Santal
Op-AA-02
O Brasil produz cana, açúcar e álcool no menor custo mundial. A convergência de diversos fatores, como clima, disponibilidade de terras aptas, empresariado, técnicos e mão de obra competente, além de um rol de empresas fornecedoras que se desenvolveram junto com o setor, tornaram o negócio cana altamente competitivo, exportador de know-how, e, sobretudo inovador em tecnologia.
A capacidade e dinâmica do empresário brasileiro colocaram uma velocidade tão surpreendente na geração de novas tecnologias que vão da produção de cana, açúcar e álcool até comercialização de produtos finais, que, para alcançar nossos resultados, outros países terão que investir consideráveis quantias, numa atividade que não floresce da noite para o dia.
Nesta corrida da evolução competitiva, passa despercebido, ou pelo menos menosprezado, aproximadamente 40% do potencial energético da cana - de um total de 67.080 Mcal/ha, que existe em forma de palha, folhas e pontas, hoje escandalosamente desperdiçadas do nosso farto prato natural. E ainda por cima, devolvemos esse excedente ao ambiente na forma de CO2, o que é politicamente incorreto, ambientalmente condenado e economicamente escandaloso.
Podemos imaginar algo coerente jogar no lixo 40% da produção de soja que colhemos? E porque essa situação persiste? Logicamente a solução não é simples, e está amarrada em dois pontos: o primeiro é a insegurança de apostar nas termoelétricas à biomassa, um mercado novo, sem regras, de alto investimento, conseqüentemente, alto risco, e o segundo é a dificuldade técnica do recolhimento da palha no campo de forma eficiente e viável.
Entretanto, o apelo das vantagens ecológicas, econômicas e estratégicas da cultura da cana e o uso dos seus derivados vêm ganhando espaço na sociedade nos últimos anos, e diversas iniciativas vem ganhando peso junto à população técnica e política do país. O debate sobre a política energética do país está se arrastando há anos, e vai ao ritmo das determinações da natureza. Se chove tudo vai bem, se seca vem o apagão.
Clarear esta discussão, ajustando os interesses das partes, é definir as regras do jogo, é o pontapé inicial para destravar o segundo ponto: como retirar a palha do campo. Já se passaram quase 20 anos de quando a Santal e Usina Santa Lydia, juntos com Prof. Caetano Rípoli da Esalq, fizeram os primeiros trabalhos científicos de recolhimento da palha no campo visando seu aproveitamento energético.
Após vários protótipos e levantamentos, o projeto, apesar de apontar alguns caminhos e possibilidades, esbarrou em dificuldades para se tornar realidade e estancou, assim como alguns outros que o sucederam. Hoje, baseado nos estudos recentes do professor Rípoli, três perspectivas de recolhimento da palha seriam possíveis: o enfardamento, o recolhimento a granel, e a colheita integral.
Resumidamente, a vantagem do enfardamento seria a maior densidade da carga transportada para usina, contra a necessidade de várias operações no campo - enleirar, enfardar, carregar e transportar. No recolhimento a granel, a vantagem fica na operação com uma recolhedora/picadora/lançadora, que numa única passada realizaria o serviço, entretanto o custo deste tipo de máquina, além da baixa densidade de carga transportada, elevam demais o custo final.
Por último, a colheita integral, que tem como vantagem a simplicidade da operação, pois apenas seriam desligados os sistemas de limpeza das colhedoras, reduzindo o consumo e aumentando a velocidade da colheita, mas perde-se na densidade de carga, além de ser necessário a construção de um sistema de limpeza à seco na recepção da usina.
Todas estas opções têm condições de evoluírem, inclusive transformando e criando novas idéias. Para cada sistema existem possibilidades de ganhos de eficiência, através de melhorias e desenvolvimento de máquinas específicas. Podemos afirmar que o setor tem condições de oferecer num curto espaço de tempo aproximadamente 95 bilhões de Mcal, considerando 65% da área mecanizável, somente com a disponibilização da palha de cana, ficando fora a própria expansão dos sistemas de queima de bagaço convencionais, e sem considerar aumento da área plantada.
O calcanhar de Aquiles continua sendo a falta de segurança do mercado de energia. Fica uma pergunta: quem vai investir? Quem quer gastar de novo em algo que acena e desaparece como nuvem? Perspectivas maravilhosas já não iludem mais, é necessário o país definir sua matriz energética e seus compromissos. Competência e criatividade para desenvolver soluções os empresários brasileiros já demonstraram ter, por várias vezes. Se o governo conseguir enxergar a avenida que se abre na utilização da palha dos canaviais, teremos praticamente 30% a mais de energia no negócio da cana, gerando divisas, empregos e riqueza para o país.