O tema propõe duas vertentes no segmento mão de obra para o setor sucroenergético, mas podemos afirmar que em todas as outras atividades, como construção civil, indústria, serviços, comércio etc., o problema de falta de mão de obra qualificada também está muito presente e é relevante.
A importância da mão de obra pode ser medida na análise da formação dos custos de produção de uma tonelada de cana, onde ocupa o primeiro lugar entre todos os itens, chegando muitas vezes a representar 28% dos custos de produção. A proposta do título acima mostra uma distinção clara entre falta e formação de profissionais nos diversos níveis e atividades do setor sucroenergético.
A mão de obra na área agrícola representa o maior percentual na composição dos custos do setor e ocupa o mais alto lugar no podium, se considerarmos desde o preparo de solo até a entrega da cana na indústria. Mesmo assim notamos que, em algumas empresas, a importância dada a ela deixa a desejar, principalmente na formação e treinamento de pessoal.
Sem a qualificação exigida para o cargo, forçosamente haverá um aumento nos custos em todos os outros segmentos da área agrícola, mas principalmente nas atividades mecanizadas e de manutenção, que juntas representam aproximadamente 70% dos custos de produção.
Além da mecanização ter uma grande participação nos custos de produção, ela é responsável por toda aplicação de insumos, daí a importância dos operadores em conhecer não só a operação mas também as regulagens e a função dos insumos no solo, nas plantas e condições climáticas para aplicação.
Ao frequentarmos simpósios e congressos promovidos por entidades oficiais e particulares, onde se reúne grande parte das usinas, percebemos que há uma forte e notória reclamação sobre a qualidade e comprometimento da mão de obra em todos os níveis hierárquicos das empresas.
Sabemos que é raro ou quase impossível encontrar profissionais preparados e disponíveis neste mercado de trabalho para as atividades em questão. Paga-se mais para buscar em outra empresa ou treina-se e forma-se dentro da própria empresa. A própria legislação e normas existentes no Brasil impedem a abertura do leque na questão do aprendizado, com o chamado desvio de função.
Por exemplo, já tive vários processos trabalhistas feitos por operadores que alegaram que seguravam uma mangueira de óleo lubrificante para o mecânico poder trocar, exigindo com este ato a insalubridade e desvio de função. Um motorista não pode auxiliar um borracheiro na troca de pneus de seu caminhão. Exemplos simples como estes não permitem que se desperte no colaborador um melhor aprendizado e qualificação.
A formação, o treinamento e a atualização técnica da mão de obra em todas as atividades ligadas ao setor agrícola canavieiro se fazem necessários para atender melhor às velhas e novas tecnologias, equipamentos mais sofisticados, manutenção mais refinada, que todos os dias estão batendo em nossa porta.
Muitas usinas enxergam a formação e a atualização de conhecimentos dos profissionais como uma rotina nas suas atividades, ou seja, faz parte da linha de trabalho nas diferentes áreas. Outras nem tanto, se preocupando mais com as despesas que isto representa.
A perfeita conexão entre a supervisão das operações e a área de Recursos Humanos para viabilizar as reais necessidades é decisiva para o sucesso do treinamento. Lembramos que a hora trabalhada de uma máquina com potência na faixa de 250 a 300 hp custa acima de R$ 300,00 dependendo da operação, já a de uma colhedora custa próximo ou mais de R$ 600,00/hora.
Outra questão importante nas usinas é que toda equipe deve ser treinada nos aspectos técnicos, e não só operadores, mas também líderes, encarregados e até engenheiros devem participar ativamente. Podemos até afirmar que pessoas para trabalhar existem, temos, segundo a mídia, mais de 52 milhões de pessoas atreladas ao Bolsa Família e que muitas não querem trabalhar, nem mesmo querem registro em carteira para não perder o “benefício”. Faço trabalho em alguns estados, e, por exemplo, no Maranhão, assim como em outras regiões do Norte e Nordeste, segundo estatísticas, existem mais pessoas penduradas no Bolsa Família que com carteiras de trabalho assinadas.
No Nordeste, nesta última safra, houve usinas que pararam ou reduziram a moagem por falta de mão de obra no corte de cana. Se ampliarmos o ângulo de visão a nível nacional, vemos que o problema de qualificação é mais sério e abrangente. Muitas universidades têm a formação profissional massificada. No nosso setor, por exemplo, temos no Brasil 287 faculdades de agronomia com 37.822 vagas presenciais e 50.700 vagas em cursos de Ensino a Distância (EaD), segundo o MEC (2018).
Ainda segundo o CREA, só no ano 2020 formaram-se 108.842 agrônomos, sendo 88.594 homens e 20.248 mulheres. São números assustadores para o mercado. Quando havia somente cursos de agronomia com tempo integral, a carga horária era de 3.600 horas para conclusão do curso. Atualmente, nos cursos noturnos passou para 1.530 horas com apenas 3h40 por dia, isto sem falar nos EaD com aulas pela Internet. Números como estes existem em todas as profissões e podem determinar que as empresas devem dar encaminhamento à fase final na formação dos profissionais.
Não podemos afirmar que quem faz um curso com um menor número de horas não está preparado para atuar. Tudo vai depender do comprometimento com o apreendizado, com a sua assiduidade e a vontade. Todas as formas de aquisição de conhecimento são importantes. Atualmente, as informações chegam de forma muito rápida e em volume muito grande, via Google e outras plataformas, a ponto de não deixar perguntas sem respostas. Sabemos que esta é apenas uma forma de adquirir conhecimento e que deve ser associada a outras mais consistentes.
Contamos hoje com internet, novas técnicas como agricultura de precisão, satélites, drones, mapeamentos diversos, “inteligência” artificial, mas isto não nos dá o direito de marginalizar a agricultura de “andação”, aquela de ir para a lavoura rotineiramente, muito necessária para o entendimento e é onde as possíveis soluções acontecem.
É lá no campo que os problemas e soluções, na maioria das vezes, são elucidados, é onde interpretamos as situações e, muitas vezes, encontramos os melhores caminhos. Tela de computador e “inteligência artificial” são ferramentas ultra necessárias, mas é fundamental o caminhar no campo entre as máquinas, operações e lavoura. Sair da zona de conforto é um desafio necessário em todas as profissões e atividades.
Na minha opinião, devemos enxergar o caso de minimizar efeitos da mão de obra e baixar custos implantando o máximo de mecanização e aumentando a potência das máquinas em todas as operações possíveis. O aumento na potência reduz quebras e problemas mecânico-operacionais, com isto teremos um maior rendimento por hora/hectare e menor número de equipamentos trabalhando.
É fundamental ter um plano de renovação de frota, substituindo sempre com horas e km adequadamente controlados antes que os problemas e gastos maiores aconteçam, como por exemplo o “trem de força”. Com isto teremos ampliação no período de garantias na frota e, também, conseguiremos melhor valor nos ativos trocados. Isto diminuirá em muito o valor dos gastos com manutenção por toneladas produzidas. Finalmente, aprofundar e valorizar a atividade de treinamento, formação e atualização de conhecimentos dos profissionais.
Este é o caminho a ser seguido.