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Valmir Barbosa

Consultor da V. Barbosa Engenharia

Op-AA-36

Planejar sim, improvisar não!

Improvisar em uma atividade simples muitas vezes leva ao insucesso. Imagine em uma atividade complexa como uma agroindústria de cana. A preparação para o crescimento, incluindo a redução da rotatividade de pessoas e a valorização do conhecimento e do aprendizado, está na raiz dos aumentos de produtividade e produção. O crescimento e a evolução não têm acontecido quando há ruptura, mas sim quando há continuidade e aprendizado. Isso se complementa com treinamento e consolidação de equipes.

Agrícola e indústria é um só processo. Estão separados apenas porque a fase agrícola tem de ser ao sol e chuva, e a fase indústria tem de ser à sombra e seco, no barracão. Essa integração tem dois momentos mais críticos, no planejamento e na colheita. No  planejamento, a projeção de demanda e datas deve respeitar o que é realizável em cada um dos processos. Metas desafiadoras devem ser lançadas no ensaio, metas viáveis devem ser comprometidas na produção.

Sendo ainda nosso foco a produção de açúcar e álcool a partir de ART, nossa produção pode ser expressa por uma equação como Produção = (AT/(L+1) + Aa - Av) x TCH x ART, que relaciona área total cultivada, longevidade do canavial, área de cana de ano, área de viveiro, produtividade em t/ha e teor de ART. A área total cultivada (AT) é muitas vezes o fator mais restritivo. Isso resulta na forte competição por área nas regiões de indústrias de cana. Essa competição ocorre porque a cultura da cana-de-açúcar processa quantidades de produção muito grandes.

Por exemplo, a cultura da soja colhe cerca de 5 t/ha de grão seco e vale cerca de R$1.100,00/t. Por outro lado, a cana-de-açúcar colhe 90 t/ha de material vivo e vale R$60,00/t. Por essa característica, de grandes volumes e perecível, a logística é fundamental para o negócio da cana. Por isso, para ser competitiva, exige que as áreas de produção agrícola sejam próximas da indústria, daí a elevada concentração ao redor da fábrica e a sensação do “mar de cana”. Essa característica, por ser da natureza do negócio, já acontecia no Recôncavo Baiano no século XVI e continua ainda hoje.

A concentração da cultura ao redor da indústria é um fator positivo para a sustentabilidade do negócio, pois reduz o impacto dos transportes e viabiliza a reutilização e a reciclagem dos resíduos de volta ao campo. Sobre a longevidade da soqueira, podemos considerar que ela é o principal patrimônio biológico da empresa e depende dela cerca de 80% da produção. A longevidade é resultado do plantio e do trabalho de manutenção da soqueira. A qualidade do plantio não pode ser negligenciada como tem acontecido nos últimos anos, em nome do cumprimento de metas semanais, momentâneas e muitas vezes equivocadas.

 A manutenção da soqueira depende de tecnologias e da educação de pessoas. Mais do que treinar e estabelecer procedimentos, é preciso desenvolver nos funcionários hábitos dirigidos para o respeito e a preservação da soqueira. É preciso investir no desenvolvimento e na aquisição de tecnologias para o tráfego sem pisoteio. Em um experimento realizado na Usina Santa Elisa, em 1996-98, foi avaliado o efeito do pisoteio, que indicou perdas de até 30% da produtividade no corte seguinte. Isso pode ser observado em qualquer canavial onde houve pequenos trechos com pisoteio.

Para possibilitar o tráfego sem pisoteio, o desenho das linhas de plantio tem que ser adequado. Atualmente, ainda em muitos casos, o tráfego tem sido fortemente prejudicado pela intensa presença de curvas de nível embutidas. O controle de erosão pode ser mais eficaz por uso de outras práticas. A facilidade de tráfego quando as linhas de cana têm um desenho lógico proporciona grandes reduções de custos pelo aumento de rendimento das operações e ganhos de produtividade da cana pela sua realização  na “hora certa” e pelo menor pisoteio.

Os tratos de soqueira, relativos à nutrição e à proteção fitossanitária, são operações com menor trabalho mecânico e maior trabalho “biológico”, por isso são mais discretos e sujeitos a desatenção. É necessário planejamento e acompanhamento atencioso, caso contrário, os tratamentos fora da hora serão ineficazes e resultarão em perda de produtividade.

Esse mau resultado será percebido com o custo alto, ou quando não haverá mais tempo ou na colheita de menor produtividade. Sobre a área de plantio cana-de-ano, seja de outono-inverno ou de primavera, pode-se considerar o canavial como um painel solar. Cada semana sem cana para fixar a energia incidente representa desperdício de energia solar. Quando realizado o plantio de cana-de-ano, a área de reforma produz cana no mesmo ano, com produtividade por área colhida menor, mas com maior produção totalw e menor tempo de pay-back do plantio.

Sobre a área de viveiro, é preciso reduzir o consumo de mudas e, assim, fazer sobrar mais cana para a indústria. A redução do consumo de mudas pode ser por melhoria da qualidade das mudas, por melhoria dos equipamentos, da operação e do desenvolvimento de outras tecnologias. Essas melhorias podem ser por ações simples, como usar uma chapa lisa na entrada da colhedora e uma correta profundidade de cobrição da muda no sulco.

Boa contribuição tem sido pelo uso de fungicidas, hoje bastante eficazes. Outras técnicas antigas, como gemas isoladas e mudas pré-brotadas, que podem ser melhoradas pela mecanização e tratamento químico, são muito interessantes e devem receber investimentos para serem viabilizadas. A produtividade, além da relação direta com a produção, é um dos mais importantes fatores para a redução do custo unitário. Grandes ganhos de produtividade de cana podem ser obtidos apenas pela melhor qualidade e timing das operações de rotina, sem aumento de custos.

Outros aumentos de produtividade requerem investimentos, que devem ser justificados pela relação custo-benefício. O teor de ART da cana depende de 5 componentes: genética, ciclo anual, controle fitossanitário, uso de maturadores e limpeza na colhedora. Produzir melhor, tratando-se de commodities, é assegurar o fornecimento conforme expectativa do mercado. Isso implica, no curto prazo, executar os processos normais de produção com planejamento, disciplina e rigor técnico. Com atenção para ajustá-los às variações do ambiente climático, financeiro, etc. E, no longo prazo, implica adotar tecnologias sustentáveis, com uso racional de recursos e adequada qualidade de vida de pessoas e famílias envolvidas.

Os custos devem ser analisados como custo unitário, seja de uma operação ou do produto final. E sua otimização pode ser pela redução de custos totais ou por aumentos de produtividade. No contexto atual, dois componentes complexos dos custos devem receber atenção: as produtividades de cana e uma mudança na postura de planejamento, valorizando a busca por soluções racionais ao invés de corte de custos.

Mudanças de relações trabalhistas e novos serviços exigidos do setor, especialmente nas áreas financeiras, trabalhistas e ambientais, resultaram em aumentos de custos que, na verdade, devem ser entendidos como aumento de valor. Por fim, produzir mais, melhor e com menores custos pode ser realizado quando a empresa tem um forte equilíbrio entre o planejamento e a operação.