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Valmir Barbosa

Consultor Sênior da Datagro Alta Performance

OpAA70

Canavial se faz com capricho no preparo, no plantio, nos tratos e na colheita

O canavial do novo patamar tem produtividade estável acima de 100 t/ha e longevidade acima de 6 cortes. Para isso, já existe tecnologia. Já existem casos concretos. Parece simples assim, mas não é. Vejam um exemplo real: tive uma safra com produtividade de 72 t/ha, que foi excelente, todos ficamos satisfeitos, porque era um novo patamar, pois, dois anos antes, havia sido 54 t/ha. Portanto, cada empresa e sua circunstância tem o seu novo patamar. Poucas vezes, vimos uma diversidade tão grande de situações entre as empresas sucroenergéticas, em patamares tão diferentes.


As causas dessas diferenças são as mais diversas e compreensíveis.  Mas uma coisa parece certa: o foco deve ser o canavial, enquanto os equipamentos, softwares, etc.  são ferramentas, sejam de que natureza forem, seja qual for a tecnologia. E canavial se faz com capricho no preparo, plantio, tratos e colheita.


A colheita, pelo seu alto custo direto, por estar “na boca do caixa” e por ser muito visível, tem atraído atenção e feito muita gente se descuidar do plantio e tratos. A rota deve ser mais ou menos assim: os tratos, quando bem-feitos, dão longevidade e melhoram o plantio.


O plantio melhor facilita e melhora os tratos. Plantio e tratos têm que melhorar o canavial. Canavial melhor dá rendimento para a colhedora. Colheita estável e cana limpa dão rendimento na indústria. E todos ficamos satisfeitos.


Belchior cantava “que o novo, o novo sempre vem”. A nós cabe fazer com que o novo seja melhor. E isso tem início na visão do futuro que criamos e temos que perseguir. Foi assim para o uso racional da vinhaça, para a colheita da cana sem queima, o melhorar as áreas de preservação, o cogerar eletricidade, o melhorar a vida do trabalhador ... (uma pausa para lembrar o tanto que de fato fizemos). E as visões de futuro que tenho hoje, que posso chamar de desafios, são a estabilidade da governança, fazer crescer a produtividade da terra e liberar espaço ou buscar mercado para esse crescimento.


Além de alimento, produzir energia limpa e renovável é o desafio planetário de hoje. No que o setor sucroenergético tem a virtude de ser uma cadeia longa e larga suficiente para oferecer muitas oportunidades. Esse é o nosso negócio. Vejo um futuro com carros e caminhões a hidrogênio do etanol. E vejo também pessoas, aos milhões, ocupadas em produzir biomassa e eletricidade limpa, podendo crescer no mesmo emprego por muitos anos.


Incêndio no campo é um dos maiores riscos de todo produtor de cana. Sua prevenção e combate têm que receber atenção não só na seca, mas também agora, na chuva, mantendo aceiros limpos e as bordas das reservas plantadas com vegetação de cobertura para controlar o capim. Faixas de contenção, como faixas sem palha em locais estratégicos do canavial, pela colheita integral ou “recolheita” da palha, são necessárias para o controle de incêndios.


A sistematização, que é o trabalho de terraplenagem para fazer o terreno ficar adequado para o plantio, precisa ter projeto elaborado com tempo e cuidado porque deve ser perpétuo. Como são os milenares terraços de cultivo de arroz nos países orientais. Fazendo assim, daqui a alguns anos, a operação de sistematização será desnecessária, e seu custo, reduzido. E o solo estabilizado terá grande ganho e conservação da fertilidade.


O plantio será direto, com erradicação mecânica ou química. O plantio de colmos, de gemas isoladas ou de mudas brotadas, acho que vão conviver entre si.


Cada uma delas tendo sua aplicação. Hoje, no meu sítio, faço replantio de mudas brotadas, de colmo e de divisão de soqueira, conforme a disponibilidade. Os plantios mecanizado e manual deverão conviver entre si por muito tempo, pois cada um tem seu lugar, dependendo de particularidades da empresa. Seja qual for, é essencial que a qualidade do plantio tenha garantia da formação de um canavial produtivo e longevo. Para isso, também temos métodos.


A escolha de variedades depende do objetivo do negócio e do mercado. Pensando no conjunto do mercado de açúcar, de álcool, de biomassa e de eletricidade, a escolha das variedades tem grande flexibilidade, desde variedades especializadas para a produção de sacarose, até variedades altamente eficazes na produção de biomassa por área de terra.


Há tempos, nosso negócio deixou de ser sucroalcooleiro e está cada vez mais sucroenergético. Sobretudo agora e no futuro de energia limpa. Para ilustrar o potencial de variabilidade, enquanto a soja e o milho têm sempre 20 pares de cromossomos e um humano tem sempre 46 pares, os híbridos de cana têm um número variável de 100 a 130 pares.


Para escolher e manejar variedades no patamar acima, é necessário aprimorar o conhecimento do comportamento local e a construção de perfil varietal para a fazenda. Para isso, temos que utilizar métodos e ferramentas adequadas.


A adubação para um novo patamar de manejo deve ser fundamentada no uso racional de resíduos e efluentes, associado ao conhecimento das respostas da cana.


É estratégico o conceito de que a usina, ao processar cana e vender apenas açúcar, álcool e eletricidade, exporta apenas os elementos C, H, O e elétrons.


Portanto todos os demais elementos podem ser reciclados para o campo, e ainda adicionados dos insumos industriais, caso do fósforo, cálcio, magnésio e enxofre, em substituição aos adubos minerais, e forte economia de recursos; hoje, com o uso da vinhaça aplicada na linha, com formulação e dosagens de precisão, assim como o uso de torta de filtro e suas compostagens “na ponta do lápis”.


Já temos modelos para esse uso racional. E isso já é muito conhecido e usado, embora, por razões diversas, há usinas que ainda não usufruem ao todo desse benefício.


Por outro lado, a regulamentação legal do uso de resíduos deveria ter uma elaboração mais interativa entre a pesquisa, as agências ambientais e as indústrias, no sentido de promover o uso, pelo desenvolvimento de soluções com bases científicas sólidas.


O controle fitossanitário já tem técnicas suficientemente desenvolvidas e seguras, praticamente para todas as doenças, pragas e espécies de mato. Tal que, para alcançar o patamar de cima, muitas vezes falta implementar uma gestão fitossanitária, com protocolos adequados e equipe preparada, com pessoas preparadas e longevas em suas funções.


No planejamento e condução das operações no dia a dia, é onde temos hoje ferramentas incríveis. A começar por ferramentas puramente conceituais, do modo de organizar e fazer as coisas, que já podem pôr o canavial em ordem, até ferramentas de AP, IoT, IA, etc., e ter produção em cada palmo de terra ocupada.


Houve um tempo  em que eu tinha um inconformismo estranho. Conhecia aquele canavial como a palma da mão e via muitos problemas com falhas, mato, pragas, canas fracas, coisas assim, que vínhamos resolvendo. Mas a produtividade média já era acima de 90 t/ha.


Então... poderia ser muito maior. Daí, com os recursos que temos para saber o que tem e o que fazermos em cada talhão, não consigo escapar de calcular um novo patamar com 13 colmos/m x 2,5 m de altura x 540 g/m de colmo x 6.666 metros/ha x 90% de eficiência = 105 t/ha.