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Eduardo Vasconcellos Romão

Presidente da Associcana

Op-AA-44

Um estado de guerra

A associação à qual pertenço possui 1.120 produtores de cana e congrega 17 municípios. Em 2011, juntamo-nos aos produtores rurais e líderes regionais para fazer uma boa campanha, lançamo-nos candidatos em uma chapa na eleição da Associcana, em Jaú, e ganhamos. Achávamos que o desafio seria apenas fazer uma boa administração, na qual as prestações de serviços na informação de tecnologias agrícolas, benefícios em sua área social e boas políticas de desenvolvimento pudessem melhorar a capacitação do setor.

Afinal, era nosso negócio que estava em jogo. Mal assumimos, e as adversidades econômicas mundiais nos impactaram e foram deixando sequelas por onde passavam. Acrescentem-se a esse quadro os déficits climáticos nesse período e o fim das autorizações para a queima da palha de cana por determinação federal. Esses fatores nos obrigaram a buscar novos conhecimentos para adequar os pequenos e médios produtores que, em relação a outros, de outras regiões, estavam atrasados com a mecanização na nossa área.

Blocos de colheitas são as técnicas que a maioria das usinas estão aplicando, então preparamos e distribuímos a informação sobre essas técnicas para nossos associados, pois o processo de colheita mudou e todos tiveram que se adequar. As dificuldades econômicas foram se aprofundando.  Além do preço baixo da cana-de-açúcar, algumas unidades tiveram dificuldades nos pagamentos, e os estragos ocorreram: diminuição nos investimentos na produção, queda de produtividade e, por fim, o sucateamento das lavouras. Quem tinha alguma reserva financeira, empenhou-a. Que desafio.

Vieram, na sequência, as inciativas dos movimentos reivindicatórios a favor do etanol. A adesão impressionou. No movimento de Piracicaba, eram tantos os produtores de nossa região, que nos surpreendemos. A força da crise foi tão grande, que dizíamos que era como se tivessem nos atingido no meio de nossas cozinhas, pois foram mudanças na rotina familiar e, às vezes, alterando hábitos alimentares. De Piracicaba a Sertãozinho, o movimento chegou a Jaú.

Caprichamos: nós e as associações vizinhas de Lençóis Paulista, Barra Bonita e Bariri lideramos o manifesto. Tivemos a iniciativa de doar etanol aos motoristas no centro de Jaú; foi um sucesso, paramos o trânsito. Com muito empenho, mobilizamos, no total, milhares de indivíduos e ganhamos destaque em rede nacional. Quem diria que estávamos aprendendo a reivindicar por meio de mobilizações – uma novidade no nosso setor.

Na sequência, chegamos ao Congresso Nacional, em Brasília, com representação de quase todas as regionais do estado de São Paulo. Mas ir para lá com os ônibus foi um esforço, e os efeitos dessas mobilizações não foram práticos. As políticas públicas para o setor tardaram demais. Vieram, mas deixaram sequelas severas no campo, de difícil cicatrização. O tempo não tardou a piorar a situação das indústrias das regionais, que já se encontravam em dificuldades.

Mas o que fazer diante dessa situação, que mais parece um estado de guerra? Precisamos deflagrar o espírito de liderança que temos dentro de nós na abordagem com os nossos produtores. É pelos nossos familiares, pelo nosso negócio e pelo nosso patrimônio. Vale a pena ter como foco as 40 regionais agrícolas do estado de São Paulo, congregá-las numa ação comum e eficaz e nos orgulhar de nossa população irmanada, nas cidades e no campo, imbricada numa mesma economia.

As perdas levantadas pelas estatísticas do estado de São Paulo são severas: em 2011, o valor da produção dos principais produtos da agropecuária de nossa Regional Jaú foi próximo de R$ 2 bilhões. Estamos entre as principais regiões produtoras da agropecuária do estado, mas, em 2013 e 2014, o valor reduziu para, aproximadamente, R$ 1,5 bilhão, com viés de baixa. Perdemos próximo de R$ 500 milhões em cada ano. Como pode ser?

 Nessa leitura, isso deixou de ser um problema agrícola e passou a ser um problema regional, que afeta em cheio as prefeituras e seus orçamentos, além da qualidade de vida da população de modo geral, em razão da interdependência de todos os setores produtivos e os demais, que oferecem serviços de suporte, oficinas, lojas de maquinários, etc. Isso tem de ser dito aos quatro ventos. E, em clima de guerra, as ferramentas da comunicação terão que ser aplicadas. E quais serão as estratégias?

1. Comunicação interna: os nossos produtores precisam saber que as raízes de seu canavial vão muito além das divisas de suas terras; juntam-se às do vizinho e, por conseguinte, à região e ao estado. Imagine: são 14 mil produtores de cana. Se é difícil erradicar uma touceira de cana pela tenacidade de suas raízes, que dirá em todo o estado. Suas raízes vão do campo à cidade, que demandam por suas usinas, e estas, por uma metalurgia exuberante, que também demanda por empresas multinacionais para máquinas e equipamentos, transporte dessa matéria-prima em si, sua distribuição do produto manufaturado, empresas de insumos agro e industriais ? uma riqueza sem fim que as cidades têm de estar preparadas para receber e treinar a mão de obra local especializada para realizar os mais diversos processos: da colheita ao industrial, distribuição, etc.

2. Comunicação política: em nossa regional, são 14 prefeitos e mais de 100 vereadores, que, se inteirados dessas perdas (R$ 500 milhões anuais), aguçariam o olfato do ganho político/econômico para suas cidades.

3. Comunicação com a sociedade: Como quebrar paradigmas? A dona de casa que prepara todo dia as três refeições, para ela e os seus, precisa saber que, para esse alimento chegar seguro à sua mesa, na hora certa, com preço adequado e com bom volume de oferta, é necessária muita tecnologia e empenho de produtores rurais e demais elos das cadeias, que foram acionadas à força máxima. E suas escolhas políticas podem afetar todo esse empenho, se não fecharmos o ciclo.

Com certeza, se metade desse conceito for compreendido, e der certo, teremos êxito na empreitada. Hoje, nos melhores eventos, nunca contamos com mais de 30 prefeitos, embora, em São Paulo, existam 550 municípios canavieiros. Falta muita comunicação. No atacado, é difícil, mas, no varejo, cada um fazendo sua tarefa em sua regional, chegaremos ao lugar em que o estado de São Paulo deve continuar. No GAF 14 (Global Agribusiness Forum), o mundo identificou o Brasil como líder em tecnologia tropical, com potencial para abastecer o planeta com 40% dos alimentos, de fibras e de energia. Esse desafio não é só dos agricultores, e sim de toda a sociedade brasileira.