Presidente Executivo da Siamig - Minas Gerais
Op-AA-43
Os últimos anos foram muitos difíceis para o setor sucroenergético brasileiro. O segmento viveu uma crise originada por decisões que afetaram toda a cadeia produtiva, desde o produtor rural, passando pelo prestador de serviço, até o fornecedor de máquinas e equipamentos às agroindústrias canavieiras. Uma crise sem precedentes, que levou o setor a uma situação financeira de difícil solução.
As vozes do setor formaram um grande coro de protesto e, com muita coragem, deram corpo e voz aos anseios que vinham do interior, das diversas regiões produtoras de cana do Brasil. Nunca o setor foi tão debatido, clamando por uma política energética mais limpa e sem intervenções. A mídia brasileira deu um enorme espaço para as reivindicações setoriais, e boa parte da opinião pública entendeu as dificuldades.
Um exemplo disso foi o amplo espaço que os temas relacionados ao setor tiveram durante a campanha eleitoral de 2014. A eleição já passou, e os brasileiros escolheram seus representantes para os próximos quatro anos. Em vez de olhar para trás e ficar remoendo o que não foi feito, o setor tem o desafio de olhar para frente e encontrar, novamente, o caminho da prosperidade. A recuperação não virá no curto prazo, e também não será uma medida isolada que resolverá os grandes problemas setoriais.
A escolha de ministros mais ligados aos setores produtivos foi um importante indicativo da retomada do diálogo com o setor, apesar da mudança drástica da política econômica do Governo Federal em 2015. O passivo financeiro das empresas é muito alto e de difícil solução e necessitará de uma gestão profissional e criativa conjugada com um ambiente institucional estável, sem intervenção e com apoio ao setor. O apoio institucional do governo, representado pelos discursos de seus maiores líderes, é imprescindível para o crescimento de qualquer setor no Brasil.
É necessário falar bem do etanol, um produto brasileiro e extremamente importante à nossa matriz veicular, assim como do açúcar, item com grande participação nas exportações brasileiras, imprescindível na dieta da população e enraizado na nossa cultura. Isso sem falar da bioeletricidade, da energia elétrica da biomassa, com potencial incrível de auxiliar o País a sair da crise energética. O setor é muito grande, pulverizado e bastante heterogêneo, com características regionais/estaduais importantes.
É por esse motivo que os sindicatos estaduais são fortes, com uma necessidade muito grande de interlocução com órgãos e instituições estaduais e, em muitos casos, municipais. Quando essas forças se uniram e se mostraram a serviço da recuperação setorial, o Fórum Nacional Sucroenergético – nossa entidade nacional formada por 17 sindicatos e associações estaduais – foi fortalecido e, atualmente, tem presença importante em todas as discussões do setor no Brasil. A continuidade do fortalecimento do Fórum, hoje muito bem presidido por André Rocha, do Sifaeg de Goiás, é peça fundamental para a recuperação do setor.
Uma série de medidas precisa ser tomada para que a recuperação seja iniciada. Divido em quatro eixos prioritários. O primeiro deles é o eixo principal das ações e reflete a necessidade de planejamento, seja para o setor privado, seja para o setor público. É a discussão de qual o tamanho que o setor pode ter no futuro e quais medidas indutoras precisam ser adotadas para se chegar ao objetivo. Qual será o papel do setor privado, o que caberá ao setor público, que ambiente regulatório é necessário.
São pontos muito polêmicos, com diversas opiniões conflitantes dentro do setor privado e também do público. De qualquer forma, não é possível fugir mais desse debate, e ele precisa começar com muita rapidez. O segundo eixo refere-se à rentabilidade e à competitividade dos produtos do setor. Não será possível começar a solucionar o problema financeiro sem antes voltar a ser rentável, ou seja, gerar lucro em toda a cadeia sucroenergética. Para tal, o setor precisa vender seus produtos acima dos custos de produção, considerando os custos financeiros, o que não vinha fazendo há alguns anos.
E não é só com preços altos que se resolve essa ação, mas também é necessário reduzir os custos de produção. O Brasil viveu um processo de encarecimento generalizado nos últimos anos, que prejudicou muito a economia brasileira e afetou o setor sucroenergético, com sérios problemas relacionados à legislação trabalhista, ambiental e tributária. Além disso, o setor foi prejudicado por uma situação climática instável, que, juntamente com a dificuldade financeira e a rápida mecanização do plantio e da colheita, trouxeram impactos significativos na produtividade do canavial.
A cana representa 60% do custo final de produção; qualquer variação negativa de produtividade do canavial influencia significativamente os resultados. Esse segundo eixo não é tarefa fácil, mas algumas medidas anunciadas no final de 2014 e início de 2015 já trouxeram uma reversão importante das expectativas para o mercado de etanol hidratado, o grande problema do setor nos últimos anos. Para começar, Minas Gerais, terceiro maior produtor de etanol e segundo mercado de combustíveis no Brasil, adotará, a partir de março, uma alíquota de 14% para o hidratado e 29% para a gasolina.
Será a maior diferença entre as alíquotas de ICMS do etanol e gasolina do Brasil, 15 pontos percentuais, uma grande novidade em um mercado pouco usuário de etanol. Ao mesmo tempo, outros dois estados terão mudanças importantes, com um potencial de elevação do consumo de hidratado: no Paraná, a alíquota de ICMS da gasolina passou de 28% para 29%; já na Bahia, que tem alíquota para o etanol de 19%, está prevista uma elevação da alíquota da gasolina de 27% para 30%.
E não para por aí, outros estados estudam mais mudanças que poderão ser implantadas a partir de 2016. Esse trabalho para alteração das alíquotas de ICMS dos combustíveis, muito bem desenvolvido pelas entidades estaduais, é extremamente importante, porque, atualmente, é o único imposto incidente no produto renovável. Já o tão solicitado e esperado retorno da Cide foi anunciado, em uma composição com o aumento do PIS/Cofins, que elevou o preço da gasolina A em R$ 0,22, dando mais competitividade ao etanol hidratado.
Dessa forma, 2015 promete ser um ano diferente para o etanol, e a rentabilidade tende a retornar para esse mercado. Ainda no eixo da rentabilidade e da competitividade, o setor tem um grande produto, forte gerador de caixa, que tende a crescer muito nos próximos anos: a bioeletricidade. Depois de passar alguns anos esquecida pelo planejamento energético, a energia de biomassa voltou com grande força em 2014 com o uso de bagaço, mas também associando cavaco de madeira e, agora, a palha de cana.
O setor tem um grande potencial, tanto de expansão das usinas que já estão nas redes quanto com retrofits das empresas que ainda não vendem o insumo, mas têm a escala necessária para viabilizar o investimento. Para isso, o setor ainda necessita dos leilões exclusivos para fonte de biomassa e que suas características positivas sejam consideradas na formação do preço.
O terceiro eixo é o trabalho para ampliação e fortalecimento do mercado para os produtos. Recentemente, o governo anunciou o aumento da mistura do anidro na gasolina para 27%, uma grande conquista para o setor, com potencial de acréscimo de 1 bilhão de litros/ano. Também é preciso trabalhar fortemente junto ao governo e ao setor automobilístico para melhorar a eficiência dos carros flex no uso do etanol, além de negociar incentivos para que a nova geração de veículos, os híbridos, venha com motorização flex.
E também não se pode esquecer da valorização do mercado de açúcar interno e externo como resposta frente a uma onda mundial de redução da participação desse produto na dieta alimentar da população. Há muitos mitos nesse debate que necessitam ser esclarecidos, e o setor precisa estar atento. Por fim, o quarto eixo seria o da comunicação, do marketing, mais especificamente. Essa é uma batalha árdua e precisa de um alto investimento e de uma drástica mudança de cultura dentro do setor.
Além de enfrentar pesos pesados da economia, alguns dos maiores anunciantes do Brasil, o setor enfrenta um passivo de mais de 450 anos de história com informações infundadas e inverdades que não mais condizem com a situação atual da agroindústria canavieira brasileira. O frentista do posto, hoje, também virou um consultor de vendas que induz o consumidor a colocar determinado combustível. Em 2015, com a volta da competitividade do etanol, será necessário realizar um grande trabalho para divulgar o hidratado junto aos consumidores, já que muitos proprietários de veículos flex nunca abasteceram com etanol.
Com essas novidades, o setor começou 2015 com melhores expectativas, mas ainda convivendo com a crise financeira. Os próximos anos serão de severos ajustes, de recuperação do fôlego, momento de aproveitar as oportunidades do mercado. Devido ao tamanho do passivo financeiro, poderemos ter um momento com novas fusões e aquisições que poderão ajudar no ajuste. A continuidade das pesquisas para descoberta de variedades mais produtivas, a evolução do etanol 2G e a perspectiva de uma situação climática menos extremada nos próximos anos poderão também ajudar o setor a se colocar novamente nos trilhos do crescimento, continuando a trazer desenvolvimento econômico para o interior do nosso país.