Não só o Brasil tem oferecido elementos para uma recuperação dos preços de etanol e do açúcar. Outros importantes participantes do mercado, como os Estados Unidos, a União Europeia, a Índia, a Tailândia, o México, a África do Sul e a Guatemala têm contribuído para esse cenário. No Brasil, o vigor do consumo de etanol e a perspectiva de novos aumentos na Cide e no preço da gasolina na refinaria para recuperar o caixa da Petrobras, que foi ceifado, juntamente com o das usinas de cana, nos últimos 6 anos, têm sido elementos fundamentais para o aumento nos preços do etanol e do açúcar.
Nos Estados Unidos, a readoção do Programa de Combustíveis de Baixo Carbono (LCFS) na Califórnia fez com que o valor da tonelada de carbono passasse de US$ 24 para US$ 82 entre os meses de junho e outubro último. Isso fez com que o prêmio atribuído às diferentes classificações do etanol de cana produzido no Brasil subisse, e o do mais comum, com intensidade de carbono de 58,4 gCO2/MJ (gramas de dióxido de carbono por megajoule), atingisse, segundo os cálculos da Datagro, mais de US$ 66.40/m3, ou R$ 0,26/l. O etanol de cana de segunda geração, com IC de 7,49 gCO2/MJ, recebe prêmio de US$ 152.00/m3, ou R$ 0,59/l.
Esses valores têm feito com que o preço do etanol anidro exportado para esses mercados tenha subido para a faixa de R$ 1,85 a R$ 2,00 por litro ao produtor, posto, veículo, usina, base Ribeirão Preto, o que denota a valorização do etanol no mercado externo. Essa valorização não ocorre apenas nos EUA. O preço do etanol b-grade na Coreia do Sul e do etanol em Rotterdam também tem subido, apesar da percepção de preço ainda baixo nos mercados de petróleo e gasolina.
No mercado de açúcar, a União Europeia reduziu, em 2015, a área cultivada com beterraba açucareira de 1,56 para 1,34 milhão de hectares, além da oferta de açúcar de 19,93 para 18,6 milhões de toneladas de açúcar branco equivalente. A Índia, afetada pelo impacto do El Niño, deve reduzir a sua produção, passando de 28,4 para 26,8 milhões de toneladas de branco equivalente em 2015/2016. A Tailândia deve, temporariamente, interromper a expansão observada nos últimos 5 anos, estabilizando sua produção em 11,3 milhões de toneladas.
A China deve reduzir mais uma vez sua produção, de 10,8 para 9,8 milhões de toneladas, enquanto o consumo sobe de 15,9 para 16,4 milhões de toneladas. Na África do Sul, é projetada uma queda de 30% na produção. No México, a produção deve cair de 6,2 para 6milhões de toneladas, e, na Guatemala, a produção deve cair 5% em relação ao ano anterior. Enquanto na safra mundial 2014/2015 (out/set) estimamos um superávit de 3,64 para 2015/2016, estamos estimando um déficit de 2,57 milhões de toneladas, o qual já leva em conta o provável mix mais açucareiro do Brasil na safra 2016/2017, que afeta a safra mundial 2015/2016, que termina em 30 de setembro de 2016.
Esses volumes devem fazer com que a relação estoque/consumo caia de 48,3%, em 30 de setembro de 2015, para 45,9%, em 30 de setembro de 2016. Na nossa avaliação, esse percentual ainda é elevado e muito acima do nível de 41% que, na nossa observação da evolução histórica de estoque e preços, levou a preços mais firmes. Para atingir os 41%, seria necessário um déficit acumulado a partir de 1º de outubro de 2016 de aproximadamente 5% sobre um consumo mundial de 180 milhões de toneladas, ou seja, 9 milhões de toneladas adicionais de déficit. Ainda é cedo para anteciparmos cenários para a safra mundial 2016/2017, mas o que explica o fato de que o preço mundial tem se mantido relativamente elevado, quando avaliado em reais por libra-peso?
Algumas explicações podem residir no fato de parte do estoque mundial de açúcar estar “esterilizado” na Índia e na China. Estimamos que a Índia tenha encerrado a safra 2014/2015 com estoque de 10,09 milhões de toneladas, bem acima do nível normal de 5-6 milhões de toneladas. Apesar do estoque elevado, até agora, pouco foi efetivamente exportado pelas usinas.
Por esse motivo, o governo indiano estuda criar mecanismos que as obriguem a exportar cerca de 2 milhões de toneladas e a destinar um percentual da receita a um fundo que deve ser utilizado para pagar as pendências das usinas com os fornecedores de cana. Na China, os estoques elevados não têm sido suficientes para arrefecer o ritmo de importações, provavelmente por preocupações de segurança alimentar. Uma outra explicação para o nível de preço no mercado internacional de açúcar estar se mantendo elevado é a expectativa de que é cada vez mais provável um novo reajuste da Cide sobre a gasolina, que pode chegar a mais R$ 0,30 ou R$ 0,50 por litro.
Se isso ocorrer, haverá um novo impulso no preço do etanol no Brasil, que serve de referência para o açúcar. Embora o Governo Federal resista a essa medida, pelo temor que traga para a expectativa de inflação, sem a aprovação da Cpmf, a Cide seria a única solução para evitar o déficit fiscal de 2016. Cabe ao governo explicar à sociedade que essa medida apenas recupera o nível praticado no passado e que o consumidor não está obrigado a pagar o tributo ao optar pelo uso do etanol.
Há ainda a possibilidade de que ocorra um reajuste adicional no preço da gasolina, para recuperar a geração de caixa da Petrobras, afetada por anos de contenção artificial de preços. O mercado mundial continua em transformação. Resultados positivos têm sido auferidos por produtores em países como Peru, Colômbia, Tailândia e Austrália. Pela participação que têm no mercado, fatores que afetam o mercado interno brasileiro continuam influenciando a formação de preço internacional, mas não são os únicos. Num mundo cada vez mais integrado e com comunicação imediata, a compreensão do que ocorre simultaneamente nos principais fundamentos é cada vez mais importante para antecipar movimentos de preço.