% de K. Quando coinoculado com Pseudomonas fluorescens (CNPSo 2719), houve também aumento de 30% nos teores foliares de P.

Esses benefícios promoveram aumento médio de produção de biomassa aérea de 22% pela forrageira. Outras tecnologias biológicas para a nutrição de plantas também vêm ganhando destaque, como os bacilos mobilizadores de fosfato, Bacillus subtilis (CNPMS B2084) e Priestia megaterium (B119), isoladas e testadas inicialmente para milho pela Embrapa Milho e Sorgo em 2019, com ganho médio de cerca de 700 kg/ha. Atualmente, esses inoculantes estão em expansão de registro para várias outras culturas e têm sido uma importante estratégia para o aumento da eficiência de uso de fertilizantes fosfatados.
 
De acordo com o aplicativo “Bioinsumos”, do MAPA, atualmente existem sete inoculantes registrados para a cana-de-açúcar. Ainda há um grande potencial para que novos inoculantes sejam desenvolvidos e registrados para essa cultura, não apenas à base de bactérias, mas também de fungos, como os fungos micorrízicos arbusculares (FMA). Quanto aos microrganismos relacionados à nutrição nitrogenada da cana, existe uma grande interação com o genótipo da planta. 

Pesquisas realizadas pela Embrapa Agrobiologia indicam que a FBN (Fixação Biológica de Nitrogênio) endofítica pode suprir quase 50% da demanda de N pela planta nos genótipos mais responsivos. A cana pode ser colonizada por vários gêneros de bactérias capazes de fixar N biologicamente, em diferentes tecidos. Respostas positivas como o aumento de TCH (Toneladas de Cana por Hectare) e ATR (Açúcar Total Recuperável) têm sido observadas pela inoculação com Nitrospirillum amazonense, o primeiro inoculante desenvolvido para a cultura. Respostas positivas também têm sido observadas pela inoculação de A. brasilense e insumos à base de FMA e outros fungos promotores de crescimento de plantas, como Trichoderma asperellum. A adoção dessas tecnologias contribui para sistemas de produção mais resilientes, não apenas frente a questões climáticas, mas também econômicas e ambientais.

Mesmo com os avanços e novas tecnologias, ainda há muitas oportunidades para inovar no campo dos bioinsumos com os mais variados mecanismos de promoção de crescimento de plantas. Não apenas a FBN ou aumento da eficiência de uso do N, mas também mobilização de fosfatos, solubilização de fontes de potássio de baixa solubilidade, biocontrole e tolerância à seca são mecanismos que poderão ser combinados em bioinsumos multifuncionais.
 
A mudança de um sistema de produção até recentemente baseado, quase exclusivamente, em insumos químicos para um uso cada vez maior de bioinsumos requer mudanças na estratégia de uso dessas novidades, com cuidados que podem fazer a diferença na eficiência. A maior parte dos bioinsumos é baseada em organismos vivos e precisam continuar vivos para desempenhar a função esperada. Cuidados durante a produção, transporte, armazenamento e aplicação precisam ser considerados. 

Quanto à produção, a pureza, concentração e identidade das estirpes no produto são essenciais, o que requer um rígido controle de qualidade. A legislação brasileira para inoculantes é bastante clara quanto a esses aspectos e define requisitos mínimos de qualidade. Entretanto, a produção on farm traz preocupações quanto a esses aspectos, pois, em raros casos, existe controle de qualidade microbiológica, o que pode resultar em produtos de baixa qualidade, sem a presença o microrganismo alvo, e presença de contaminantes potencialmente patogênicos. 

Temperaturas elevadas são particularmente críticas nas etapas de transporte e armazenamento. Já a aplicação, além da temperatura, leva a preocupações com misturas, seja entre produtos biológicos e químicos, seja mesmo entre biológicos, que nem sempre são compatíveis e exigem testes prévios. Finalmente, o manejo do solo que favoreça o aumento do teor de matéria orgânica é importante para criar um ambiente microbiologicamente favorável, de modo a favorecer o estabelecimento e a ação dos insumos biológicos.