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Plinio Mário Nastari

Presidente da Datagro Publicações

Op-AA-25

O retrato atual

Ao atingir moagem de cerca de 660 milhões de toneladas de cana em 2010/11, correspondentes a mais de 30% da cana produzida no mundo, o retrato do setor canavieiro e sucroalcooleiro do Brasil é bem diferente daquele observado antes de iniciado o processo de diversificação na direção do etanol. A diferença começa pela escala de produção.

Em 1975, quando foram moídas 68 milhões de toneladas, o setor era dominado por usinas tradicionais, recém-modernizadas à época pelo Funproçúcar do agora extinto Instituto do Açúcar e do Álcool - IAA, que distribuiu, em 1974, fartos recursos advindos da bonança de preços internacionais do açúcar, que alimentaram as contas do IAA, via exportações, controladas pelo monopólio do governo.

A partir daquele instante, surgiram as destilarias autônomas, com módulos de produção de 120 a 180 mil litros por dia, e representando moagem de 400 a 500 mil toneladas de cana por safra. Na época, eram usinas modernas e consideradas eficientes para os padrões da época. A partir de 1989, a regulação e a intervenção do governo foi sendo eliminada, num processo que durou dez anos.

As cotas de produção e comercialização acabaram junto com os planos de safra, foi eliminada a necessidade de autorizações para movimentação de estoques, os preços foram controlados e os financiamentos, favorecidos. Aos poucos, a produção de açúcar foi crescendo, o setor foi se diversificando cada vez mais e os mercados foram expandindo para o açúcar e o etanol.

Hoje, nenhum projeto de nova instalação industrial é realizado para uma escala inferior a 2 milhões de toneladas  e, via de regra, o planejamento já é feito para duplicação ou triplicação dessas plantas no médio prazo. As atividades agrícolas são desenvolvidas por um modelo de produção de empresa agrícola, em que se busca a otimização do uso da capacidade dos implementos e dos equipamentos de mecanização de plantio e colheita.

Essa é a realidade da produção de cana efetivada tanto pelas usinas, quanto pelos fornecedores. Na maior parte dos países canavieiros, no entanto, a produção agrícola ainda é realizada por fazendeiros de pequeno e médio porte, sem o uso de maquinário em três turnos e de programas eficientes de manutenção preventiva.

Merece reconhecimento a capacidade atual de rapidamente serem desenvolvidos novos projetos em regiões carentes de mão de obra e insumos básicos, sem  infraestrutura de estradas e de redes de distribuição de energia. Mesmo assim, estão surgindo novas plantas em regiões pioneiras, com rápido crescimento de moagem, elevado grau de mecanização agrícola e automação industrial.

O uso de computadores de bordo em equipamentos agrícolas, de GPS para o plantio e a colheita, de controles online de cada operação, e a possibilidade de controle remoto por um laptop a milhares de quilômetros passaram a ser atividades esperadas e comuns no Brasil canavieiro e sucroalcooleiro atual. Ao mesmo tempo que todas estas modernizações  trazem economia e redução de custo, de outro lado está se sofisticando o nível da mão de obra por competição e também por regulamentação.

O padrão de remuneração aumentou muito em todos os níveis, o que tem permitido um aumento de renda considerável nas regiões onde este tipo de indústria  se instala. Além de gerar muita renda, a produção desenvolve-se em muitos elos de uma extensa cadeia de produção, muito diferente da pecuária ou até de muitas outras atividades agrícolas e agroindustriais.

Esse diferencial é observado claramente no desenvolvimento econômico das regiões onde predominam a pecuária extensiva e a produção integrada de cana. O surgimento de grandes grupos econômicos, movimento acelerado pelo processo de consolidação que resultou das recentes crises de preço e liquidez, fez com que surgisse a organização industrial em agrupamentos (clusters) trazendo reduções consideráveis nos custos fixos unitários e permitindo uma administração mais eficiente de compras, logística, utilização de insumos, e aproveitamento de mão de obra chave.

Hoje, o setor é, em muitos casos, verticalizado a montante e a jusante, trazendo economias e permitindo a agregação de valor nos vários elos da cadeia de produção e comercialização. A diversificação caminha celeremente na direção do aproveitamento integral da cana, inicialmente com a cogeração, mas podendo evoluir brevemente para a produção de etanol.

A conversão de sacarose em produtos de maior valor agregado é uma realidade que começa a despontar no caso do polietileno verde, de hidrocarbonetos avançados e de uma cadeia enorme de ingredientes da indústria alimentícia. Hoje é um setor menos pulverizado, mais profissionalizado e com maior acesso a recursos e financiamentos. O retrato do setor sucroalcooleiro de hoje não é o de uma obra acabada.

Ainda está em transformação no seu grau de concentração de produção e comercialização. Está em transformação tecnológica e em transição para se tornar um setor global na área de energia. Na área de alimento, atingiu a condição de líder mundial por não encontrar competição no processo de diversificação implantado há 35 anos, tendo, assim, atingido condições de controlar mais de 50% das exportações mundiais de açúcar.

Na área do etanol, o desenvolvimento global tem grandes perspectivas, em particular pelo potencial de redução das atuais barreiras ao livre comércio. Melhor do que um retrato, é preciso reconhecer que, para descrever este setor, é preciso imaginar um filme. E que esse filme, antes rodado em preto e branco, passou gradualmente para o colorido e, agora, caminha rapidamente para uma superprodução em três dimensões.