Presidente da Copercana e Sindicato Rural de Stz
Op-AA-43
No atual momento da história do Brasil, em que vivemos uma situação bastante grave de falta de um recurso essencial para a vida – a água –, o que afeta a produção de energia elétrica, é oportuno lembrar o slogan da Petrobras, a estatal que, há vários meses, tem estado no centro das atenções, estampando as manchetes de jornal, pelos inúmeros escândalos de corrupção e por conta da política equivocada do Governo Federal para os combustíveis: “O desafio é a nossa energia”.
O lema da maior empresa brasileira bem que poderia ser lido às avessas. “A energia é o nosso desafio” poderia – por que não? – ser a marca de uma nova campanha publicitária. E que desafio! A frase, de trás para frente, reflete um cenário em que, realmente, presenciamos uma inversão de valores. A crise que o país atravessa, liderada pelo poder público, parece se estender para setores primordiais da economia brasileira e dar indícios de generalização.
A indústria, a duras penas, busca o fôlego que lhe garanta a sobrevivência e, com isso, de outros diversos ramos de atividade que dela dependem. O sistema educacional, que pede socorro, não consegue oferecer os subsídios necessários para prover o País de conhecimento e mão de obra qualificada, capazes de reverter a realidade degradante das instituições. Os tentáculos dos desvios éticos e da impunidade crescem e avançam, deixando, como legado, uma ponta de desesperança de que a gestão pública vire verdadeiramente esse jogo.
Basta olhar para a recente pesquisa Datafolha que avaliou o governo de Dilma Rousseff. A pesquisa divulgada no último dia 7 de fevereiro mostra que a aprovação da Presidente despencou de 42% para 23%, quase a metade. A popularidade é mais baixa que a de junho de 2013 (30%), quando uma série de protestos mobilizou o País de norte a sul. Para 52% dos entrevistados, Dilma sabia da corrupção na Petrobras e nada fez para evitá-la.
São informações que evidenciam as incertezas enfrentadas pelo Brasil neste início de 2015 e que vão nos ocupar durante todo este ano e, talvez, por mais alguns ainda. Caso não haja medidas emergenciais, que minimizem os impactos dessas instabilidades que nos têm tirado o sossego e o sono, corremos o iminente risco de pagar um preço alto demais – se é que já não estamos pagando – para problemas que poderiam ter sido solucionados lá atrás, num passado recente. Claro que é preciso contar com uma “mãozinha de São Pedro”, por exemplo, para ajudar a solucionar o profundamente crítico problema da água.
Caso ele atendesse a nossos insistentes pedidos por chuva, o que elevaria, inclusive, a produtividade de nossas lavouras e daria, literalmente, um “refresco” para as dificuldades que perturbam os agricultores, sobretudo os que dependem da cana-de-açúcar, já representaria um tremendo alívio. Mas não podemos esquecer os alertas de especialistas, nos últimos anos, de que a sobrecarga na exploração poderia comprometer os recursos hídricos, antes tão generosos.
Uma hora ou outra, mesmo com a constância de chuvas torrenciais, o uso desenfreado e o desperdício causariam um colapso. Diante disso, não há dúvidas de que a falta de decisões políticas que permitissem reservação de água e investimento em fontes alternativas para geração de energia elétrica, como a biomassa, a eólica e a solar, evitando a dependência excessiva das hidrelétricas, colocou no futuro do nosso desenvolvimento um gigantesco ponto de interrogação.
O mais surpreendente é que a teimosia parece não ter sido vencida, ainda, pelo cansaço. As obras em curso de usinas como a de Belo Monte, no Pará, dão um demonstrativo de que as armas para enfrentar essa guerra continuam apontando na direção errada. Enquanto isso, o setor sucroenergético sofre com o abandono, agravado nos últimos quatro anos, em função da ausência de uma política sólida e segura para o etanol e para a bioeletricidade a partir do bagaço e da palha da cana.
A política de controle da inflação por meio do congelamento do preço da gasolina, que contribuiu para a penúria financeira da Petrobras, penalizou, também, de forma significativa, nosso combustível limpo e renovável, em detrimento dos derivados fósseis. Praticamente, um atentado contra um setor que busca dar ao Governo Federal, de bandeja, muitas das soluções de que ele necessita para encarar a crise.
As recentes atitudes tomadas, de significativa interferência do Estado na economia, só não condenaram, ainda mais, a cadeia produtiva da cana-de-açúcar e seus esforços para o desenvolvimento de novas tecnologias, porque existe uma obstinação do setor em acreditar na retomada, em participar da construção de um país pujante, pleno de empregos e qualidade de vida. Cerca de 80 usinas fecharam suas portas nesse período. Todas autossuficientes em energia elétrica proveniente de resíduos da produção de cana-de-açúcar e muitas delas equipadas e preparadas para a venda de excedentes para a rede.
Um leve impulso a esse sistema, entre cujos muitos benefícios oferecidos está o sequestro de poluentes e a transformação em créditos de carbono, ajudaria a torná-lo um dos carros-chefes da geração de eletricidade no Brasil e – o melhor – sem o risco de apagões. Em novembro de 2013, de acordo com a Unica – União da Indústria de Cana-de-Açúcar, a energia gerada por 474 usinas sucroenergéticas em operação atingiu um total de 11.250 MW, o equivalente ao que a hidrelétrica de Belo Monte terá em potência instalada.
Até 2020, a previsão é produzir 14 mil MW, mesmo volume da usina de Itaipu, a segunda maior do mundo, atrás apenas da chinesa de Três Gargantas (22.400 MW). Não bastasse isso, a demanda por energia limpa cresce a saltos largos no Brasil. Em 2008, as fontes não renováveis, como o petróleo, respondiam por 54% do consumo de energia no País. De lá para cá, a participação das fontes renováveis cresceu 9,5% ao ano, com destaque para a biomassa da cana-de-açúcar.
O etanol, por sua vez, tem a chance de se consolidar, não só no mercado interno, mas além das fronteiras do País, como caminho viável para assegurar a responsabilidade ambiental, tão preconizada pelos protocolos mundiais. O biocombustível, no entanto, perdeu competitividade e ainda patina para retomar a força que impulsionou a produção e o aumento do consumo dos carros flex, o que deu poder de escolha aos consumidores brasileiros.
Desperdiçar, portanto, todas essas potencialidades é reforçar a inversão de valores que faz o Brasil andar para trás, sem energia para avançar. Um contrassenso, já que, no setor sucroenergético, por exemplo, há energia sobrando: a energia do trabalho, do empreendedorismo, dos homens que sustentam a cadeia canavieira. Energia limpa e renovável. O que falta, então, é a energia de quem dá as cartas na esfera pública, para formar uma coalizão que enfrente os urgentes desafios com diálogo e transparência.