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Carlos Eduardo Vaz Rossell

Coordenador do Projeto Hidrólise Ácida do NIPE-Unicamp

Op-AA-12

Álcool de celulose, por hidrólise ácida, com solvente orgânico

No desempenho atual de uma destilaria, operando com a tecnologia existente otimizada, são obtidos 6.300 litros de etanol, por hectare, ao ano. Esta produção é obtida dos açúcares extraíveis da cana (sacarose e açúcares redutores), que são fermentados a etanol e posteriormente recuperados por destilação, retificação e desidratação.

O restante da cana-de-açúcar, ou seja, o bagaço remanescente após a extração (aproximadamente 280 kg por tonelada de cana), é utilizado, principalmente, para a obtenção das energias térmicas e eletromecânicas necessárias para operar a destilaria, gerando, em alguns casos, excedentes de energia elétrica. O potencial energético dos resíduos da colheita – ponteiro, folhas verdes e secas (aproximadamente 280 kg por tonelada de cana, expressos como bagaço equivalente) – não é aproveitado.
 
Estas duas matérias-primas de origem vegetal – o bagaço e os resíduos da colheita – possuem, na sua constituição, os polímeros celulose, hemicelulose e lignina. A celulose, um polímero linear, quando hidrolisada, produz glicose fermentescível a etanol. A hemicelulose hidrolisada rende, preferencialmente, pentoses e um remanescente de hexoses, sendo que as pentoses, na medida em que seja realizado um esforço expressivo em pesquisa e desenvolvimento, também poderão ser transformadas a etanol.

O resíduo de lignina pode ser empregado como combustível primário. O teor de celulose e hemicelulose de uma tonelada de bagaço têm potencial para gerar 186 litros de etanol, 123 provenientes da celulose e 63 da hemicelulose. Considerando eficiências de conversão, pode-se estimar que uma tecnologia de introdução, aproveitando apenas as hexoses, poderia gerar 94-105 litros de etanol, enquanto que uma vez otimizada, atingir-se-ia 149-166 litros.
 
Portanto, a hidrólise é uma tecnologia de importância estratégica para aumentar a oferta de etanol, sem requerer o aumento da área de plantio. Passa-se da Usina convencional a uma Biorefinaria, realizando um processamento mais racional da cana, com geração eficiente de energia, para acumular excedentes de bagaço. Da mesma forma, o aproveitamento dos resíduos da colheita, como combustível primário, em substituição ao bagaço, é determinante.
 
Estudos preliminares permitem projetar que uma Destilaria poderá, num primeiro estágio (2015), recuperando 25% dos resíduos da colheita, gerar um excedente de bagaço de 134 kg por tonelada de cana, enquanto que para uma condição de maior eficiência de geração e uso de energia e com a recuperação de 50% da palha (2025), poderia acumular excedentes equivalentes a 231 kg de bagaço. Estes valores representam aproximadamente 15,1% e 41,2% a mais de etanol, respectivamente.
 
O desafio está em conseguir realizar esta transformação do material celulósico, através da hidrólise, para obter etanol de uma forma eficiente e a custos de produção equivalentes aos do etanol do açúcar, por um processo energeticamente eficiente e sustentável, o que é extremadamente complexo. A Dedini vem desenvolvendo um processo de hidrólise de bagaço há aproximadamente 20 anos, procurando aumentar a oferta de etanol e agregar valor ao bagaço e aos resíduos da colheita.
 
A tecnologia DHR foi desenvolvida inicialmente em laboratório e em seqüência numa unidade piloto de 500 kg/dia de bagaço. Esta última deu origem à fase atual, em escala de demonstração piloto (50 ton/dia), iniciada em 2000, com o lançamento do projeto: Processo DHR - Dedini Hidrólise Rápida – Projeto, Implantação e operação da unidade de Desenvolvimento de Processo - UDP.
 
Este projeto é uma parceria envolvendo a Dedini, a Fapesp e outros, cujo propósito é desenvolver uma tecnologia específica para o setor sucroalcooleiro, integrando uma unidade de hidrólise de bagaço à Destilaria de etanol e complementando as instalações industriais de fermentação, destilação, desidratação, geração de energia e tratamento de efluentes.
 
A tecnologia DHR emprega um solvente orgânico: etanol-água (70:30) e ácido sulfúrico diluído como catalisador. O solvente desestrutura a forte matriz cristalina do complexo celulose-hemicelulose-lignina. A hemicelulose hidrolisa rapidamente a pentose, a lignina dissolve-se no solvente, ficando a celulose exposta à hidrólise ácida, que agora transcorre rapidamente (5-15 minutos) a 170-190ºC e 20-25 bar.
 
O licor é imediatamente resfriado por evaporação flash, impedindo as reações secundárias de decomposição dos carboidratos e, em seqüência, submetido a uma destilação para recuperar e retornar o etanol ao processo. A lignina separa-se durante a deflegmação e o licor final, contendo os açúcares redutores, é recuperado, clarificado e conduzido à Destilaria, para ser fermentado com os mostos açucarados.
 
O processo é contínuo. A unidade foi instalada em 2002, no parque industrial da DediniAgro, Pirassununga, SP, tendo passado por uma série de adequações, até operar uniforme e estável, na capacidade nominal prevista. Foi necessário vencer desafios, tais como: a alimentação contínua de bagaço, sob a pressão de 20 bar; a operação de um reator estanque com misturas hidro-alcoólicas, inflamáveis a alta temperatura; e o desenvolvimento de ligas resistentes à corrosão e à abrasão.

Atualmente, o processo se encontra na fase de ajustes, para reproduzir os resultados anteriormente obtidos na fase piloto. Nas próximas etapas, está prevista a otimização do processo, envolvendo a reformulação do reator e de equipamentos periféricos, para aumentar a conversão em açúcares redutores; a comprovação, em escala de demonstração, da fermentação do licor de hidrólise, associado ao mosto da destilaria; e o levantamento de parâmetros, para projeto de uma unidade industrial pioneira.