Me chame no WhatsApp Agora!

Carlos Eduardo de Siqueira Cavalcanti

Chefe do Departamento de Biocombustíveis do BNDES

Op-AA-31

Quais são os entraves ?

O descompasso entre a demanda potencial e a oferta efetiva de etanol vem sendo a regra no mercado brasileiro desde a safra 2010/11. Como resultado, o consumidor tem observado o aumento dos preços do etanol combustível, o que contribuiu para a deterioração de sua competitividade quando comparado à gasolina.

Esse descompasso começou a se refletir também nos resultados da balança comercial brasileira. Enquanto as exportações decaem desde 2008/2009, as importações passaram a crescer sobremaneira nas duas últimas safras. Além disso, em razão dos aumentos recentes do preço do etanol, muitos consumidores passaram a optar pelo uso da gasolina, cujo preço é relativamente estável.

Em 2011, a demanda pelo combustível fóssil superou a capacidade nacional de refino, o que levou o Brasil a também importar gasolina.Especialistas do setor compartilham a visão de que esse cenário irá se manter nas próximas duas safras. Essa visão também está presente em estudo a ser publicado proximamente, no periódico BNDES Setorial nº 35.

Com base em informações prestadas pelos clientes da carteira do setor sucroenergético do BNDES, o artigo estima a oferta de etanol para o período 2012-2015 e a contrapõe com a demanda potencial pelo produto estimada pela Empresa de Pesquisa Energética - EPE.

O resultado desse cotejo é um déficit crescente entre oferta efetiva e demanda potencial por etanol. No curto prazo, é razoável admitir que a oferta seja suficiente
para atender à demanda, gerando, no máximo, pequenos ajustes de preços a partir de 2013. No entanto, o déficit de etanol tende a crescer, podendo atingir 12 bilhões de litros em 2015. No quadriênio 2012-2015, o déficit acumulado deve superar 30 bilhões de litros.

Nesse mesmo estudo, ainda são discutidos alguns fatores que vêm limitando o crescimento da produção nacional do etanol combustível, entre os quais se destacam:

a. redução da capacidade de investimentos do setor: para viabilizar o forte crescimento visto no período anterior à crise financeira, os grupos econômicos do setor se endividaram sobremaneira.

O crescente nível de alavancagem dessas empresas, associado ao período necessário para a maturação dos investimentos (e para a geração de caixa), tornou-se progressivamente elemento impeditivo para que se contraíssem novos débitos.

b. consolidação: a fragilidade financeira das empresas também intensificou o processo de fusões e aquisições no setor. A crise reduziu o preço dos ativos existentes e, nesse cenário, os grandes grupos econômicos começaram a comprar e/ou fundir-se com empresas já estabelecidas em vez de construir capacidade produtiva nova.

c. rentabilidade limitada do etanol hidratado: a rentabilidade do etanol hidratado só ocorre em uma faixa muito limitada, o que vem reduzindo o estímulo ao investimento em novas unidades. De um lado, as usinas são pressionadas por custos crescentes de produção, que estabelecem um “piso” para o preço do produto na usina.

Do outro lado, dadas as margens dos distribuidores e dos postos revendedores, o preço administrado da gasolina é relativamente estável ao consumidor final, situação que estabelece um “teto” para o preço do etanol no posto revendedor e, portanto, também na usina; e

d. aumento da ociosidade industrial: a produção de etanol sofreu um revés adicional com o aumento internacional dos preços do açúcar. Como as usinas são capazes de produzir tanto o biocombustível quanto o adoçante, as empresas privilegiaram a produção do açúcar em detrimento da produção do etanol.

Adicionalmente, outro fator que aumenta a ociosidade das unidades é a falta de investimentos agrícolas. Como argumentado, a crise financeira contribuiu decisivamente para que fossem adiados os investimentos em renovação e tratos culturais dos canaviais, que também sofreram com fatores climáticos adversos.

No sentido de reverter o tímido retrospecto de investimentos agrícolas recentes, o BNDES lançou no início deste ano a linha PRORENOVA, destinada a apoiar tanto a renovação como a implantação de novos canaviais, com recursos de até R$ 4 bilhões. Os primeiros sinais de demanda pela nova linha são bastante animadores.

Apesar de problemático, o cenário apresentado também deve ser interpretado como uma excelente janela de oportunidade para investimentos que, além de contribuírem para o fornecimento energético ao Brasil, também seriam decisivos para dinamizar setores importantes, como o de fornecimento de bens de capital industriais e agrícolas.

Portanto, de forma a garantir que, de um lado, o etanol continue representando parcela importante da matriz nacional de combustíveis e, de outro, que o Brasil cumpra um papel relevante no comércio internacional do biocombustível, é necessária a criação de mecanismos permanentes, não somente de natureza financeira, que acelerem o crescimento do setor sucroenergético de forma a permitir um padrão de expansão ainda mais intenso do que o verificado anteriormente.