Presidente da Techind Consultoria e Coordenador do APL Metalmecânico de Sertãozinho
As últimas notícias do cotidiano brasileiro dão conta de uma melhora do País na confiança internacional. Tivemos 3 das grandes agências de risco melhorando a nota do Brasil, testemunhamos movimento em direção à responsabilidade fiscal, que pode não agradar a todos, mas tem o mérito de vencer uma inércia de décadas. Além disso, tivemos uma demonstração de seriedade da Política Monetária que mostrou resistência às pressões políticas, entre outras.
Dessa forma, a despeito da grande e notória polarização política partidária, o país se aproxima de um padrão mais aceito internacionalmente, o que, cada vez mais intensamente, exige esforços para a sustentabilidade, em um enorme movimento concentrado e direcionado para o desenvolvimento das nações.
Nesse sentido, o Brasil tenta demonstrar seu alinhamento, assumindo compromissos com políticas e práticas para a sustentabilidade econômica, ambiental e de governança, o já notório ESG. Existe todo um arco de compromissos, dos quais alguns são bem conhecidos, como o Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. O cumprimento desses compromissos, delineados pela nos ODS, tende a aumentar com a candidatura do Brasil à membresia da OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
Passando desde fevereiro de 2022 pelo crivo analítico dos critérios para ingressar no quadro, o Brasil certamente assumirá mais uma boa dose de regulamentação internacional de governança ao país. Os objetivos dos ODS são uma agenda mundial adotada durante a Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável em setembro de 2015, composta por 17 objetivos e 169 metas a serem atingidos até 2030.
Engajados com essa agenda, temos nos comprometido com a sustentabilidade, consolidando novas estratégias, com políticas e padrões produtivos de consumo, impactando, assim, toda a sociedade brasileira. Como exemplo disso, foi recentemente encaminhado pelo governo ao congresso o “Pacote Verde”, um conjunto de regramentos visando erradicação da pobreza, a regulação do mercado de carbono e a classificação das atividades, conforme seu impacto ambiental e climático.
Analisando o painel dos 17 itens que compõem os ODS, um deles destaca as responsabilidades da indústria no cenário geral. Trata-se do ODS-9, que preconiza “o desenvolvimento da indústria, da inovação e da geração de valor”. Dividido em 8 metas e 12 indicadores, o ODS-9 faz parte do quebra-cabeça que busca colocar o planeta nos trilhos do desenvolvimento sustentável.
Apesar dos temas desafiadores do setor para os próximos anos, como, a surpreendente participação do milho na produção de biocombustível, a despeito de sua produtividade agrícola; o desafio de diminuir o imenso desvio padrão da produtividade da cana por hectare, que viaja de 70 a mais de 120 t/ha; a responsabilidade do mix de produção que atualmente privilegia o açúcar em detrimento do etanol; as grandes novidades na área tecnológica que trarão inovações disruptivas e transformadoras, será inescapável o tema da sustentabilidade.
Discutir sustentabilidade na cadeia produtiva do setor é fundamental. Assim, é importante enxergar os milhares pequenas e médias indústrias, os fornecedores de equipamentos e implementos, vitais para a performance do setor, especialmente nos retrotrofits que permitirão enfrentar esses desafios de produtividade.
A participação de indústrias de média escala no valor agregado total da indústria é uma das metas (9.2.3) da ODS-9. Essa meta é aumentar o acesso das pequenas e médias empresas industriais, em particular nos países em desenvolvimento, aos serviços financeiros, incluindo o crédito a preços acessíveis e sua integração nas cadeias de valor e mercados.
É preciso entender como essa cadeia está posicionada diante de todos os objetivos que se espera para 2030. A pergunta é: quanto progresso temos feito em direção ao cumprimento das metas do ODS-9? Falar em sustentabilidade e discutir o ODS-9 no Brasil exigem olhar para a realidade com a sensibilidade que ela merece, visto estarmos a menos de 7 anos do encontro com as metas.
Fica aqui a reflexão de que não há como alcançar o almejado desenvolvimento sustentável deixando partes desse quebra-cabeça para trás. A indústria faz parte desse painel de objetivos. Sustentabilidade é o atual roteiro para o desenvolvimento das indústrias e seus países. Não tem mais como adiar o futuro. Quem ainda não entendeu essa tendência está atrasado. Na década de 80/90, algumas empresas viam a discussão de competitividade como uma perfumaria. Mas no auge da abertura econômica e internacionalização das empresas, evidenciou-se quem entendeu essa regra. Um bom número de grupos empresariais já demonstrou avanços na antecipação desse futuro. Destaco aqui, apenas como referência, a Klabin e a São Martinho.
De acordo com a UNIDO - UN Industrial Development Organization, o índice SDG-9 “compreende as seguintes dimensões: valor agregado da indústria, emprego, sofisticação tecnológica da produção e desempenho ambiental do setor industrial”.
“E aqui a infraestrutura é questão básica de suporte. Ela deve ser entendida de modo amplo, que vai desde a construção e manutenção de portos, aeroportos, ferrovias, terminais para escoamento da produção, até parques de inovação, passando por atendimento de redes de telecomunicações. O desenvolvimento tecnológico e a diversificação industrial têm papel central nesse objetivo, uma vez que possibilita o ganho de eficiência na produção”.
No seu relatório de 2022 a UNIDO, com dados de 2020, o Brasil ocupa a 62ª posição no ranking das nações, (queda de 16 posições desde 2000) e ostenta dificuldades com o valor agregado da indústria relativa ao seu PIB (90ª posição no ranking das nações). Nesse valor agregado, a participação de novas tecnologias é tímida (45º lugar), a emissão de carbono para produzir dentro dos muros da indústria ainda é alta e o percentual de emprego industrial ocupa 55ª posição no ranking. Vale a pena um olhar mais atento aos indicadores do ODS-9, para perceber a clara dicotomia entre o valor agregado da indústria transformadora como proporção do PIB (meta 9.2.1) e o emprego na indústria transformadora como proporção do emprego total (meta 9.2.2).
O leitor poderá interpretar esse artigo como pessimista. Mas não se trata disso. Os índices observados não categorizam a indústria do país, mas seu esforço em alcançar os objetivos acordados. Por isso, o artigo não enxerga a crítica pela metade vazia do copo, mas sim entende que existe um enorme espaço para crescermos, em todas essas dimensões, com políticas públicas corretas e principalmente com envolvimento das lideranças industriais. Temos as ferramentas necessárias e podemos usá-las.
Por exemplo, uma recente pesquisa da CNI constatou que as máquinas e equipamentos industriais têm em média 14 anos e 38% deles já ultrapassou o ciclo de vida ideal. E o setor de biocombustíveis se destaca com a maior idade média de máquinas e equipamentos, acima de 20 anos. Porém, como contrapartida, a boa notícia é que o governo brasileiro em decisão recente autoriza a contabilidade de depreciação acelerada, num momento importante em que se discutem os avanços da Inteligência Artificial, Robótica e Internet das Coisas, em direção a quarta geração da indústria (I-4.0).
Temos, ainda, como ferramentas as vantagens brasileiras da matriz energética limpa, a produção de bioenergia, nossa genuína tecnologia de produção sucroenergética, nossa área agriculturável ainda disponível e uma indústria de base organizada, com arranjos produtivos e clusters prontos para atingir parte fundamental dos Objetivos. Sim, temos ainda um longo, mas esperançoso caminho, e por isso essa provocação para o leitor mergulhar nesses dados e entender quais as melhores práticas para sua atividade, fazendo uma análise 360º no universo de seus stakeholders, valorizando fornecedores no desenvolvimento de um conjunto de soluções e investindo, o mais rápido possível, em novos equipamentos e tecnologias.