Presidente do Grupo João Lyra
Op-AA-04
Um mercado extremamente promissor, com grandes consumidores potenciais e, infelizmente, com imensas barreiras a serem transpostas. A realidade do mercado mundial do álcool é bem menos colorida que o quadro pintado pelo governo, desde que países como o Japão intensificaram o interesse pelo produto. Quem produz álcool sabe que o cenário é animador e que as perspectivas de expansão são grandes, mas no dia-a-dia das transações comerciais são as dificuldades que impedem o deslanchar desse segmento.
E o pior, esses entraves podem comprometer o futuro desse mercado, que, sem soluções ágeis do governo, corre o risco de ter sido apenas uma promessa. O álcool voltou na pauta de temas importantes há cerca de cinco anos. O Brasil já era exportador para destinos como o Japão, Coréia e Nigéria. Nessa fase, o câmbio, que passou a ser flutuante, representou um ganho real de competitividade. O país que exportava anualmente de 300-400 mil m³, fechou o ano passado com 2,3 milhões m³.
Esse resultado, somado à onda de otimismo que surgiu no ano passado com a troca de visitas entre empresários japoneses e representantes do governo brasileiro, foi o responsável pela criação da idéia de que o mercado mundial do álcool é nosso e ninguém o tira. Pode até ser, mas não será fácil mantê-lo. Esse cenário extremamente positivo já enfrenta alguns obstáculos.
A queda do dólar, começa a restringir mercados. Em alguns países, já não conseguimos mais alcançar mercado porque o álcool brasileiro perdeu competitividade. No Caribe, por exemplo, continuamos a vender, porém, de forma desacelerada, porque os nossos preços deixaram de ser atrativos. Um outro mercado que perdemos em 2005 foi o de venda direta para os EUA.
A produção local cresceu e os preços internos caíram. No ano passado, mesmo pagando impostos, conseguimos colocar o produto lá dentro. Nos últimos dois anos, a Índia abriu-se para a venda de álcool industrial, com a exportação de volumes consideráveis para a indústria química. Estávamos com olhos no programa da mistura de 5% à gasolina, mas o governo hibernou o projeto. O futuro desse mercado é incerto porque, este ano, deve haver uma recuperação da safra de cana-de-açúcar.
Diante desses dados, a perspectiva real que temos para o álcool tem como destino a UE e a Alca. Hoje, temos a Suécia como principal porto de entrada da Europa e este é o único país que defende a entrada do álcool brasileiro na Europa, mesmo sendo um produtor. Os outros defendem uma típica solução européia, criando subsídios para o álcool produzido internamente.
Isso é um sério obstáculo. O potencial da comunidade pós-Kyoto é realmente muito importante para o Brasil. A Alemanha e a Inglaterra possuem um potencial de consumo muitíssimo atrativo. Hoje, a CE permite uma mistura de aditivos não poluentes de até 5%, mas isso é uma permissão e não uma obrigação. Esse é um mercado difícil, que cria inúmeras barreiras técnicas, como por exemplo, quanto a graduação, que, para o anidro, no Brasil, é de 99,6%. A Alemanha está exigindo 99,9%.
Quem tem que correr atrás da adequação é o produtor, se quiser chegar no seu destino. Esse é um mercado que está se abrindo, mas só vai existir se passarmos por negociações bilaterais. A conquista depende mais do governo que dos produtores. Estamos fazendo nossa parte, celebrando contratos, realizando exportações pontuais, para fixar a nossa marca em pequenos nichos e investindo na produção.
Com relação ao Japão, há cinco anos fala-se nele e nada acontece, além de uma movimentação de japoneses para conhecer o Brasil. Há movimentos que apontam para o desenvolvimento de joint-ventures, com a construção de destilarias e sistemas integrados de logística. Mas isso tudo é lento e criterioso, porque o Japão não fará nada de forma apressada.
Enquanto não sentir real segurança de fornecimento, essas exportações de volumes monumentais, como se tem falado, não ocorrerão. O Japão só passará a ser importador de álcool, quando dispor de outras fontes. Hoje, existem dois mercados que não temos acesso por conta de barreiras alfandegárias: os EUA e Europa. A abertura só irá ocorrer através de negociações bilaterais.
Enquanto o governo não vir esses mercados como prioritários, não teremos esse nicho. Este ano, vamos reduzir as exportações em cerca de 300 mil m3. Venderemos, no máximo, 2 milhões. Isso já é um reflexo da redução de álcool para o Caribe. Vivemos hoje uma desaceleração. Os Ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento têm se esforçado muito para fazer o trabalho de abertura no Japão, mas as grandes negociações estão na Alca e na Europa. O cenário é promissor, mas há barreiras. Se não houver negociação, o álcool será apenas uma promessa. As coisas não acontecem na mesma desenvoltura que o produtor planeja e investe. Precisamos de decisões do governo.