Me chame no WhatsApp Agora!

Luiz Carlos Corrêa Carvalho, Caio

Presidente da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Açúcar e Álcool do Ministério da Agricultura

Op-AA-11

Uma longa jornada começa com o primeiro passo

Os novos estudos a respeito da sustentabilidade do desenvolvimento das economias industrializadas, e em vias de desenvolvimento, apontam para a urgente necessidade de profundas mudanças na matriz energética desses países, como forma de reduzir os estragos que, certamente, estarão sendo contabilizados, nas próximas décadas, pelo aquecimento do planeta Terra.

O olhar pelo retrovisor indica a tremenda dependência da sociedade global pelas fontes fósseis de energia, cujo crescimento, nos séculos XIX e XX, esmagaram outras alternativas, certamente menos poluidoras. De uma forma clara, o hemisfério norte, desenvolvido, já consome mais petróleo do que produz; a Rússia logo atingirá o seu pico de produção; os norte-americanos, europeus, chineses, japoneses, coreanos, entre outros, já sofrem a dependência do Oriente Médio, instável, ou de países complexos como a Venezuela ou a Nigéria. Do lado do hemisfério sul, a imensa maioria sofre do mesmo mal, havendo algumas poucas exceções, como, por exemplo, o Brasil.

Com muito pouca importação de petróleo, mas importando gás (aliás, com sustos bolivianos), o Brasil, graças à sua produção e uso em larga escala do etanol combustível, exporta gasolina, além do próprio etanol. Crescendo no ritmo pífio atual não haverá problemas. No entanto, o desejo de crescer e medidas voltadas a essa direção indicam potenciais assustadores apagões de energia elétrica mais à frente, outro importante componente da equação brasileira para se desenvolver de forma sustentada.

As manifestações do atual governo brasileiro, através das posições de suas lideranças políticas, expressam curiosa dicotomia, com relação ao tema etanol da cana-de-açúcar: elogia-se o etanol, mas se amaldiçoa a cana e seu passado escravagista, assim como as grandes áreas que ocupa, criando-se dificuldades, e mesmo ajudando a desenhar uma imagem injusta de descrédito ao potencial brasileiro. Aliás, este é outro soluço de incompreensão, pois o marco regulatório é definido pelo governo!

Voltando ao petróleo, há dois graves problemas relacionados a ele:

 

  • um, político, que reage contra o enriquecimento das pessoas/grupos/países errados (radicais, que alimentam o terrorismo e/ou a democracia), que se locupletam com os altos preços do petróleo;
  • outro, mais grave, o ambiental, que significa a elevada contribuição da queima dos combustíveis fósseis ao aquecimento global. Como exemplo, tem-se que, antes de 2010, a China ultrapassará os EUA em emissões de CO2 e, ao redor de 2015, ela ultrapassará as emissões de todos os países da OCDE.

As previsões das entidades especializadas no tema, como a Agência Internacional de Energia - dos países da OCDE, que foi a eleita para assessorar o G8 – Grupo dos Oito países mais ricos, além do Brasil, China, Índia e África do Sul, indicam a urgência de medidas voltadas a reduzir emissões de carbono. O World Energy Outlook 2006, da Agência, cita que: “se os governos não tomarem novas iniciativas, a demanda por combustíveis fósseis e os fluxos comerciais, bem como as emissões de gases, que contribuem para o efeito estufa, persistirão no mesmo caminho insustentável, até 2030”.

Não é por menos que em 10/01/2007, a UE redefiniu para cima as suas metas de uso de combustíveis renováveis (20%) e, em 23/01/2007, numa sincronia não antes vista, o Presidente dos EUA redefiniu as metas de uso dos renováveis (35 bilhões de galões, para 2017) de uma forma espetacular, sob aplauso dos dois partidos políticos do país.

O caso brasileiro é referência para o hemisfério sul, onde o mundo tropical começa a entender a importância de ser parte dessa fase de transição da oferta e do uso de energia, com impactos geopolíticos extremamente valiosos para toda uma região, que precisa se desenvolver de modo sustentável. Não se trata apenas de, individualmente, cuidar da sua segurança energética.

Afinal, a insegurança dos outros será a insegurança de todos. O tema da necessária transição ao futuro tem sido debatido intensamente e se sabe que vários setores energéticos participarão dessa fase. Os energéticos fósseis receberão nova tecnologia, para serem menos poluidores, e os renováveis mostrarão rupturas tecnológicas espetaculares. Mas, isso não é suficiente!

É preciso globalizar o novo combustível, com referências de preços e sem barreiras de nenhum tipo, como hoje se faz com os derivados do petróleo. Isso significa “commoditizar” esses combustíveis líquidos renováveis, criando efetivamente a grande oportunidade de substituição de fatias importantes de gasolina, diesel e outros derivados do petróleo. Numa visão de longo prazo, onde o petróleo, o carvão mineral, o país natural e a energia nuclear estarão presentes, necessariamente, a energia renovável encontra o seu caminho.

Afinal, há importante espaço de contribuição, não apenas no campo da energia elétrica, mas, também, na área química, hoje tão dependente dos derivados dos produtos energéticos fósseis. O Brasil tem importantes vantagens comparativas, como a capacidade competitiva do seu etanol e a tecnologia desenvolvida no lado automotivo.

Tem escala e o reconhecimento do seu trabalho. Expande a sua produção e ganha eficiência. A expansão da oferta da cana-de-açúcar gera, também, ótimas possibilidades de ajudar o país no seu potencial problema futuro de apagões, graças ao bagaço da cana e das suas palhas e pontas. Individualmente, após o lançamento das metas dos EUA, a Secretaria de Estado dos EUA visitou formalmente o governo brasileiro (e também o argentino), para debater a possibilidade de um Acordo Brasil-EUA nesse campo.

Será fundamental reforçar os países das Américas para a expansão da oferta e uso dos combustíveis renováveis. É sempre importante lembrar exemplos brasileiros nesse campo, que são referência internacional: o Brasil tem quase 45% do seu Ciclo Otto (motores que usam gasolina, ou gás natural e/ou etanol), na forma de etanol. E faz isso de forma competitiva e sem alardes.

Só como comparação, os EUA usam etanol em 2% do Ciclo Otto. Os países em desenvolvimento têm esse exemplo. Não há porque não copiá-lo. Nossa humildade nesse campo é tão grande que chega a ser negativa! É impressionante como o Brasil não valoriza o que faz. Não temos uma política formal (com P maiúsculo) sobre o tema. Temos ações pontuais, conversas com vizinhos latino-americanos, tentativas em Câmaras com países. Isso merece muito mais! Mas, uma longa jornada começa com o primeiro passo...