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Lorenzo Pianigiani

Diretor da Sebigas Cótica

OpAA81

A relevância do biogás e seus produtos para o setor sucroenergético
O Brasil é quinto maior emissor de metano do mundo. O planeta está aumentando a temperatura, aproximadamente, em até 1,5ºC – marco limite previsto no Acordo de Paris. Ao analisarmos o impacto dos gases de efeito estufa (GEEs), o metano é 86 vezes mais nocivo que o CO2 em um período de 20 anos, segundo CACC  da ONU. Assustador, eu sei! São essas informações que batem à nossa porta constantemente.   
 
Ao mesmo tempo, do outro lado da moeda, o Brasil tem a oportunidade única de assumir a liderança na construção de uma forte indústria de biometano – agente de atuação direta na descarbonização e na transição energética. Segundo um estudo da McKinsey & Company, estima-se um investimento de até US$ 15 bilhões no país. Ou seja, um mercado em plena expansão.  
 
Hoje, o mercado de biogás e biometano no Brasil está representado por mais de 1.300 plantas de produção de biogás, sendo que apenas 37% são destinadas à produção de biometano, de acordo com a CIBiogás. A Agência Nacional do Petróleo (ANP), em seu mapa de produção de biometano, tem seis instalações aprovadas e 25 em construção no país, que somam mais de 1.144 milhões Nm³ por dia de biometano.  
 
Ao olharmos para o mercado sucroenergético, o potencial de produção de biogás representa 47,8%, sendo que as regiões sudeste e centro-oeste sozinhas representam 41%. Porém, somente uma das instalações aprovadas e sete em construção pelo mapa da ANP são focadas em resíduos oriundos do processo de produção de açúcar e etanol. 

No Brasil, temos mais de 400 usinas com potencial de produção de biometano, a partir dos resíduos orgânicos gerados na produção de açúcar e etanol, em primeiro a vinhaça, que devido ao volume representa o maior potencial e que junto com a torta de filtro, a palha e a sobra de bagaço complementam os resíduos aptos para geração de biogás.

Para inovar é preciso o quê?  

Para um projeto de biogás ter sucesso e entregar o retorno esperado, é fundamental escolher uma tecnologia de biodigestão que proporcione os seguintes pilares: eficiência de conversão da matéria orgânica em metano, estabilidade no processo biológico e elevado uptime, além do baixo custo operacional. 

Em todo esse processo, há parâmetros importantes que precisam ser atentamente avaliados, como taxa de carga orgânica, tempo de retenção hidráulica e tempo de retenção da biota, temperatura de processo e maximização do contato entre biomassa e biota. O design da planta e as relativas escolhas de cunho técnico precisam ser conduzidas em harmonia com as premissas de negócio.

Conhecimento do mercado de biometano visando obtenção de contratos de venda vantajosos, utilizando de linhas de financiamento atrativas – que os projetos de biometano se encaixam perfeitamente devido ao apelo sustentável –, e valorização dos certificados verdes complementam os ingredientes para um investimento de sucesso.

Afinal, o valor está na molécula e seus atributos sustentáveis. Uma vez que uma usina de cana-de-açúcar dispõe de uma planta de biometano, várias portas podem se abrir. Hoje, sem dúvida, os melhores retornos estão no aproveitamento do biogás para geração de biometano, utilizando-o na frota ou na comercialização. E o biogás e o biometano também podem, no longo prazo, servir como base para produção de hidrogênio e amônia de baixo carbono, metanol, SAF, entre outros, por meio de processos de reforma, síntese e purificação.

O quanto vale utilizar o biometano na frota?

Com a produção de biometano no setor sucroenergético, surge uma oportunidade sólida para a transição na integração com o biometano, especialmente em veículos movidos a diesel, que são responsáveis por uma das maiores despesas do setor. Em média, cada tonelada de cana-de-açúcar processada consome 3,5 litros de combustível fóssil.

Ao compararmos as emissões de NOx e Material Particulado (MP), a substituição do diesel pelo biometano resulta em uma redução de aproximadamente 90% em ambos os componentes. No que diz respeito aos GEEs, a redução na emissão de CO2 pode chegar a 95%.

Esse papel também está sendo desempenhado pelas concessionárias de gás canalizado, que estão criando "corredores azuis" – rotas com pontos de abastecimento estratégicos nas rodovias – viabilizando de forma efetiva, a princípio, a substituição do diesel por um energético de menor pegada de carbono e, futuramente, com um mercado mais estruturado, uma transição energética praticamente 100% renovável.

Digestado da Vinhaça: qual é o seu valor para o solo? 

A vinhaça digerida tem demonstrado possibilidades interessantes no campo agrícola como promotora de crescimento. Experimentos de campo no cultivo para diversas culturas agrícolas revelaram que a aplicação de efluentes de destilaria, pós-tratamento anaeróbio, resultou em aumento de área foliar, maior teor de clorofila, atividade de nitrato redutase, massa seca total e produtividade de grãos. 

O tratamento anaeróbio é capaz de equalizar o pH para níveis de 7,5 a 7,8 na vinhaça digerida, reduzindo a toxicidade tradicional do pH ácido da vinhaça in natura (3,5 – 4,5). Tal fato contribui para maior crescimento em comprimento de raiz, comprimento de parte aérea, número de folhas, biomassa, pigmento fotossintético, proteína e demais constituintes. 

Além de micronutrientes e matéria orgânica, nitrogênio, fósforo e potássio em formas biodisponíveis para absorção pelas plantas são os principais nutrientes que a tornam altamente útil como um biofertilizante. Como resultado de seu alto conteúdo nutricional, pode ser utilizada para aumentar a produtividade agrícola e melhorar a saúde do solo. 

Os microrganismos benéficos (consórcios microbianos) incluídos na vinhaça digerida podem influenciar a microflora nativa do solo aumentando sua fertilidade, contribuindo para a resistência a doenças e para o desenvolvimento das plantas.? 

A vinhaça biodigerida melhora a estrutura do solo, a retenção de umidade, a ciclagem de nitrogênio, a saúde do solo e a atividade microbiológica e, portanto, tem sido utilizada com sucesso na cana-de-açúcar e em outras culturas agrícolas, demonstrando sua eficácia no aumento da produtividade e na regulação de nutrientes de maneira sustentável. No geral, o emprego da vinhaça como biofertilizante melhora a conservação da água, a fertilidade do solo e a sustentabilidade a longo prazo. 

Fundamentada nos conceitos de economia circular e geração de energia renovável, a aplicação da digestão anaeróbia vem ganhando amplo espaço no segmento sucroenergético do país, impulsionada pelo crescimento da demanda do biometano e da busca das empresas de caminhos eficazes para reduzir a pegada de carbono, abrindo para as usinas uma oportunidade de diferenciação de produtos e melhoria da nota de eficiência do próprio etanol.