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Henrique Mendes de Araujo

Diretor de Relações Institucionais e Governamentais da Copersucar

OpAA82

A mobilidade de baixo carbono do Brasil
Sem dúvida a humanidade está enfrentando o seu maior desafio de existência e perenidade: as mudanças climáticas. Esse desafio é único na história, especialmente porque as múltiplas soluções que precisam ser executadas não terão efeito se realizadas de forma isolada por alguns países e/ou regiões. Todos precisam contribuir.

A verdade imposta pelos fatos é a de que a nossa sociedade está fundamentada no consumo de bens e na necessidade energética 
mantida por meio do uso de combustíveis fósseis, cujo resultado da utilização é a emissão excessiva de gás carbônico na atmosfera, o que provoca o tão propagado efeito estufa, causando o aumento da temperatura média em todo o planeta.

Com o aumento da temperatura média, muitos fenômenos climáticos têm-se intensificado em severidade e frequência, já afetando toda sociedade e com potencial de afetar negativamente o mundo todo. De forma muito resumida, outra imposição dos fatos é que a saída para combater a origem dessas consequências é a descarbonização da economia global.

É nesse contexto climático global que todos os dias dezenas de notícias dão conta de que o Brasil tem um potencial muito grande de colaborar com a necessidade que o mundo enfrenta de descarbonização da economia. Pois bem, o que tem sido feito e como podemos colaborar com esse potencial são questões muito comuns que as organizações empresariais e entidades de representação se têm desafiado a desenvolver.
 
Minha proposta aqui é abordar essas questões sobre o aspecto da mobilidade terrestre. Como o Brasil pode ter uma matriz de transportes eficiente do ponto de vista energético, ambiental e socioeconômico. Assim, se a questão a ser respondida na origem do desafio global é a descarbonização, também na matriz de transportes as possíveis múltiplas soluções precisam entregar uma mobilidade de baixo carbono. Proponho que a consideração da mobilidade de baixo carbono deve levar em cinta a sustentabilidade ampla, que se constitui no atendimento de três eixos: social, econômico e ambiental.
 
Socialmente eficiente, garantido acesso à população de forma democrática e, portanto, abrangente às soluções que sejam desenvolvidas e incentivadas pelas políticas públicas. Economicamente viável, de forma a que possam ser desenvolvidos, mantidos e melhorados os veículos e insumos energéticos. Assim, as soluções de mobilidades devem seguir ou adotar as rotas tecnológicas capazes de cumprir com demandas sociais e econômicas.  

E por fim, mas tão relevante quanto as demais, as soluções devem ser ambientalmente eficazes. Não adianta olhar apenas para uma parte da cadeia da mobilidade, isto é, o insumo energético (combustíveis) ou o uso de um veículo. É preciso olhar o ciclo completo para que as soluções sejam eficientes em relação à temática ambiental. 

Há uma frase atribuída a alguns executivos de alto escalão da indústria automotiva que carrega uma mensagem muito precisa sobre esse aspecto: “O inimigo é o carbono e não a tecnologia A ou B.” Portanto, quando a abordagem da descarbonização se refere à mobilidade, é imperativo que consideremos o ciclo todo – produção, uso e destinação ou descarte no fim da vida de um veículo. 

Aliás, vale aqui um rápido comentário: a metodologia ACL,  Análise de Ciclo de Vida, é um consenso técnico-científico que, como veremos à frente, foi adotado na legislação brasileira que versa sobre mobilidade. Felizmente, o Brasil escolheu em sua legislação considerar a Análise do Ciclo de Vida na medição das emissões de gás carbônico na matriz de transportes, especialmente nos veículos leves e comerciais leves. 

Ainda no primeiro semestre deste ano, uma Lei Federal estabeleceu o programa MOVER – Mobilidade Verde. Trata-se de um relevante avanço da política industrial automotiva que concede incentivos fiscais para produtos que sejam acessíveis e eficientes com relação a emissões de CO2.

O Brasil de certa forma sempre primou pela existência de políticas que incentivem o desenvolvimento da indústria, em especial a automotiva. Programas famosos como o plano de substituição de importações, ainda na década de 1950, que foi responsável pela implementação da indústria desse segmento no Brasil, passando pelos incentivos aos chamados “carros populares” na década de 1990, chegando aos mais recentes como o Inovar Auto que estimulou o incremento do nível de nacionalização e atraiu a vinda de mais montadoras nos anos 2010, e, por fim, o antecessor do MOVER, o Programa Rota 2030, que concedeu incentivos por meio de benefícios fiscais como a redução de IPI para veículos eficientes sob o aspecto de consumo e que adotassem tecnologias que os tornassem mais seguros. 

No entanto, o grande destaque e inovação do MOVER é que se trata da primeira legislação no mundo que considera o ciclo de vida completo da mobilidade, o chamado “berço ao túmulo”.  

A partir de 2027, o Brasil fará a apuração das emissões de gases de efeito estufa no ciclo poço-à-roda. E, a partir de 2032, será adotado o ciclo de vida completo, incluindo a produção, montagem e descarte do veículo. A partir dessas medições, serão estabelecidas metas que, se atingidas, resultarão em incentivos fiscais.

Eu não poderia abordar o tema da descarbonização da matriz de transportes sem considerar uma outra recente legislação aprovada no Brasil. A Lei Federal que instituiu o Programa Combustível do Futuro. De forma muito resumida, posso dizer que essa legislação, em consonância com o Mover, viabiliza que as avalições dos combustíveis e dos veículos sejam precisas e realmente eficientes sob o aspecto, principalmente nesse caso, ambiental.

E é nesse ponto que entram os biocombustíveis. O Brasil incentiva o desenvolvimento e uso de biocombustíveis muito antes das questões ambientais que são colocadas pelo desafio do aquecimento global. Começamos com o etanol, dada a necessidade energética e os impactos que os aumentos e a dependência de importação do petróleo impuseram ainda na década de 1970.

Mas, à parte dessa história, que podemos abordar no futuro, o fato é que chegamos ao ano de 2024 com uma adequada disponibilidade de etanol que contribui com o meio ambiente e cumpre com as dimensões sociais e econômicas. 

Em conclusão, quando observamos os atuais avanços legislativos, há um claro compromisso do Brasil com o desenvolvimento de soluções de mobilidade mais limpas, respeitando as dimensões econômicas e sociais sem deixar de lado a segurança energética.

É dessa forma que o Brasil já contribui com o desafio global da descarbonização e terá ainda mais relevância nos próximos anos com a implementação da Mobilidade de Baixo Carbono do Brasil.