Assistimos, ao longo desses últimos anos, a um verdadeiro descaso por parte do Governo Federal no tocante à elaboração de planos nas mais diversas áreas que estão sob a responsabilidade do poder executivo. Um governo preocupado exclusivamente com a forma de perenização no poder, onde a ideologia passou a ter papel importantíssimo na tomada de decisão.
Considerando esses aspectos, passa a utilizar as grandes estatais como fonte de recursos para campanhas eleitorais que se tornam grandes fontes de corrupção, levando-nos a aonde estamos, numa das maiores crises que o Brasil já vivenciou. Recursos que saem de investimentos e serviços e vão para o bolso de pessoas inescrupulosas. Foi muito tempo. A retomada, obviamente, passa por uma completa reestruturação geral, dando foco nas questões estratégicas, e, certamente, estão nesse contexto as questões relacionadas a energia e a combustível.
O setor sucroenergético que produz energia e combustível é estratégico e tem que ser visto pelo governo como tal. Somente a partir da decisão de considerá-lo como estratégico é que o governo poderá criar mecanismos de sustentação da produção, sem incorrer em grandes riscos, preservando essa atividade importantíssima à economia do País. Assim foi que nasceu o Proálcool, com a montagem de um plano estratégico de substituição de combustível e que promoveu grande desenvolvimento.
Não é possível, num país que tem carências de recursos financeiros, convivermos com tantos altos e baixos em que recursos preciosíssimos de nossa economia sejam desperdiçados. Mais recentemente, o plano de produção de etanol nos EUA é um exemplo claro de que, com planejamento, é possível criar um programa de muito sucesso, mesmo que muito menos competitivo, se comparado às condições brasileiras.
Triplicaram a produção de etanol, criaram programas para o seu consumo, resolveram o problema dos estoques de milho e deram um passo importante na diminuição de emissões, gerando inúmeros empregos. O fato é que o setor tem que ser encarado como estratégico para o País e para o governo, assumir essa postura.
Um setor que emprega diretamente por volta de um milhão de pessoas e, indiretamente, uma outra quantidade enorme, gera suas riquezas no interior do País, promove o bem-estar, ajuda na diminuição de emissões de poluentes, exporta boa parte de sua produção, gerando divisas para o País; poupa divisas, diminuindo a importação de combustíveis, gerando impostos e tantos outros benefícios, não tem como não ser encarado como estratégico.
A partir dessa tomada de decisão, certamente as ações promovidas em prol do setor passem a ser mais facilmente entendidas por todo o governo e pela sociedade como um todo. Dentre os principais produtos produzidos nessa cadeia produtiva, temos o açúcar, que tem vida própria, trata-se de uma commodity mundial para a qual os preços tem sua dinâmica, e não há nenhum instrumento necessário de ações por parte do Governo Federal para protegê-lo, a não ser que, pelo fato de a mesma matéria-prima produzir açúcar e etanol, qualquer distorção no mercado do etanol pode promover grandes interferências no mercado de açúcar, dado ao tamanho da representatividade do Brasil no mercado mundial dessa mercadoria.
Diferentemente do açúcar, etanol e energia estão vinculados a outros mercados e que, para o sistema produtivo não sofrer grandes percalços é preciso algum tipo de regramento, fazendo com que tenhamos pouca variabilidade nas ofertas deste produto. Se permanecer como foi durante o desastroso período vivido sob a administração do PT, o risco continuará altíssimo.
Para o etanol, dois mecanismos já existem e deveriam funcionar naturalmente e muito bem, não fosse a interferência negativa que sofreu nesses últimos períodos. Um deles, a mistura obrigatória de etanol na gasolina, com enormes vantagens ambientais e que vem, ao longo de anos, sendo utilizado com uma banda (20% a 27,5%) já prevista para sua utilização e estratégia definida pela oferta da quantidade de etanol produzido. Nesse último período, foi baixado o limite uma única vez por interferência de uma pessoa – a grande responsável por nos trazer onde estamos e de maneira equivocada.
A outra é a CIDE – Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, cuja função principal é a de impedir que grandes oscilações no mercado do petróleo interfiram na cadeia produtiva promovendo grandes desajustes na produção e trazendo grandes malefícios à toda cadeia produtiva.
Preços baixíssimos de etanol significam quebradeira adiante e encolhimento no fornecimento futuro. Em linguagem simples, com a Petrobras sendo administrada de maneira a seguir os fundamentos do mercado e acompanhando os preços internacionais do petróleo restaria ao Governo Federal administrar a alíquota da CIDE a incidir sobre a gasolina, que quando com preços baixos no mercado eleva-se a alíquota e com preços altos da gasolina diminui-se este valor, podendo ser inclusive zerado.
O mais interessante é que já está determinado em lei, e os recursos arrecadados vão para a federação, estados e municípios para serem aplicados na melhoria da infraestrutura viária, projetos ambientais e outros. Quem o criou foi de uma sensibilidade gigantesca. Isso permite que a cadeia de produção do etanol que trabalha sujeito às variabilidades do custo de produção mantenha certo equilíbrio em momentos principalmente dos preços da gasolina baixo.
Volto a frisar que se trata de questão estratégica para o País e que o etanol já chegou a representar cinquenta por cento do consumo de combustíveis do ciclo Otto. É tão estratégica essa questão que, a partir da utilização desse mecanismo, conseguimos, de certa forma, administrar a oferta de açúcar para que também esse mercado traga mais competividade e benefícios aos produtores brasileiros, gerando divisas e irrigando recursos por todas as cidades brasileiras que estão nesse contexto.
Já com relação à produção de bioeletricidade pelo setor sucroenergético, esta já não tem concorrência direta com o etanol e açúcar – que se utilizam da sacarose para sua fabricação. Ela utiliza-se do bagaço e tem tecnologia implantada de longa data e se dispõe ainda de um possível aumento com o recolhimento da palha da cana, que permite volumes maiores de entrada para geração de energia.
Só para lembrar: a safra de cana-de-açúcar na região Centro-Sul (90% do País) ocorre em período de escassez de chuvas e no momento mais crítico de administração dos recursos hídricos para geração de energia elétrica.
Não pode mais acontecer o que assistimos num passado recente, onde se forçou a produção de energia elétrica a partir de hidrelétricas, causando a baixa do nível dos reservatórios, com enormes consequências negativas ao fornecimento de água, ao sistema de navegação fluvial e ao turismo em vários municípios.
Para que um programa de fornecimento de energia de biomassa seja consistente é preciso da mesma forma se debruçar nos estudos e promover um planejamento satisfatório. Utilizar-se dessa fonte de energia para as condições brasileiras é no mínimo obrigatório, necessita investimentos, tem custos e estes precisam ser remunerados para perenidade do negócio.
O Brasil possui, no âmbito do Governo Federal e iniciativa privada, técnicos extremamente capacitados para elaboração de um plano que contemple todas essas necessidades e características, sem ideologia e impedimento que esses investimentos tragam retorno a quem o realizar e benefícios a toda população.
Como podemos notar, não se trata de grandes mudanças ou inovações para que isso aconteça. Identificado pelo governo de que realmente se trata de assunto estratégico para o país, é só trabalhar.