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Paulo Antonio Skaf

Presidente da Fiesp

Op-AA-43

Momento de decisão

O ano de 2014 foi bastante negativo para a indústria, mas particularmente ruim para o setor sucroalcooleiro, que teve cerca de 60 usinas fechadas na região Centro-Sul, desde a safra 2007/2008, de acordo com estudos do Deagro – Departamento de Agronegócio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo – Fiesp. A moagem de cana-de-açúcar no País quebrou um ciclo de dez anos de crescimento, iniciado em 2000/2001, depois de alcançar 620 milhões de toneladas na safra 2010/2011.

O endividamento, o clima, que afetou bruscamente as safras de 2011 e 2014, a redução da área de cultivo, o aumento do custo de produção,  a dificuldade de manter um nível necessário de tratos culturais dos canaviais, a adaptação à ampliação de mecanização da colheita e, posteriormente, o plantio, somando-se à política de preços da gasolina do Governo Federal e à perda da competitividade, foram alguns dos fatores que levaram o setor sucroalcooleiro a um cenário marcado pela maior crise no setor nos últimos trinta anos, por recuperações judiciais, por paralisações e por demissões crescentes.

Milhares de trabalhadores perderam seus empregos. Outros milhares estão na iminência de ver sua função ser extinta, uma vez que não há perspectiva, a curto prazo, de melhora no setor, o que já está afetando indústrias que fornecem máquinas e equipamentos para as usinas e o emprego de seus trabalhadores. Com esse cenário nada promissor, a produtividade da cultura despencou: a produção de cana-de-açúcar por hectare caiu de 75,9 toneladas na safra de 2007/2008 para 68 toneladas em 2014/2015, ao mesmo tempo que a qualidade da matéria-prima, medida em quantidade de ATR (açúcar total recuperável) por tonelada de cana, passou de 144 toneladas em 2007/2008 para 133 em 2013/2014.

Em 2014, o setor sucroalcooleiro atingiu o auge de uma crise anunciada. Contribuíram para isso as adversidades climáticas e de mercado e a política de manutenção dos preços dos combustíveis artificialmente baixos, adotada pelo Governo Federal. Ou seja, a gasolina comercializada ao consumidor foi feita a um valor inferior ao valor pago para a sua própria importação.

Com isso, o etanol hidratado, que tem como limite de preço na bomba um percentual em torno de 70% em relação à gasolina, não pôde passar pelos necessários reajustes de preços, diante dos seguidos aumentos dos custos de produção. Para se ter uma ideia, em 2013, o preço médio do etanol hidratado nas usinas de São Paulo, sem impostos, foi de R$ 1,18. Se o preço da gasolina praticado pela Petrobras no mercado interno fosse equivalente ao preço internacional, e considerando a mesma paridade de preço do etanol em relação à gasolina observada em 2013, o preço do etanol hidratado na usina deveria ser R$ 1,34 por litro.

Nesse caso, haveria também um reajuste proporcional no preço do etanol anidro. Essas diferenças de preço representariam um aumento de cerca de R$ 4,5 bilhões somente nas receitas do setor com etanol. Isso sem contar que o etanol, voltando a ser atrativo, traria ganhos potenciais também para o açúcar, pois haveria um redirecionamento do mix de produção médio do setor mais voltado ao combustível, por causa da maior demanda pelos consumidores e pela melhora das margens.

Por essa lógica e por ser o maior exportador mundial de açúcar, ao reduzir a oferta do produto, o Brasil contribuiria de forma importante para acelerar a recomposição dos preços desse produto no mercado internacional. Essas receitas adicionais seriam muito importantes para um setor que chegou, em 2013, a um endividamento total de R$ 66 bilhões, equivalente a, praticamente, todo o valor da receita anual das usinas.

Com esse cenário, o processo de reestruturação do setor significará uma nova fase de fusões e aquisições no Brasil. A retomada de investimentos só se dará após o equilíbrio entre o endividamento das empresas e sua capacidade de geração de renda. No médio prazo, o setor não terá condições de crescer significativamente, mas o início de um novo ciclo deve se dar em 2015, ano em que a produção global de açúcar será deficitária em relação ao consumo, delineando novos patamares de preços.

A velocidade dessa retomada dependerá, em boa parte, de mudança na política de regulação dos preços dos combustíveis, o que definirá, de certa forma, o futuro do etanol hidratado no País. Uma política de equalização dos preços dos combustíveis ao mercado externo promoveria um cenário de retomada do setor.Já a continuidade do artificialismo dos preços internos da gasolina pode comprometer, de forma grave, as empresas, reduzindo gradativamente a oferta de etanol hidratado, que será convertido em aumento da oferta de etanol anidro e um excedente de açúcar, condição que impedirá uma recuperação dos preços.

O cenário atual é preocupante para usineiros, empregados, fornecedores e prestadores de serviço. Em uma época em que as contratações estariam a pleno vapor, o que vemos é demissão em massa e cidades inteiras que dependem basicamente do cultivo e da moagem da cana de braços cruzados. A indústria tem feito a sua parte. Por meio do Senai-SP, criou, em 2014, escolas móveis para atender ao setor e capacitar os operários em manutenção e operação de máquinas de última geração.

Com o protocolo ambiental que visa eliminar a queima de cana, é essencial dar oportunidade para que esses profissionais adquiram know-how e façam a transição do cultivo manual para o cultivo mecânico. O setor investiu em máquinas, em tecnologia de colheitadeira, em informação, em capacitação. Mas o cenário nada animador fez com que houvesse fechamento de usinas, demissões em massa, corte de vagas no mercado de trabalho, além da falta de perspectiva e de estímulo para qualquer tipo de investimento.

As medidas a serem tomadas pelo governo em relação ao setor serão determinantes para que os rumos desse segmento sejam alterados de maneira positiva nos próximos anos. Precisam ser rápidas e assertivas, para que possamos readquirir fôlego, competitividade e, mais do que isso, contribuir para o desenvolvimento econômico do Brasil.