Sendo o Brasil um país de dimensões continentais, grande população e com diversificadas regiões, culturas e produção agrícola, além de ter um grande intercâmbio com outros países (turismo e importações/exportações), é razoável imaginar que os fluxos de transporte de pessoas e de cargas tenham uma elevada demanda e razoável grau de complexidade para sua implantação. O que talvez não fique tão claro no cotidiano de uma pessoa leiga é como estão, atualmente, estabelecidos os modais de transporte e suas respectivas relevâncias no País, conforme figura 1.
Nota-se que, ainda nos tempos atuais, carregamos uma enorme dependência do transporte rodoviário de cargas, conforme a matriz de transporte brasileira. Essa condição foi construída no País ao longo de décadas, devido ao enfoque dado a esse modal de transporte em detrimento dos modais de larga escala, como o ferroviário, dutoviário e aquaviário. Essa questão é relevante aqui para o tema deste artigo, pois a nossa matriz de transporte, na forma estabelecida, se defrontará com a agenda que se impõe para os próximos anos.
O País precisa de crescimento econômico sustentável, tendo que buscar por maior produtividade e menor impacto ambiental para se posicionar competitivamente no mundo globalizado. Quando se comparam as emissões de CO2 por modal de transporte, verifica-se a expressiva contribuição que pode ser obtida através dos modais de larga escala em comparação com o modal rodoviário, com especial destaque para o transporte dutoviário. Modal esse especializado no transporte de cargas líquidas em larga escala (etanol, por exemplo), possuindo grandes vantagens comparativas e competitivas versus os outros modais para esse tipo de carga, conforme figura 2.
O transporte rodoviário tem como diferenciais competitivos uma elevada flexibilidade para transportar diferentes tipos de cargas e volumes, tendo ainda um baixo tempo de resposta para incremento de capacidade diante de um certo aumento na demanda (relativamente aos demais modais), além de um menor investimento inicial por parte do transportador para operar na atividade.
Já os grandes limitadores dessa operação seriam: baixos ganhos de escala; elevada geração de poluentes; alta ocupação de vias públicas e riscos de incidentes. Limitadores importantes para se viabilizar um crescimento sustentável dos fluxos de cargas.
Já os modais de larga escala, ainda que guardem suas particularidades entre si, podemos colocar, de uma forma geral, como sendo seus principais diferenciais competitivos diante do modal rodoviário: elevados ganhos de escala; menor geração de poluentes; evita ocupação das vias públicas e traz menor risco de incidentes; gera maior eficiência operacional em toda a cadeia.
Mas esses modais normalmente demandam a contratação de mais de um modal para se executar toda a rota (origem – destino final), denominada multimodalidade. Além disso, também necessitam de elevados investimentos iniciais, maior planejamento e cadência dos fluxos e, naturalmente, maior volume de carga. A sua viabilização requer uma visão de tempo mais longa para implantação, maturação e retorno do investimento.
Assim, em resumo, o que se tem é que o modal rodoviário é mais competitivo para cargas mais fracionadas/diversificadas e, normalmente, para menores distâncias. Já os modais de larga escala são mais indicados para cargas de elevado volume e baixa diversificação e com trajetos mais longos, tipicamente o que se pode verificar no mercado de commodities agrícolas.
Como o enfoque principal deste artigo é a logística de etanol, vamos dar uma avaliada na evolução dos volumes transportados nos modais de larga escala nos últimos anos, conforme figura 3.
Apesar de haver ainda muito o que evoluir diante do tamanho atual e potencial do mercado de etanol, nota-se que houve avanços no montante transportado por modais de larga escala, diante de alternativas logísticas que vêm sendo desenvolvidas e exploradas para o transporte desse biocombustível. Como exemplos:
• terminais de captação ferroviária foram implementados no início da última década no Centro-Oeste do País, possibilitando o transporte do etanol por ferrovia dessas regiões até o hub de combustíveis de Paulínia/SP;
• operadores marítimos disponibilizando mais embarcações para o transporte de etanol com origem nos portos do Sudeste e destino nos portos da região Norte-Nordeste do País;
• novos trechos de dutos e terminais de captação dutoviária implementados em meados da última década pela Logum Logística no interior de MG e de SP, possibilitando o transporte do etanol por dutos dessas regiões até Paulínia-SP,
regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro, além de acesso a uma saída portuária (Terminal de Ilha D’água-RJ), para exportação e/ou cabotagem para a região Norte-Nordeste.
Destacando que, nas últimas duas décadas, o setor sucroenergético passou por uma transformação formidável, com ganho de escala, aumento de tecnologia e eficiência na produção de etanol, açúcar e energia (além de outros subprodutos), visando desenvolver soluções sustentáveis para uma economia de baixo carbono.
A produção nacional de etanol saltou de 15,8 bilhões de litros em 2005 para 30 bilhões em 2020, ambicionando chegar a mais de 40 bilhões de litros em 2030, com o advento do RenovaBio. E esse crescimento todo vem demandando (e demandará) um “esforço” crescente no desenvolvimento de soluções logísticas para a movimentação mais eficiente e sustentável de toda a produção.
E o que parece que está ficando cada vez mais claro para os agentes públicos e privados no País é que o caminho do crescimento passará necessariamente por uma evolução (ou uma verdadeira “revolução”) na nossa matriz de transportes, tendo maior participação de modais de larga escala em detrimento do transporte rodoviário, ainda que esse modal seja de fundamental importância e que sempre deverá ter participação relevante.
Programas de governos vêm estimulando a produção e uso de biocombustíveis no Brasil (RenovaBio) e no Mundo (ex.: LCFS, gerenciado pelo CARB, na California/EUA), considerando, no cálculo dos seus incentivos econômicos, a redução da pegada de carbono na produção e também na logística para transporte desta.
Com maior enfoque de todos os envolvidos nesse processo de transição para o de uma economia de baixo carbono, podemos ter um grande salto de produtividade, sustentabilidade e competitividade na logística de etanol, afinal, não parece ser prudente estimular a produção de biocombustíveis sem soluções sustentáveis para o seu transporte, correto?!