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Cláudio José Zattar

Diretor Superintendente da ALE Combustíveis

Op-AA-08

Estoques reguladores são essenciais

A escalada de preços do petróleo no mercado internacional, com o barril sendo vendido por mais de US$ 70, e a busca por fontes de energia menos poluentes colocaram o álcool brasileiro em uma posição estratégica mundialmente. Países como Japão, Índia e China já sinalizam um consumo interno expressivo e até mesmo os Estados Unidos, apesar de suas fortes barreiras alfandegárias, também estão constatando que o álcool é melhor opção que a gasolina.

No Brasil, o advento do motor flexfuel, criado em 2003, época em que as montadoras amargavam prejuízos no país, deu um impulso, sem precedentes, para aumentar consideravelmente a importância do álcool na matriz energética. O sucesso é similar ao alcançado pelo programa Pro-álcool no fim dos anos 80, quando chegou a representar 50% do consumo de combustíveis de veículos automotivos de passeio.

No entanto, o aumento do consumo (até o final de 2006, a previsão é que haja 10 milhões de carros bicombustíveis circulando no Brasil), a ocorrência da entressafra e o crescimento das exportações de açúcar e álcool estão trazendo grandes preocupações para o país. Os preços registraram aumentos expressivos e há o temor da falta de produto.

Se isso ocorrer, o álcool cairá em descrédito, repetindo uma triste história vivida pelos consumidores brasileiros no início da década de 90: filas nos postos, importação de metanol e fim da credibilidade do programa, por questões de oferta do produto.

Naquela época, o governo cumpriu um papel fundamental, incentivando a utilização do álcool como combustível, criando subsídios no país inteiro e equalizando os preços, em função do tabelamento. A Petrobrás realizava investimentos importantes em armazenagem e logística, o que era ressarcido pelo governo, a partir da chamada conta-álcool. Tudo ia muito bem, mas o produto faltou...

Para não repetirmos os erros do passado, cabe ao governo monitorar o setor e atuar, não como interventor, mas sim de forma madura, para que o mercado consolide-se e continue mostrando-se interessante aos investidores. Nesse sentido, é essencial a definição e manutenção de estoques reguladores, com o objetivo de prevenir preços altos na entressafra e em épocas de crescimento da exportação.

Nesse momento, fazem-se necessárias a vontade política, conjugada com os interesses nacionais. É preciso que seja feito um investimento de governo nos estoques reguladores, pois isto é inviável para o setor privado da cadeia (apenas distribuidoras e postos revendedores), uma vez que trabalha com margens pequenas e não tem como manter estoques. Não há, inclusive, espaço físico para isso.

Atualmente, no Centro-Sul brasileiro, a demanda por álcool combustível é estimada em 13,2 bilhões de litros por ano e 1,8 bilhão de litros são destinados à exportação, enquanto a produção anual está em torno de 15,5 bilhões de litros. Dessa forma, para financiar os estoques reguladores, levando-se em conta o consumo atual no país, o governo deveria comprar antecipadamente e manter, entre 1,3 bilhão e 2 bilhões de litros de álcool, estocados nas usinas, o que seria suficiente para atender entre 30 e 45 dias de consumo.

O produtor, nesse caso, ficaria como fiel depositário dos estoques. Em termos financeiros, o governo precisaria investir anualmente cerca de R$ 1,5 bilhão no início da safra (maio, junho e julho), o que resultaria em um custo financeiro da ordem de R$ 150 milhões para os cofres públicos. No entanto, esse custo poderá ser compensado com processos adequados de venda do produto, em determinadas ocasiões.

Ao contrário do financiamento da safra - experiência que não deu certo na época do Pro-álcool, devido à inadimplência de alguns produtores - o financiamento de estoques reguladores seria uma medida até mesmo de incentivo para o aumento da produção. Na verdade, trata-se de um grande passo para a auto-regulamentação do mercado.

Nos últimos anos, o setor sucroalcooleiro no Brasil profissionalizou-se e, desde 2003, tem atraído novos investidores, inclusive muitos estrangeiros. Desde então, o Ministério da Agricultura passou a acompanhar de perto esse mercado e constatou que não era mais necessário oferecer subsídios como no passado, pois o setor havia realmente amadurecido.

Entretanto, o que o governo não pode deixar de fazer é monitorar a cadeia do álcool (produtor, distribuidor, operador logístico e posto revendedor) para que o programa sustente-se. É imprescindível que os governantes dêem a devida atenção a esse grande mercado estratégico para o país, que gera divisas e empregos. Felizmente, hoje, há um bom entendimento entre governo e produtores (usinas e destilarias), mas é preciso que esse comprometimento seja mantido. O resultado será o equilíbrio.

Resolvida a questão relacionada à equalização de preços nos períodos de safra e entressafra, resta outro ponto tão crucial quanto o primeiro, para o êxito do programa do álcool brasileiro: a fiscalização tributária.

Hoje, distribuidoras inidôneas, que sonegam PIS/Cofins, não se interessam por barganhar melhores preços e descontos nas usinas, acabando por inflacionar o produto e prejudicando o consumidor. As distribuidoras idôneas, para garantirem que terão produto disponível, acabam tendo que pagar mais caro aos usineiros. Não há como negar que a utilização de corante no álcool anidro (que é misturado à gasolina) já foi um grande passo do governo, para inibir o mercado ilegal de álcool no Brasil. Mas ainda há muito a ser feito, em relação à fiscalização tributária. E o governo tem as ferramentas necessárias para isto. Basta aplicá-las.