Diretor Industrial da Usina São Francisco de Sertãozinho
Op-AA-44
Sempre que empresários de qualquer segmento da economia conversam com autoridades, de todos os escalões, principalmente com políticos em cargos técnicos, a conclusão é única: está cada vez mais difícil dialogar com alguém preparado para entender o tema a ser tratado. Não é só na iniciativa privada que falta pessoal especializado. Essa carência é a origem de todas as dificuldades, que vão desaguar, invariavelmente, na sucessão de decisões erradas que cerceiam o desenvolvimento.
Basta observar quantas vezes o governo é obrigado a voltar atrás, corrigir seus rumos, adiar a execução de projetos por causa de erros, hesitações, incertezas. E o trem da história passando, levando como passageiros países emergentes rumo ao topo, e o Brasil correndo o risco de assumir a condição de ”submergente”. Tanto que, no dia 10 deste mês de abril, jornais noticiaram: “FMI: mundo se recupera; Brasil está estagnando”.
O País gasta milhões investindo em educação, mais até do que nações desenvolvidas, para fortalecer a base do seu crescimento. Mas o quadro é o mesmo: faltam profissionais qualificados, em qualquer nível, para ocupar as vagas abertas em todos os setores, por absoluta falta de conhecimento dos candidatos. Boa parte dos que engrossam a fila do desemprego não está nela porque o mercado está fechado – estão excluídos porque não sabem fazer.
O conteúdo dos currículos das escolas técnicas e universitárias está descolado e defasado da necessidade das empresas. É preciso gerar riqueza, mas ela não se encontra no jogo da Bolsa de Valores nem no comodismo do Bolsa Família; não está nos poços de petróleo; nos bancos... Riqueza está no conhecimento, que só se obtém com educação, que amplia a distribuição de renda, aprimora a saúde e abre oportunidades de trabalho. Fora desse caminho, só as loterias ou a corrupção.
Consequências desse desequilíbrio: absorver essa demanda desviada exige tempo e mais gastos para que ela seja aproveitada; se a carga tributária imposta às empresas fosse diretamente do empregador para a formação de trabalhadores, daria enorme velocidade em busca do conhecimento. É lógico que uma empresa, sendo boa gestora dos valores resultantes da educação, do conhecimento e da diversificação, está destinada ao sucesso – desde que o despreparo das autoridades não atrapalhe suas atividades.
É a empresa que conhece o que ela precisa: encurtando esse caminho do encargo social a Brasília, para depois ter de voltar à escola, o resultado será ganho de qualidade, de produtividade, de diversidade, seguido do acesso de formandos cada vez mais jovens prontos para o trabalho. Se isso não mudar, logo veremos estagiários sexagenários – rima, mas não é a solução. Nos segmentos industriais, a tecnologia, tanto a importada quanto a nacional, está muito distante do nível de conhecimento dos profissionais recém-formados. É triste ver a fisionomia de espanto dos que entram num chão de fábrica pela primeira vez.
Tudo parece novidade, quando deveria estar dominado. Nessa hora, governantes e empresários sabem o que precisam, mas não sabem onde encontrar – boa parte já está fora do Brasil. (Procure saber onde se realiza o sonho dos que querem trabalhar na área de pesquisa e desenvolvimento. Certamente não é aqui. É no Brasil que a palavra “louco” se associa com mais frequência à palavra “cientista”.). Quando o empresário brasileiro percebe que não é apenas na empresa dele que os problemas acontecem, certamente os problemas estão na política econômica do governo.
Estudo da Fundação Getúlio Vargas, apresentado ainda neste mês, argumenta que “o grande problema do Brasil está na pouca eficiência do País, na falta de capital humano (educação, treinamento, experiência) e de organização do sistema produtivo, que leva à baixa produtividade”. Acrescenta que, entre essas deficiências, estão “o complexo sistema tributário, a burocracia, a má regulação e a falta de abertura comercial”. E conclui: “A produtividade do trabalhador brasileiro corresponde a 20% da do americano, diferença explicada pela ineficiência da forma de se organizar a economia”.
Nosso agronegócio é um milagre. Em vez de se chamar “Feira Internacional de Tecnologia Agrícola em Ação”, a Agrishow poderia muito bem ser identificada como “A resiliência agrícola brasileira em ação”. É espantosa a conduta errática dos governantes quando têm de tratar dos assuntos do campo. Em conversas com eles sobre exigências básicas para desenvolver nossas atividades, o que mais se vê nos interlocutores são seus olhos arregalados. “O que é isso!?” perguntou certa vez uma autoridade diante da montanha de bagaço de cana pronta para ser queimada nas caldeiras e cogerar eletricidade.
Foi numa usina aqui de Jaboticabal. E essa autoridade era ministra de Minas e Energia! Percorra um shopping com qualquer autoridade ligada ao desenvolvimento industrial. E diga que 85% do que ele vê vem do campo: “É tudo agronegócio, excelência!”
Os efeitos perversos desse despreparo geram absurdos atrás de absurdos. Em que país seu principal produto agrícola não tem lucratividade e resiste, milagrosamente, safra após safra? Só no Brasil.
O empresário de qualquer outra lavoura ainda tem chance de migrar para culturas alternativas a fim de fugir dos prejuízos, certamente provocados pelo governo. Alguém acredita que o açúcar e o etanol, carros-chefes da economia canavieira, não são lucrativos? Enquanto não há produtividade que resista aos preços do açúcar, não há atividade comercial honesta que concorra com produtos que não têm preço de mercado, mas tarifa, para represar artificialmente a inflação.
Foi assim com o etanol até o início deste mês. Por causa dessa prática, quantas unidades produtoras de etanol fecharam no País? Quantos milhares de empregos se perderam? Tivéssemos governantes preparados e conhecedores de seu trabalho, essa tragédia jamais se abateria sobre a Nação. A própria energia do bagaço de cana, elogiada por todas as autoridades, cobiçada mundialmente, não remunera o produtor, só agrega valor, por sua própria natureza. Cogeramos a energia dessa biomassa há mais de um quarto de século, fazemos dela a fonte energética mais econômica e mais limpa do Brasil.
Depois de tanto tempo, parece que foi implantada ontem. Engatinha. Se ela fosse remunerada conforme o ganho ambiental, econômico e social, poderia avançar livre e autossustentável, para explorar o potencial das novas tecnologias que já conquistou. Não existe, ao menos, uma legislação à altura que regulamente o aproveitamento dessa fonte. Tantos investimentos estão à mercê de alterações abruptas, improvisadas, da política e das regras de geração e distribuição de energia.
Houvesse, estaríamos livres de qualquer ameaça de apagões. Não se sabe, por exemplo, onde o governo encontrou fundamentos para prometer energia barata e ter de quintuplicar as tarifas meses depois. Felizmente, há seguro contra apagões, mas, infelizmente, não há contra o atraso oficial. Esse ninguém segura. A cana tem produtos, coprodutos e subprodutos, derivados produtivos e competitivos. Ou teria em grande quantidade e diversidade, se a economia proporcionasse o investimento em pesquisa e tecnologia em parceria com as universidades, sem intervir no mercado. Essa intervenção desencoraja, gera indefinições e, o que é pior, não privilegia o que é brasileiro e renovável, naturalmente benéfico para a sociedade.