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Sonia Liepold-Mai

Tradutora e intérprete de conferências, Augsburg-Alemanha

Op-AA-04

Os biocombustíveis da Alemanha

Com aproximadamente 82,5 milhões de habitantes, 356.733 km² de superfície e 45.022.926 de carros de passeio licenciados, a Alemanha não é apenas um dos países mais populosos da Europa, mas também um dos países com o maior número de automóveis particulares do mundo. Dada a finidade dos combustíveis fósseis, seu impacto sobre o meio ambiente e de sua extração ocorrer majoritariamente em regiões politicamente instáveis, deu-se início à competição mundial pela sua substituição por outras fontes, de preferência renováveis e ecologicamente corretas, capazes de garantir uma mobilidade sustentável a preços estáveis.

Neste sentido, a Alemanha, precursora em questões ecológicas e na implantação de rígidas leis ambientais, sede de uma fortíssima indústria automobilística, está investindo em vários biocombustíveis, como o biodiesel feito com o óleo de colza, o óleo de colza puro, o bioetanol e outros combustíveis sintéticos. Para atingir as metas estabelecidas pelo Protocolo de Kyoto, a União Européia introduziu uma nova diretriz, que estabelece o acréscimo de 2% de biocomponentes aos combustíveis fósseis até o fim deste ano e uma parcela de 5,75%, a ser alcançada até o ano 2010.

Nesta direção o governo alemão alterou a lei fiscal relativa aos óleos minerais, isentando do imposto todos os biocombustíveis e bioaditivos desde janeiro de 2004. No que se refere ao biodiesel (RME – éster metílico de colza), a Alemanha já dispõe de uma rede de aproximadamente 1.800 postos de abastecimento, que oferecem o biocombustível puro, feito com o óleo de colza, uma planta oleaginosa, cultivada para nitrogenar naturalmente os solos exauridos.

Em se tratando de um biocombustível normatizado, foi aprovado pela indústria automobilística, e é hoje utilizado como aditivo ou substituto do diesel fóssil, em automóveis com motor diesel convencional. A crescente aceitação do produto, em função da vantagem financeira transferida pela isenção dos impostos, registra no último ano um aumento de consumo de 30% e de 9% de carros novos a diesel licenciados.

Do ponto de vista ecológico, valem ressaltar a redução das emissões e a sua ótima biodegradabilidade. Desde janeiro, o bioetanol também pode ser acrescentado à gasolina a uma porcentagem de até 5%. Ainda em difusão no país, uma vez que as distribuidoras aguardaram a nova legislação entrar em vigor para acrescentar o bioetanol à gasolina, na forma de ETBE, para substituir o MTBE. A fim de suprir a demanda de bioetanol, estão sendo construídas 3 grandes fábricas, tendo por base predominante a beterraba sacarina e o centeio.

Estima-se que o bioetanol será produzido ao custo de 50-55 centavos de Euro por litro, ao passo que o álcool, no mercado internacional, é oferecido pela metade deste valor. Ou seja, a produção de bioetanol na Alemanha não será competitiva no mercado internacional, mas objetiva suprir parcialmente o mercado interno a curto e médio prazos e, simultaneamente, fomentar o setor agrícola – severamente abalado pelos profundos cortes dos subsídios europeus ao centeio.

O país, certamente, recorrerá à imposição de cotas e taxas de importação para encarecer o bioetanol importado, baseando-se, para isso, nos mecanismos protecionistas da UE, como as negociaçôes entre o Mercosul e a União Européia têm demonstrado recentemente.

Outro biocombustível, o óleo de colza puro, é vendido a um preço inferior ao do biodiesel, já que passa apenas por um processo de filtração. O preço varia conforme a região, pois é produzido geralmente por pequenas usinas, com redes de distribuição limitadas. Apesar do preço competitivo - um litro de óleo de colza é 7ct/l menor que o biodiesel e 28,5 ct/l que o diesel convencional - opõe-se a esta vantagem financeira a grande variação da qualidade e a falta de especificação por uma norma internacional.

Além disso, a maior viscosidade do óleo vegetal puro requer custos com a adaptação do motor na ordem de até 1.000,00 EUR. Dada a descentralização da produção e da distribuição, este combustível destina-se ainda predominantemente para tratores e máquinas agrícolas, navios e frotas de ônibus, de preferência com postos de abastecimento próprios.

O BtL (biomassa para o líquido), combustível à base de refugos de madeira, provenientes da silvicultura e outras biomassas secas, está sendo testado pelo governo federal, em parceria com duas grandes montadoras alemãs: DaimlerChrysler e VW e deve estar disponível a partir de 2015. Trata-se de um combustível sintético, de alta pureza, cujo balanço de CO2 é quase neutro.

A biomassa seca passa por um processo de gaseificação denominado de Carbo-V, durante o qual ela é carbonizada à baixa temperatura e, em seguida, gaseificada a alta temperatura, gerando um gás sintético com o qual se pode produzir diesel, metanol ou hidrogênio, inclusive para a futura fabricação de células de combustível.

Certamente os biocombustíveis já fazem parte do ideário dos consumidores alemães, dispostos a pagar um preço superior por combustíveis menos nocivos ao meio ambiente. Mas o que dificulta a aceitação do biodiesel e/ou do óleo de colza não são os aspectos técnicos, mas o preconceito a um combustível que é servido junto com a salada do churrasco no fim de semana. Quanto ao bioetanol, poucos consumidores sabem de sua existência em seus tanques. Cabe ao governo informar a população sobre a aplicação e benefícios dos novos biocombustíveis, visto que o futuro da mobilidade cabe a eles.