Presidente da Sociedade Rural Brasileira
Op-AA-42
O Plano Decenal de Expansão de Energia para 2023, publicado pelo Ministério de Minas e Energia, prioriza as fontes renováveis no atendimento ao crescente consumo energético do País. Alinhado à Política Nacional sobre Mudanças do Clima, o documento assinala que a valorização da energia “verde” é um compromisso brasileiro e que o crescimento econômico será baseado em uma matriz energética limpa e renovável.
No mesmo Plano, o etanol é apontado como indispensável para o Brasil. Entretanto, como se fossem políticas de países diferentes, o Governo Federal vem despejando medidas e mais medidas desastrosas para o setor sucroenergético. No Plano, o etanol é compreendido como imprescindível, mas o caminho para que isso se concretize não está sendo pavimentado, aliás, muito pelo contrário.
Há pouco tempo, na administração do presidente Lula, o etanol foi alardeado mundo afora como o melhor programa energético para atender à demanda mundial por soluções ambientalmente corretas. Houve o estímulo ao aumento da frota de veículos flex-fuel e a perspectiva de exportação do produto. Toda essa expectativa desencadeou um boom de investimentos e aquisições a partir de 2006, mas nem todos os projetos foram bem planejados ou alavancados, com a maioria guiada por uma miopia acerca das ameaças financeiras e operacionais embutidas no negócio.
Com a crise financeira de 2008, os riscos aumentaram, e as taxas de retorno exigidas pelo mercado subiram e levaram ao cancelamento de investimentos e novos recursos. Simultaneamente, no momento em que o governo deveria promover mecanismos para atenuar a crise, acirrou-se a política governamental favorável ao uso da gasolina, por meio da retirada da CIDE e a redução dos preços da energia de biomassa nos leilões de energia para níveis que inviabilizavam investimentos.
Em 2009, 60% dos veículos que dispunham da tecnologia flex-fuel rodavam com etanol. Hoje, o market share do etanol está em 35%. Um desastre para o setor e para o Brasil. Adicionalmente, o setor sucroenergético está enfrentando desafios operacionais, climáticos, regulatórios e de mercado, que, quando combinados à catastrófica política governamental, trazem como desfecho uma “tempestade perfeita”.
Na última década, com a expectativa de um crescimento infinito e desconhecimento dos desafios de implantação, o setor foi bombardeado com o aumento de exigências ambientais e trabalhistas que forçaram as empresas a intensificar o uso da mecanização e a mudar as técnicas tradicionais de cultivo das lavouras. Infelizmente, isso tudo aconteceu muito rapidamente e em anos marcados por períodos climáticos muito fora do normal e sem a disponibilidade de mão de obra qualificada para pilotar as novas máquinas.
O resultado foi a quebra de produtividade, explosão dos custos, aplicação de multas indiscriminadamente e prejuízos gigantescos. O desincentivo ao etanol levou ainda à elevação da oferta de açúcar no mercado internacional, derrubando os preços abaixo dos novos custos de produção praticados no Brasil. Esse cenário levou empresas menos eficientes a grandes perdas, com um número elevado de fechamento (mais de 50 usinas) e aumento do endividamento, o que, consequentemente, atingiu plantadores de cana, fornecedores de equipamentos, cidades e pessoas de economias regionais que têm no agronegócio da cana seu lastro de confiança.
É inquestionável que, no segmento de combustíveis, as regras de um mercado livre estão sendo desrespeitadas. O setor quer saber qual será o posicionamento do Governo Dilma, neste segundo mandato, acerca do papel do etanol na matriz energética. A ausência total de previsibilidade, até agora, é o cerne da questão. Não se preconiza a escolha desta em detrimento daquela fonte de energia.
O que se cobra é transparência e menos interferência governamental no setor. Não se deve esperar nada mais do governo do que uma política clara e consistente, que tenha como intuito facilitar o ambiente de negócios, com foco na livre iniciativa, empreendedorismo e geração de riqueza, oferecendo condições para que os setores produtivos fortaleçam sua competitividade.
A recuperação do setor sucroenergético será lenta e deverá ser articulada e executada pelo próprio segmento. O foco deve ser na redução incansável de custos, aumento da eficiência e otimização dos processos. Passada a crise mais aguda, devemos estar preparados para um novo ciclo intenso de fusões e aquisições, para que a verticalização e escala possam ser alcançados. Os que não se articularem para fazer parte de um grande grupo estarão fora do jogo.