Especialista em Tecnologia Agroindustrial do CTC
Op-AA-32
O que fazer com cerca de 70 milhões de toneladas de palha de cana-de-açúcar – mais de 40 milhões apenas no estado de São Paulo –, produzidas anualmente no País durante a safra, com potencial de gerar eletricidade para mais de 10 milhões de residências?
A resposta ganha importância econômica e estratégica, quando se sabe que quase toda essa produção é queimada nos locais onde se processa a colheita manual ou então é deixada no campo.
Existem experiências de aproveitamento energético da palha, mas são estatisticamente inexpressivas diante do seu volume de disponibilidade anual. Foi diante desse contexto que o CTC iniciou, há dois anos, um projeto em parceria com a New Holland, que permitiu a criação de um sistema agrícolo-industrial eficiente e economicamente viável para aproveitamento da palha através de enfardamento.
Essas novas máquinas para enfardamento da palha – volume composto não apenas de folhas secas, mas também de folhas verdes e a ponta das plantas secas pelo sol – já estão na iminência de serem usadas pelas usinas.
A conjugação de esforços do CTC – com seu conhecimento sobre o setor sucroenergético – e da New Holland – líder mundial em máquinas de fenação e forragem – resultou em uma sinergia criativa entre os dois polos de pesquisa. Esse sistema agrícolo-industrial consiste em três etapas distintas.
A etapa inicial refere-se à recomendação da quantidade de palha a ser removida dos canaviais, atividade atualmente em desenvolvimento pelo CTC, baseada nas condições de solo e clima de cada região e também à presença de pragas ou doenças associadas à presença de palha, visando promover a sustentabilidade da operação. Após a recomendação, iniciam-se as operações agrícolas para o recolhimento da palha, formação e transporte dos fardos.
Quando a palha enfardada chega à unidade industrial, começa a terceira etapa, que é a do seu processamento, visando à queima nas caldeiras de bagaço. Além da utilização do sistema de recolhimento de palha através do enfardamento para a geração de energia térmica e elétrica nas caldeiras, esse material terá, no futuro, distintas aplicações, tais como, no médio prazo, matéria-prima do etanol de segunda geração e, no longo prazo, importante insumo em técnicas mais eficientes em transformação termoquímica da biomassa: gaseificação e pirólise.
A rota de recolhimento através do enfardamento inicia-se com a colheita mecanizada convencional da cana-de-açúcar, na qual as folhas verdes, secas e palmitos deixados no campo são expostos ao sol durante 7 a 10 dias para que sua umidade caia de 45-40% para valores em torno de 12-15%.
Com a umidade correta para o enfardamento, realiza-se o aleiramento, com formação de leiras de palha espaçadas a cada 7,5 m, seguida pela operação de enfardamento, onde ela é recolhida e compactada em fardos com peso aproximado de 470 kg, automaticamente depositados no solo.
A carreta recolhe esses fardos e os transporta até os carreadores, onde são colocados em equipamentos rodoviários projetados para essa finalidade. Ao chegar à indústria, os fardos são descarregados em unidades processadoras para o desenfardamento.
O material é desagregado para tornar mais fácil sua limpeza em esteiras rotativas, que eliminam impurezas minerais. Depois, é triturado até atingir a granulometria adequada, ser misturado ao bagaço e queimado nas caldeiras. Em todo o desenvolvimento do projeto, pensamos no princípio de cadeia de suprimentos, de modo a fornecer uma solução completa, com visão do sistema.
Do ponto de vista energético, a palha tem um papel muito importante, pois representa cerca de um terço de toda a energia contida nos canaviais, com aproximadamente a mesma quantidade de energia disponível nas fibras (bagaço) e no caldo transformado em açúcar ou etanol.
Por possuir uma baixa umidade no momento do enfardamento, uma tonelada de palha enfardada retém a mesma quantidade de energia de aproximadamente 1,8 tonelada de bagaço com umidade de 50% e é capaz de gerar cerca de 0,7 MWh em energia elétrica nas termoelétricas, normalmente instaladas nas usinas. No futuro imediato, a principal tarefa será introduzir e difundir, em escala comercial, as tecnologias da parte agrícola e do processamento de picagem na indústria.
No curto prazo, o foco será melhorar a operação, reduzindo os custos e melhorando a qualidade da matéria-prima (fato semelhante ocorreu com a ampliação da mecanização da colheita). No longo prazo, o direcionamento das pesquisas será concentrado em novos sistemas de maior capacidade, com tecnologias inovadoras e de ruptura, que reduzam significativamente os custos, viabilizando o fornecimento da palha como insumo nas biorrefinarias.