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Paulo de Araújo Rodrigues

Diretor do Condomínio Agrícola Santa Izabel

Op-AA-55

Senso e equilíbrio: passaporte para a sustentabilidade
Nos últimos dez anos, nosso setor viveu problemas e dificuldades que vão desde o acesso ao crédito, a partir da crise de 2008, passando por políticas públicas equivocadas e inconstantes, problemas climáticos, como a grande seca de 2014 e geadas em diversas regiões, até a rápida transformação do sistema de produção, com a mecanização da colheita e plantio. Isso tudo sem falar na questão de infraestrutura e logística do País, aumento da carga tributária, legislação trabalhista e insegurança jurídica, que, apesar do Novo Código Florestal, ainda persistem em algumas instâncias. 
 
A soma desses fatores afetou nossa capacidade de produção, investimento e inovação, aumentou o endividamento do setor e provocou o fechamento de dezenas de unidades industriais e a saída de muitos agricultores da atividade. Pior, com a redução da produtividade e o aumento de custos, perdemos nossa competitividade em relação a outros países produtores, a capacidade de atrair novos investidores, e, como consequência, a estagnação da oferta de ATR.
 
Tudo indica que a safra 2018/2019 deverá ser menor que a atual, com menor produtividade, canaviais mais velhos e falhados, castigados pelo longo período de déficit hídrico, que se estendeu de meados de fevereiro a novembro de 2017, nas principais regiões produtoras do País, e ainda mais dependentes das chuvas de março e abril. Por outro lado, não existem, no momento, sinais de recuperação significativa de preços para nossos principais produtos. Ou seja, teremos outro ano de margens apertadas, com baixo nível de investimento e sem conseguir reduzir o endividamento. 
 
Apesar de tudo, ao final de 2017, tivemos alguns pontos positivos, como a Reforma Trabalhista. Ela deverá melhorar as relações de trabalho e dar mais segurança jurídica à medida que o exercício trouxer pacificação para os pontos ainda polêmicos e possibilitar redução de custos para o setor, sem redução de remuneração dos trabalhadores, a aprovação do projeto para renegociação das dívidas e a redução da alíquota do Funrural. 
 
Os indicadores econômicos apontam para a retomada gradativa da atividade econômica, indicando aumento de consumo dos brasileiros, com efeito positivo para o setor nas vendas de etanol e, já quase nos acréscimos, o RenovaBio, que, nos próximos anos, deverá incentivar os produtores a serem mais eficientes, dar maior previsibilidade e credibilidade para o setor, viabilizando a retomada de investimentos e a atração de novos capitais. Isso, claro, se as regulamentações e normas forem devidamente discutidas, implantadas, e o programa for traduzido em ganhos para todos na cadeia produtiva, assim como para o Brasil.
 
Esses pontos podem ser o início da retomada do crescimento sustentado do setor sucroenergético, aumentando ainda mais o protagonismo na economia brasileira e mundial e consolidar nossa liderança na produção de energia renovável e de alimentos, contribuindo para o País não só com a geração de emprego, renda e saldo na balança comercial, como também para atingir as metas de redução de emissões previstas no acordo de Paris. Mas, sem ilusões, muito ainda terá de ser feito!
 
Dentro das fazendas, precisamos aumentar a produtividade dos nossos canaviais em quilogramas de ATR pela área total de produção e não somente pela área colhida. Isso significa mais toneladas por hectare, mais ATRs por tonelada e menor área de reforma, para sair, em pouco tempo, das 9 a 10 toneladas de ATR por hectare total para, pelo menos, as 15 toneladas de ATR que já estão sendo produzidas com beterraba na Europa. Para isso, precisamos consolidar os sistemas mecanizados de plantio e de colheita, incorporar agricultura de precisão, piloto automático e sistemas inteligentes na gestão da atividade agrícola,
 
intensificar os sistemas de rotação, sucessão e consórcio de culturas com a cana, rever nossos conceitos de nutrição e manejo integrado de pragas, doenças e plantas daninhas, aplicar insumos modernos e controle biológico de forma integrada e melhorar a qualidade da muda com MPB, meiosi e cantosi, multiplicando novas variedades desenvolvidas pelos programas de melhoramento.
 
Tudo isso sem esquecer a renovação de frota motomecanizada envelhecida e, principalmente, treinar e capacitar pessoas envolvidas em todos os processos. Só assim conseguiremos reduzir custos unitários de produção e voltar para o jogo, de forma competitiva. Embora pareça simples e seja uma receita que todos conhecem, chamo a atenção para dois fatores fundamentais.
 
O primeiro é o apoio e o financiamento à pesquisa. Alguns segmentos, como o melhoramento varietal, podem ser resolvidos com adequadas políticas de cobrança de royalties, baseados nos incrementos de produtividade e de renda. Para outras áreas, deveríamos desenvolver um sistema integrado de pesquisa, liderado por um fórum, composto por produtores de cana, indústrias, fornecedores de máquinas e de insumos e pesquisadores, responsável pelo levantamento e gestão de recursos públicos e privados que seriam aplicados de forma coordenada, atacando os principais gargalos da nossa atividade com foco em resultados. 
 
Uma verdadeira rede compartilhada que poderia maximizar o uso dos sempre escassos recursos financeiros, como tê'm defendido alguns especialistas e pensadores do setor. A pesquisa é a única maneira de continuar aprendendo, melhorar os processos e buscar técnicas e insumos inovadores, capazes de contribuir, de maneira continuada, para o aumento da produtividade.
 
A outra questão é a remuneração da cana, pilar da relação entre produtores de cana e indústria, que, num setor moderno e sustentável, deve ser equilibrada e transparente. A Orplana tem apresentado estudos que mostram uma defasagem no cálculo do valor do ATR na ordem de 14,96%, mas a revisão do sistema não progride como programado.

Nosso modelo de valoração pode ser considerado um sucesso na sua implantação, mas passa da hora de modernizar e flexibilizar as regras para remuneração de cana do Consecana, respeitando características regionais e individuais, reconhecendo as qualidades e a eficiência de cada produtor. Sem renda adequada, toda essa discussão é inútil, e não há futuro para o produtor de cana, cada vez mais pressionado pelo aumento de custos e da complexidade do sistema de produção.