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José Cristóvão Momesso

Diretor do Instituto CANAEX

OpAA85

Como repensar o manejo para evitar os colapsos produtivos

Diante de um clima com criticidade aumentada, a construção de lavouras resilientes começa sob o solo. Não é mais sobre previsão do tempo. É sobre preparo técnico profundo, decisões corajosas e lavouras que possam resistir à próxima crise climática. O setor sucroenergético nacional enfrenta o maior reposicionamento técnico de sua história. Hoje, não basta plantar. É preciso fundar lavouras tecnicamente blindadas, desde a base físico-química do solo até o dossel fisiológico das plantas.

Esta nova era demanda um conceito central: fundar para suportar, manejar para performar. O que antes era secundário, como canteirização localizada, agora são diferenciais competitivos.  A pergunta real é: a sua lavoura está preparada para suportar tudo isso? E a realidade observada? A produtividade não decola?

Observem os dados médios da produtividade do Centro-Sul nos últimos seis anos. Não avançou. Isso mostra que há enormes oportunidades de ganhos de produtividade com consequente avanço da sustentabilidade do negócio sucroenergético nacional, independentemente do clima.   

Este artigo organiza os manejos mais eficazes já testados, que oferecem sustentação agronômica real frente aos novos desafios climáticos da cana-de-açúcar.

Preparo profundo: O Alicerce da Alta Produtividade. Estudos recentes comprovam que a compactação do solo está entre os maiores limitantes físicos à produtividade da cana. A canteirização localizada entre 50 e 70 cm de largura por 60 cm de profundidade, aliada à destruição mecânica da velha soqueira, é uma importante ferramenta.

Diferenciais do preparo profundo com canteirização:
• Descompactação eficaz sem inversão completa;
• Mobilização parcial e em faixas;
• Eliminação de torrões e bolsões de ar;
• Uniformização da sulcação e da cobrição;
• Faixa de 0,8 x 0,6 m altamente favorável ao enraizamento;
• Incorporação de nutrientes corretivos de solo a 60 cm;
• Redução de falhas por problemas físicos na cobrição; etc.

Dados alarmantes confirmam essa urgência. A cana plantada com preparo convencional e superficial, sem incorporação dos nutrientes da correção de solo, apresenta queda de produtividade que pode ultrapassar 27% em anos de déficit hídrico severo. Mais de 40% do sistema radicular da cana se desenvolve abaixo dos 40 cm. Ignorar isso é ignorar a base que sustenta a planta frente à seca, ao calor e às pragas. A "fundação da lavoura" é mais do que uma etapa operacional. É o momento decisivo em que se define o sucesso dos próximos seis ou mais cortes.

Barreiras químicas e corretivos: A redefinição da química do solo. A aplicação de calcário (cálcio e magnésio), gesso e fosfatos reativos com incorporação profunda altera profundamente a dinâmica do alumínio e manganês tóxicos às raízes, eleva a CTC e melhora a saturação por bases. A ação combinada com fósforo, enxofre e potássio cria uma plataforma química favorável para o estabelecimento de raízes profundas. Soratto & Crusciol, em 2008, destacaram que a eficácia do calcário está diretamente associada à sua incorporação e reação com umidade no perfil profundo. Essa base permite a prática de agricultura regenerativa, pois restaura a fertilidade funcional do solo.

O Fósforo invisível: Racionalidade econômica no macro nutriente mais caro. A eficiência agronômica do fósforo no Brasil é imensamente baixa. Estima-se que apenas 5% a 10% do total aplicado é absorvido pela planta. 

Ponto crítico: incorporar fósforo entre 50 e 60 cm, no preparo do solo aumenta a longevidade de sua disponibilidade e reduz perdas por fixação superficial.

Micronutrientes e Magnésio: Arquitetos da Rizogênese. A deficiência de Mg2+ compromete diretamente a relação raiz/parte aérea, limitando o sistema radicular em volume e profundidade. Sua incorporação no perfil do solo, junto de enxofre elementar e outros macros e micronutrientes estratégicos, contribui para a ativação enzimática e a formação de tecidos condutores eficientes.

Microbiologia de precisão: A nova onda de evolução da agricultura: A fábrica de raízes invisíveis. A integração de tecnologias biológicas durante a cobrição, como Trichoderma, Azospirillum, inoculantes multifuncionais, micorrizas e bioestimulantes e outra soluções do mercado, tem gerado ganhos consistentes de enraizamento e redução da demanda hídrica da planta. 

Impactos observados:
Redução do estresse oxidativo; aumento de pelos absorventes; estímulo à nodulação funcional (em solos apropriados); maior eficiência na absorção de fósforo e zinco via micorrizas. Essas tecnologias não apenas ativam o sistema radicular, mas também reduzem o consumo hídrico e aumentam a eficiência da adubação. Porém, nada disso resolve se o preparo não foi profundo, e fósforo, cálcio, magnésio, enxofre e outros nutrientes não forem alocados em sub superfície. 

Esquema genérico de um sistema radicular ideal *Landell, at al

Cobrição inteligente: Quando a mecanização serve à biologia. Compactação sobre a gema, má distribuição de solo e torrões interferem no microambiente da brotação. 

Mudas Sadias: O começo invisível da alta performance. A qualidade das mudas é o primeiro fator determinante para o sucesso de uma lavoura de cana-de-açúcar. Não adianta investir em preparo profundo, nutrição tecnificada e manejo biológico avançado sem o ponto de partida, se as mudas não estão adequadas. 

Sistema integrado de metas: Planejar com ambientes e visão 360° na gestão agrícola, não com intuição. Ao cruzar zonas climáticas regionais, pelos históricos de fatores climáticos, com ambientes de produção, é possível ajustar metas realistas de TCH, evitar frustrações e redirecionar investimentos.

Plantar a estratégia para colher a resiliência das grandes lavouras. A agricultura do improviso se tornou inviável. A única variável que ainda está sob controle pleno do produtor é a Fundação da Lavoura, utilizando-se canteirizador, proporcionando descompactação (80 x 60 cm) e incorporação profunda dos macros e micronutrientes.  

Conclusões:
A nova era da cana-de-açúcar exige gestão mais estratégica. Acionistas alheios a essa nova realidade, juntamente com o corpo diretivo focado em custo por hectare e não por unidade produzida, vão sofrer se não mudarem os paradigmas.  A pergunta: Se você não controla o clima, por que ainda negligencia o único momento em que pode controlar o ambiente da sua lavoura? A resposta está no preparo. E o preparo começa agora, na Fundação da Lavoura.