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Pedro Barros Barreto Fernandes

Diretor de Agronegócio do Itaú BBA

Op-AA-55

Expansão relevante ainda levará tempo

Coautor: Guilherme Bellotti de Melo, Analista Sr Clientes Rurais do Itaú BBA

O setor sucroenergético demonstrou, ao longo de 2017, um grau de articulação e alinhamento correspondente à importância que tem para a balança comercial brasileira, para a agricultura dos estados produtores e para a matriz energética. A criação do RenovaBio ataca uma das maiores incertezas da indústria e um forte inibidor de sua expansão: o papel do etanol na matriz de combustíveis líquidos nacional. Nesse sentido, acreditamos que uma eficiente implementação do RenovaBio poderia surgir como um dos direcionadores de demanda e, consequentemente, estimular a volta de investimentos mais substantivos. 


Entretanto temos preocupação que ventos contrários, no curto prazo, possam afetar a capacidade operacional, financeira e o tempo dedicado pelos grupos do setor à construção do RenovaBio. Utilizando uma imagem infelizmente comum ao setor, a limitação de recursos (tempo, esforços) nos leva a priorizar o trato (curto prazo, dia a dia) em detrimento do plantio (do futuro do setor). A criação do RenovaBio possui como principal pilar as metas de redução de emissões de carbono para o mercado de combustíveis, o que deverá trazer luz ao tamanho do mercado futuro de etanol. Para que isso se manifeste em investimentos, alguns obstáculos ainda precisam ser superados.

O primeiro diz respeito à própria implementação do programa e à(s) mensuração/estimativas de seus benefícios econômicos. Isso porque ainda levará algum tempo para que os players do setor observem os resultados do programa, dado que a meta de descarbonização deverá ser definida até junho (seis meses após a sanção da lei), e, a partir de então, ainda haverá 1,5 ano para que a implementação ocorra. Assim, espera-se que os primeiros impactos nos resultados sejam sentidos nas usinas apenas na safra 2020/2021.
 
Outro fator que afeta as decisões de investimento é o cenário adverso que tem se descortinado para as cotações do açúcar. Após a elevação de preços observada entre o fim de 2015 e 2016, a cotação da commodity passou a apresentar trajetória de queda, atingindo níveis abaixo de USD 14,00/lp, abaixo do custo caixa dos produtores menos eficientes.

A expectativa refletida nos preços dos contratos futuros de Nova Iorque, atualmente, tampouco oferece muito alento às usinas, reflexo de um superávit global no ano safra corrente (2017/2018 – O ano safra global corresponde ao período de outubro a setembro), na esteira da recuperação da produção Europa, Índia e Tailândia e da expectativa de mais um ano de produção volumosa em tais países, na safra seguinte (2018/2019). 
 
Nosso tom de cautela para investimentos mais relevantes vem da observação de que uma parcela significativa do setor apresenta, no início dessa safra 2018/2019, uma condição financeira bastante limitada para investimento de reposição. Esse grupo de usinas é caracterizado por apresentar uma menor liquidez e rentabilidade, que se traduzem em uma baixa capacidade de realizar a renovação de canavial, reposição da depreciação dos ativos industriais, máquinas e equipamentos agrícolas. Estimativas do Itaú BBA indicam que esse grupo possui uma moagem total de 140 milhões de toneladas (aproximadamente 25% da moagem do Centro-Sul).
 
No outro extremo do setor, há um conjunto de grupos que goza de uma situação financeira bastante sólida – resultado de uma combinação da excelência operacional e do baixo nível de endividamento – e que está em plenas condições de voltar a investir (com cerca de 290 milhões de toneladas moídas na safra 2017/2018).

Mas, mesmo para esse seleto grupo, a tendência é que, em um primeiro momento – que pode ser longo –, os investimentos se concentrem, no máximo, em uma modesta expansão de canaviais e na modernização dos próprios ativos industriais, com foco no aumento marginal da capacidade de moagem e na melhoria de eficiência. As oportunidades de aumento da área de cana tendem a ser impulsionadas pela fraqueza financeira de outras usinas vizinhas, o que não levaria a um aumento na moagem do setor como um todo.

Entretanto nem esse cenário de desengargalamento e suave consolidação através da área agrícola parece certo. De acordo com nossas estimativas, metade dos grupos investiu bem abaixo da depreciação na safra 2016/2017, mesmo em um cenário de preço bastante mais remunerador que os atuais. Bem verdade que muitos desses grupos encontraram formas de serem mais eficientes com seus ativos (reorganização da colheita, redução de gastos com mudas, entre outros), porém a foto geral é de falta de um apetite expansionista. 
 
Assim, apesar de o programa RenovaBio endereçar um dos grandes entraves para o setor sucroenergético no Brasil – que é o papel do etanol na matriz de combustíveis líquidos –, a conjuntura de curto prazo pode afetar a capacidade financeira e de investimento da metade mais saudável do setor. Esses players podem também diminuir sua capacidade de alocação de tempo e de energia para a construção da implementação do RenovaBio, colocando em xeque o ritmo de crescimento que se pretende atingir com essa política.