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Andy Duff

Gerente de Pesquisa e Estrategista Global de Açúcar do Rabobank Brasil

Op-AA-43

Atravessando tempos turbulentos

Desde a crise financeira internacional de 2008/2009, o setor sucroenergético brasileiro enfrentou uma série de desafios – do clima, dos mercados e da regulação –, resultando em uma estagnação da produção do setor e em uma deterioração preocupante da situação financeira de uma parte significativa do setor. Como é comum em qualquer mercado de commodity que sofre uma crise, os impactos mais severos dessa crise no setor sucroenergético têm sido nos participantes menores; a grande maioria das dezenas de usinas fechadas, ou que entraram em recuperação judicial nos anos recentes, são pequenas.

Porém, o ambiente tem sido desafiador para todos, e até várias grandes empresas já se afundaram ou estão lutando para sobreviver. A realidade é que qualquer empresa que opera com níveis altos de endividamento, ou que fica com muita dívida no curto prazo e/ou com liquidez baixa, ou que não consegue controlar os custos, continua vulnerável no cenário atual. Isso porque, apesar dos seis anos de crise estendida já passados, parece que a tormenta ainda não acabou.

É verdade que o Governo Federal apresentou novas medidas em 2015 que vão ajudar o setor, como a volta da Cide e o aumento da mistura de anidro à gasolina, mas, por outro lado, o preço internacional de açúcar continua pressionado pelo desequilíbrio entre oferta e demanda e pelo fortalecimento do dólar. Além disso, a queda expressiva do preço internacional do petróleo no segundo semestre de 2014 e a possibilidade de que os preços possam ficar em níveis baixos por um longo período fazem com que a trajetória dos preços internos da gasolina, de 2016 em diante, seja uma nova fonte de incerteza.

É verdade também que o enfraquecimento do real frente ao dólar traz uma melhora de competitividade ao setor, mas não há garantias de que essa situação permanecerá para sempre. Por isso, com controle zero sobre os preços internacionais e o câmbio, o foco do setor para a recuperação das margens e a volta ao equilíbrio financeiro sustentável no futuro terão que ser, em grande parte, via controle e redução de custos.

Um dos maiores impedimentos à redução dos custos em anos recentes tem sido a estagnação da produtividade e da produção da cana, que provocou um aumento de custos unitários no campo e no processamento, dado que os custos fixos estão sendo distribuídos por um volume reduzido de produção. Diante desse problema, resultado da seca e da redução dos investimentos no canavial, algumas empresas ampliaram a produção, via esforço no replantio, ou expansão da cana própria.

Outra resposta, no caso de grupos que operam várias unidades, tem sido a parada de operações em uma planta para maximizar a utilização de capacidade das outras que vão continuar em operação. Olhando mais para frente, a esperança é a de que a tecnologia ofereça muitos caminhos promissores para aumentos da produtividade, ganhos em eficiência e redução de custos.

O CTC e outros estão desenvolvendo variedades novas de cana, e algumas empresas estão avançando com o etanol de segunda geração. Enquanto o timing da chegada dessas tecnologias novas permanece incerto, existe um leque de iniciativas menos revolucionárias, direcionadas ao melhoramento incremental das operações, especialmente na logística das operações no campo; cortando o tempo e os gastos associados, por exemplo, ao transporte das equipes de trabalho e do maquinário nas frentes de trabalho.

Em outra iniciativa, várias empresas estão trabalhando para melhor aproveitar o potencial da palha, visando, assim, aumentar a geração e a venda de eletricidade. Os ganhos em produtividade e a redução de custos que virão em decorrência dessas iniciativas não serão de graça – para cada ganho, um investimento tem que ser feito. Contudo, dado o caráter incremental desses investimentos, o impacto na alavancagem da empresa é menor, permitindo a ela manter um perfil conservador e, portanto, adequado, diante de tanta incerteza.

Entre as iniciativas que exigem um investimento além do incremental, uma em que – parece – ainda falta estímulo suficiente para realmente catalisar alguma mudança positiva é cogeração de energia elétrica. Tais projetos oferecem não só uma diversificação da renda para as usinas, aumentando a receita e reduzindo a volatilidade do seu fluxo de caixa, mas também um fortalecimento da oferta nacional de energia, que, de novo, se mostra vulnerável. Por isso um esforço adicional para ampliar a geração de energia elétrica de bagaço e de palha, neste momento, ajudaria tanto ao País quanto ao setor.

Em contraste com os investimentos incrementais, hoje em dia, é difícil imaginar que qualquer empresa do setor estaria disposta a cogitar um projeto de greenfield para os próximos anos. Mesmo para quem tenha condições e vontade de expandir, a aquisição de ativos sairia hoje mais rápido e barato (em termos de gerar um novo fluxo de caixa) que a construção de novas unidades.

Por outro lado, um impedimento a esse tipo de movimentação entre empresas do setor tem sido a enorme diferença entre as ideias dos potenciais compradores e os potenciais vendedores a respeito do preço justo desses ativos. Parece que, nesse caso, faltam mecanismos que reflitam melhor os riscos de comprar ou vender ativos diante das incertezas atuais e que permitam que, por exemplo, pelo menos, uma parte dos benefícios ou perdas decorrentes de uma venda sejam, para um tempo definido depois do fechamento, compartilhados entre comprador e vendedor.

Claro que, como sempre, é fácil identificar o que falta, mas é longe de ser fácil propor uma solução que agrade tanto ao vendedor quanto ao comprador. Mas desenvolver soluções para esse dilema seria, ao menos, um caminho para catalisar a consolidação do setor, evitando, assim, a insolvência, e todas as complicações associadas, de empresas enfraquecidas pela crise.

Diante do pano de fundo atual das incertezas dos mercados e da situação financeira do setor, mais estímulo para o desenvolvimento de cogeração e mais mecanismos para suavizar a consolidação ajudariam a indústria sucroenergética a atravessar esses tempos turbulentos. Isso, aliado aos melhoramentos incrementais já em obra por muitas empresas, elevará a eficiência e a competitividade dessa indústria, permitindo, assim, que ela possa enfrentar o futuro com mais confiança.