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José Geraldo Eugênio de França

Diretor-executivo da Embrapa

Op-AA-22

Os biocombustíveis e as bioletricidades como ferramentas de mitigação

O número de céticos diminui a cada dia. Torna-se uma verdade aceita que mudanças significativas no clima do planeta estão ocorrendo e que, desta vez, a ação do homem é um fator preponderante. A área florestal diminui em quase todos os continentes, as geleiras tornam-se escassas, e há quem diga que, em 2030, já não existirão. A água potável, há tempos, tornou-se um objeto de cobiça e, tal qual o petróleo, torna-se uma razão para desentendimentos e falta de cooperação entre as nações.

Durante algumas décadas, o petróleo continuará sendo a principal fonte da matriz energética do planeta, fator de riqueza e desenvolvimento e força capaz de alçar ou fazer retroceder os ciclos econômicos, sejam das nações que o possuem ou não. As últimas descobertas de novas bacias na Venezuela, Israel, Cuba e no Brasil também mostram que não se pode ser apocalíptico quanto à imediata exaustão dessa matéria-prima, muito embora os novos depósitos não confiram segurança para uma previsão de longo prazo quanto ao fornecimento, preço e sustentabilidade.

As opções estão postas à mesa. Alguns creem que a energia nuclear ou o desenvolvimento de baterias à base de hidrogênio serão as soluções “limpas” para o fornecimento de eletricidade às futuras gerações. No primeiro caso, sabe-se que, apesar dos avanços tecnológicos das últimas duas décadas, os fantasmas de Chernobil e Three Mile Island continuam presentes.

A segunda opção, além de depender de um grande refinamento tecnológico, não será facilmente disponível a todos os países para finalidades como a iluminação, o uso industrial ou familiar.
O Brasil, desde 1975, oficialmente, optou por valorizar um caminho alternativo: o da bioenergia e dos biocombustíveis, sem desprezar seu potencial de produção de hidroenergia ou de extração, beneficiamento e distribuição de produtos à base do petróleo.

Com essa decisão, duas questões cruciais foram atendidas: o aproveitamento sustentável de seu solo agricultável, seguindo-se do uso efetivo das tecnologias agrícolas desenvolvidas para a agricultura alimentar e industrial.

Essa ação estratégica é fundamental para o país como fonte de energia, implicando a democratização da renda e a interiorização do desenvolvimento nacional, iniciado com a conquista do cerrado. Conquista essa reconhecida pelo Dr. Norman Borlaug, Nobel da Paz em 1970 e recém-falecido, como a maior revolução agrícola ocorrida no planeta desde a Revolução Verde.

O controle sobre as emissões de gases de efeito estufa, a exemplo do CO2, e do metano, em especial, tornou-se parte estratégica da agenda mundial, e, em breve, ocorrerá mais um encontro de países, dessa vez em Copenhague, a debater o futuro do planeta: quem polui, o quanto polui, o que dever ser feito e, em especial, quem deverá pagar pelas correções ou uso de novas tecnologias que serão utilizadas na redução das emissões de gases de efeito estufa.


É nessa etapa da discussão que o uso de bioenergia apresenta-se como um fator diferenciado e de vantagem para o país. Primeiro, porque, ao tratar a produção de combustível como uma atividade agrícola, a exemplo do cultivo da cana-de-açúcar, demonstra-se que nenhuma outra opção energética consegue ter um balanço de emissões tão positivo quanto esse.

Segundo, do ponto de vista de emissões, estudos de cientistas da Embrapa e de outras instituições têm mostrado que, ao se utilizar o etanol como combustível em automóveis, reduz-se em até 80% a emissão de CO2 para a atmosfera. Esse número é algo invejável, sob qualquer ponto de vista, para qualquer opção atual.
As vantagens do ponto de vista ambiental não se exaurem aí.

Vale salientar que, com as tecnologias
atuais, a razão entre o input e o output de energia, quando do processamento da cana-de-açúcar em etanol, é de 1:9. Esse nível de eficiência não ficará restrito a essa já extremamente positiva razão, uma vez que, apenas para o etanol de primeira geração, estima-se que, nas próximas duas décadas, a produtividade agrícola se elevará 25%, alcançando-se uma produtividade agrícola de 100 t/ha/ano, enquanto a produtividade industrial crescerá 15%, fazendo com que uma destilaria eficiente possa produzir, em média, 110 litros de etanol por tonelada de cana moída.

Nesse caso, ainda com a primeira geração de etanol, a produtividade brasileira saltará de 7.000 litros para 10.000 l/ano/hectare. A terceira etapa do ganho de produtividade energética com a bioenergia está na cogeração e na produção de carvão e briquetes a partir do bagaço da cana-de-açúcar. O bagaço, somente recentemente, tornou-se um coproduto na indústria sucroalcooleira de valor econômico e ambiental reconhecido.

Com a introdução de caldeiras e reatores mais eficientes, sistemas de distribuição de energia mais eficazes e preços crescentes de energia de uso doméstico e industrial, a cogeração passou a ser uma opção econômica e ambiental para diversas empresas do setor. No caso do Brasil, o consumo de carvão vegetal, de uso doméstico ou industrial, é uma outra fonte de preocupação, uma vez que sua produção se dá, na maioria dos casos, à custa do uso da vegetação nativa.

O bagaço e a palha da cana-de-açúcar apresentam-se como uma das opções mais efetivas de renda, redução de desmatamento e mitigação na emissão dos gases de efeito estufa.
A bioenergia não é uma solução para todos os problemas, entretanto, no caso de países tropicais, com áreas agrícolas subutilizadas, ela se apresenta como opção lógica do ponto de vista econômico, social e ambiental.