Professor do Instituto de Eletrotécnica da USP, Secretária Executiva e Pesquisadora do Cenbio
Op-AA-15
No ano de 2006, nas 310 usinas brasileiras, foram processadas 425 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, produzindo 30 milhões de toneladas de açúcar e 17 bilhões de litros de etanol. O estado de São Paulo respondeu por 62% da produção nacional de cana. Estimativas da Unica indicam que, na safra 2012/13, a moagem poderá atingir 728 milhões de toneladas de cana, com cerca de 86 novas indústrias, atingindo uma produção total de 38,5 milhões de toneladas de açúcar e 38 bilhões de litros de etanol.
O Programa do Álcool, iniciado na década de 70, visava à produção de etanol, para substituir a gasolina, e assim reduzir as importações de petróleo no Brasil. Apesar de, inicialmente, pesados subsídios terem sido utilizados no programa, hoje o álcool é, sem eles, economicamente competitivo com a gasolina. Além disso, passados trinta anos, o setor sucroalcooleiro descobre um novo produto, a eletricidade produzida a partir do bagaço de cana, chamada de bioeletricidade e que é exportada para a rede do sistema interligado.
Diferentemente do que acontecia no início do Proálcool, quando o bagaço de cana era queimado em caldeiras ineficientes, de baixa pressão, apenas como uma maneira de eliminar um resíduo indesejável, hoje muitas usinas já utilizam equipamentos eficientes e, além de suprirem sua própria demanda de energia, vendem o excedente de eletricidade para a rede.
Atualmente, no estado de São Paulo, existem 146 usinas de cogeração em operação no setor sucroalcooleiro, com uma potência instalada total de mais de 1.700 MW, o que corresponde a 70% da cogeração do Brasil. Do total de energia produzida, parte é utilizada para suprir a necessidade das próprias usinas e o excedente é vendido.
Em São Paulo, o total de energia vendida no mercado é de 900 MW médios, sendo 400 MW comprados pela CPFL e 272 MW contratados pelo Proinfa - Programa de Incentivo a Fontes Alternativas de Energia, estabelecido pela Lei 10.438/02. Entretanto, devido ao aumento da produção de cana, a eliminação da queima da palha e o aumento da capacidade de geração das usinas, o potencial de produção de energia do estado de São Paulo pode superar os 10.000 MW, até 2015.
A importância da eletricidade produzida pelo setor começou a ser reconhecida no ano 2000, quando houve a escassez na oferta do sistema interligado, e aquelas usinas que possuíam excedente de eletricidade para venda puderam vender seu produto a preços bastante atrativos. Entretanto, embora a situação esteja muito mais favorável hoje, do que há 10 anos, ainda existem diversas barreiras à venda de eletricidade.
A principal delas é a tarifa. O governo tentou, por meio do Proinfa, incentivar a venda de eletricidade de energias renováveis, em contratos de longo prazo com a Eletrobrás e com uma linha especial de financiamento no BNDES. Porém, o valor da tarifa oferecida à energia da biomassa ficou aquém do esperado pelos produtores, e muitos empreendedores preferiram oferecer sua energia no mercado livre ou em leilões, onde pudessem obter preços melhores, a se prender em contratos de 20 anos, com baixas tarifas.
A prova disto é que dos 1.100 MW oferecidos para energia de biomassa pelo programa, apenas 685 MW foram preenchidos. Hoje, a maior parte da energia das usinas de cana de São Paulo é vendida no mercado regulado, onde estão os contratos com concessionárias locais, Proinfa e leilões. Outra barreira muito discutida é o pagamento da conexão dos geradores, com o sistema de transporte de energia local (distribuição e transmissão).
Na verdade, não existe barreira técnica na interligação, o problema é a falta de regulação sobre a responsabilidade pela conexão entre agentes geradores, distribuidores e transmissores. Essa falta de entendimento está atrasando a efetiva disponibilidade da bioeletricidade para o país, apesar dos seus benefícios. Uma opção para solucionar este problema, no caso de São Paulo, seria a Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista -CTEEP, realizar a conexão e ratear seu custo entre os consumidores finais.
Há ainda um terceiro problema que diz respeito às linhas de financiamento e incentivos para instalação de equipamentos eficientes, mas, hoje, as condições são bem mais favoráveis do que há 8 anos. O BNDES continua sendo o maior financiador de longo prazo e já oferece linhas especiais, que beneficiam aqueles que optam por tecnologias mais eficientes, porém alguns trâmites burocráticos, tais como as garantias exigidas e a morosidade do processo de liberação de recursos, ainda podem ser aperfeiçoados.
O último ponto ainda tido como problemático no setor sucroalcooleiro é o backup. A necessidade de energia adicional da rede decorre de questões climáticas, pois a colheita da cana deve ser interrompida quando chove, e não por ineficiência da usina. A Aneel está trabalhando para adequar a legislação existente a esta nova realidade, trazida pelo setor sucroalcooleiro.
A Lei 11.488/07 e a Resolução Aneel 271/07 repararam alguns problemas recorrentes na definição de fontes especiais e a Audiência Pública (AP 001/07) buscou obter subsídios e informações adicionais para aprimorar a Resolução Aneel 371/99, que regulamenta a contratação de reserva de capacidade por agente autoprodutor ou produtor independente de energia.
Enfim, se verifica que apesar de todos os seus benefícios ambientais (energia renovável), sociais (geração de emprego) e técnicos (complementa a hidreletricidade durante o período seco), permanecem barreiras de fundo administrativo, que precisam ser discutidas, visando a implementação do enorme potencial existente para a bioeletricidade da cana-de-açúcar.