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Julio Maria M. Borges

Diretor da Job Economia e Planejamento

Op-AA-11

Álcool: a commodity global

O tema deste artigo era uma meta estratégica dos produtores brasileiros de etanol, há quatro anos atrás. A questão é: esta meta vai virar realidade? Vamos tentar as respostas a esta questão a seguir.

1. Os fundamentos econômicos: Todo o movimento favorável ao álcool combustível deve-se ao petróleo, relativamente caro. Petróleo em torno de US$ 35 por barril já é suficiente para viabilizar o álcool anidro, em mistura com gasolina. Além disso, não podemos esquecer que o protocolo de Kyoto está em vigor e que o etanol é um combustível limpo, que gera direitos de crédito de carbono.

Portanto, sob a ótica de fundamentos, o álcool anidro do Brasil, para ser misturado com gasolina em uma proporção de até 25%, representa uma boa oportunidade de investimento e de exportação, considerando que o petróleo tem probabilidade alta de apresentar preços iguais ou superiores a US$ 35 por barril.

2. Barreiras comerciais: Os países que hoje consideram a adoção do etanol combustível, como os EUA e UE, entendem a medida como um instrumento de redução da dependência do petróleo importado e de melhoria do meio ambiente, e também como um instrumento de proteção da renda e do emprego no campo. Ou seja, a idéia inicial é protecionista, do ponto de vista de comércio internacional.

Esta condição é inibidora do álcool como commodity global, no curto prazo. No médio e longo prazos, é possível que o grau de proteção à produção doméstica de etanol seja naturalmente reduzida, em função de uma demanda crescente do etanol combustível. Neste particular, cabe destacar as parcerias estratégicas entre os países.

3. O álcool em outros países e os interesses do setor de petróleo: O que se observa em diversos países da América Latina e mesmo em alguns países desenvolvidos, que estão considerando o uso de biocombustíveis, é que os interesses econômicos, ligados ao petróleo, ainda criam barreiras ao uso do etanol, em substituição a derivados daquele produto.

Esta situação é também inibidora do álcool como commodity global, no curto prazo. Na medida em que o álcool se mostrar uma opção viável - do ponto de vista técnico, econômico e estratégico, de substituir parte da gasolina, melhorando sua qualidade e o meio ambiente, o setor de petróleo irá utilizar esta opção comercial. Veja o caso da Venezuela e da Nigéria, que são produtores e exportadores de petróleo e que vão usar álcool anidro brasileiro, em mistura com gasolina.

A transferência de tecnologia não seria uma restrição à entrada de outros países na produção de álcool, tendo em vista que está disponível, seja por parte dos governos interessados no uso do álcool combustível - como Brasil e EUA, seja por parte dos fornecedores de equipamentos.

4. Capacidade de oferta de álcool do Brasil: Os projetos de investimento em produção de álcool no Brasil sinalizam que, em 2015, poderemos ter uma produção na faixa de 40 a 45 bilhões de litros, e cerca de 20% a 25%, deste total, estariam disponíveis para exportação.

Esta situação de excedentes exportáveis, como proporção da produção total, não é muito diferente da atual: estamos produzindo cerca de 17 bilhões de litros e exportando 3,5 bilhões. Neste cenário de oferta de álcool, estamos admitindo que o mercado interno continuará sendo o grande destino da produção, com base numa demanda firme, proveniente dos veículos flex.

Ou seja, se nos próximos oito anos, a demanda externa for superior a 10 bilhões de litros, haverá necessidade de aumentar o ritmo de investimentos, em relação ao que podemos observar atualmente. Melhorias na logística de exportação de álcool estão acontecendo e devem dar suporte a crescentes volumes de comércio externo do produto. É preciso que o Governo não atrapalhe; se puder ajudar, será um reforço muito bem-vindo.

5. Especificação do produto: Na medida em que haja um padrão de especificação do álcool combustível, que possa ser aceito no comércio internacional do produto, isto certamente irá favorecer e dinamizar sua aceitação como uma commodity global.

O efeito benéfico desta especificação padrão deverá ocorrer com mais eficácia no médio prazo, quando se espera que o mundo esteja mais aberto e menos protecionista ao comércio internacional de álcool combustível.

6. Contratos comerciais e mercado de futuros: A existência de uma boa referência para um contrato de exportação de álcool é fundamental para dinamizar seu comércio exterior. Além disso, se queremos que o produto se torne uma commodity global, é necessário dispor de uma Bolsa, com negociações de álcool em mercados futuros, para que se possam evitar os riscos de preços de mercado.

O início de mudança na matriz energética mundial está beneficiando o Brasil, com o álcool de cana. Nosso país também pode se aproveitar desta oportunidade, criando condições para que a BM&F seja uma referência internacional, como Bolsa de futuros de álcool. O contrato de álcool na BM&F é um contrato maduro, em função de negociações iniciadas há cerca de dez anos. Falta uma injeção inicial e temporária de liquidez, que depende dos próprios “players do mercado”, que queiram fazer do Brasil uma referência mundial de álcool combustível. Afinal de contas, somos o país mais velho neste assunto, tendo em vista que, considerando um passado recente, já temos usado o álcool combustível por 30 anos.