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Stuart Maron

Diretor Comercial da Alcotra do Brasil

Op-AA-08

Viva o mercado livre!

Temos visto, nos últimos meses, discussões acaloradas sobre os movimentos mais recentes nos preços do álcool no Brasil. As mais diversas opiniões têm sido expressadas, e algumas possíveis ações do governo e também do setor privado têm sido estudadas intensamente. Deparamo-nos com as discussões sobre a necessidade da manutenção de estoque estratégico de álcool.

Imediatamente, algumas dúvidas vêm à nossa mente: Este estoque deverá ser suficiente para abastecer o mercado durante quanto tempo? Quais serão os critérios para determinar e controlar a quantidade necessária? Quem será o responsável em manter tais estoques? O governo federal ou o setor privado? As companhias privadas de distribuição de combustíveis são obrigadas a manter estoque estratégico de gasolina e diesel? Ou é a Petrobrás que mantém tais estoques?

O álcool combustível é um produto agroindustrial ou produto capaz de afetar a segurança nacional? Quem será o financiador para manutenção do estoque estratégico? Qual o melhor momento para criar o estoque estratégico? Por que o Governo Federal continua alardeando propaganda sobre o álcool combustível ao redor do mundo? Qual a lógica de incentivar os países na utilização do álcool combustível brasileiro e depois cercear a liberdade do produtor brasileiro para exportar?

Sabemos que estas são perguntas muito difíceis de serem respondidas, principalmente quando colocadas em conjunto. É inegável a profunda importância que a existência do estoque estratégico tem para o consumidor final de álcool combustível, tanto no Brasil, como no mercado internacional, e também tanto no âmbito de preços, como no de garantia de suprimento.

Mas, antes disso, é necessária a definição de qual é a verdadeira personalidade do álcool combustível no Brasil, decidindo se é um produto agroindustrial e, portanto, administrado e controlado livremente pelas usinas, sem interferências governamentais e dentro das regras de livre mercado, ou se é um produto visto exclusivamente como combustível e, portanto, submetido ao controle governamental, sob alegação de segurança nacional.

Se for um produto exclusivamente agroindustrial, como vem sendo historicamente tratado, principalmente porque está completamente suscetível às condições climáticas nas lavouras de cana, e o governo mantiver sua intenção de exigir a criação de estoque estratégico, o setor sucroalcooleiro brasileiro está suficientemente maduro para criar e administrar seus estoques, sem interferências externas.

Porém, não podemos esquecer que, exigindo que a criação e a manutenção dos estoques sejam feitas pelas usinas, o governo federal estará tirando das mesmas a liberdade de decidir quando, que quantidade e por quanto venderão seus estoques. Desta forma, o Governo Federal necessitará criar um mecanismo de financiamento de acesso amplo e irrestrito a todas as unidades produtoras, e sem custos financeiros, para que as usinas sejam ressarcidas de eventuais prejuízos de perda de oportunidade comercial na venda dos seus estoques, e possam, desta forma, cumprir a exigência de manter tais estoques, sem terem que arcar com os custos disto.

Por outro lado, se for considerado um produto exclusivamente combustível, tais estoques deverão ser criados e mantidos exclusivamente pelo Governo Federal, especialmente se for respeitada a Lei 8.176, de 1991, que determina este mesmo Governo Federal como responsável único na criação e manutenção de estoque estratégico de combustível.

Em tese, o produto deve ser adquirido a preço de mercado e transferido para armazenamento nos tanques da Petrobrás, permitindo, desta forma, que as usinas possam utilizar sua tancagem, da forma que necessitarem. Este estoque deverá ser utilizado, quando os preços atingirem o seu extremo mais alto ou quando houver algum risco de desabastecimento para o mercado consumidor. Contudo, o ideal é que o Governo Federal adquira o produto das usinas em tempos de depressão de preço e excesso de estoque. Isso permitirá que o Governo detenha instrumentos de controle de mercado, sem ter que entrar em conflito com o setor produtivo.

Como o Governo efetuará a aquisição dos estoques, nos momentos de preços baixos, e venderá nos momentos de preços altos, terá um considerável lucro comercial na operação, cobrindo, desta forma, seus custos financeiros e operacionais. Tal lucro poderá, inclusive, contribuir com a redução do déficit nas contas do governo,  que poderá divulgar que fez uma operação lucrativa para os cofres da União, e ainda ficará com uma imagem muito positiva perante a opinião pública nacional.

Contudo, nos causa estranheza que o assunto da criação de estoque estratégico só seja lembrado, principalmente pelo Governo Federal, quando a disponibilidade de produto é reduzida e, conseqüentemente, os preços disparam. Neste momento, o Governo interpreta a situação como desconfortável e politicamente impopular, e então tem a atitude de tentar pressionar o setor a ajustes de preço fora do movimento natural de oferta de demanda do mercado.

Causa também estranheza para toda a população brasileira que nenhuma distribuidora privada e nem o Governo Federal lembraram-se de formar estoques estratégicos, quando os preços estavam extremamente deprimidos e as usinas, com excesso de estoque. Naquele momento, os preços de álcool combustível para o consumidor final estavam ao redor R$ 0,60 (sessenta centavos) por litro e U$ 200,00 (duzentos dólares) por metro cúbico para exportação, e ninguém teve a lembrança de perguntar se as usinas estavam enfrentando algum aperto financeiro ou alguma dificuldade para encontrar tancagem disponível para o armazenamento do seu estoque.

Não é demais lembrar que uma das primeiras leis de mercado é que excesso de oferta deprime os preços. Aquele sim era o momento mais correto para criação de estoque estratégico, pois como existia um excesso de oferta, a criação do estoque não afetaria os preços ao consumidor final. Seria muito bem vista pelo setor produtivo, pois ajudaria no escoamento da produção, e também pela opinião pública, pois tal decisão seria tomada no momento de preços muito baixos, reduzindo a quantidade de recursos financeiros necessários, para a formação do estoque estratégico.

Esta sim teria sido uma tomada de decisão estratégica e profissional! Não entendemos porquê o mercado está sob risco de uma atitude ilógica, de ser obrigado a criar o estoque estratégico no momento que o preço atinge seu patamar mais alto ? Esta medida potencializará ainda mais a alta dos preços, penalizando drasticamente, e somente, o consumidor final.

Temos visto, nos últimos anos, uma verdadeira (e louvável) cruzada do Governo, no sentido de incentivar o uso do álcool combustível ao redor do mundo. Uma das perguntas que ouvimos freqüentemente, feita pelos consumidores, nos mais diversos países, é exatamente como as flutuações de preço e de disponibilidade de estoque serão enfrentadas pelo mercado internacional, e qual a solução que o Brasil oferecerá para estas questões, já que tem insistido tanto para que o álcool seja adotado como combustível ao redor do mundo.

Portanto, vemos claramente a necessidade da existência de estoque estratégico para regular também o mercado internacional. Por outro lado, não obstante o Governo continuar incentivando os mais diversos países ao redor do mundo a consumirem nosso álcool combustível, tem atitude, aqui no Brasil, de impor medidas e critérios restritivos à exportação de álcool.

Estes, ainda não foram apresentados de forma clara ao mercado, apesar de já estarem sendo amplamente adotados, dificultando enormemente o cumprimento dos contratos de exportação e compromissos assumidos pelas usinas brasileiras, que continuam operando com base nos preceitos de livre mercado, amplamente pregados pelo Governo Federal, até há pouco tempo atrás.

Vale ressaltar que esta atitude do Governo poderá lhe impor descrédito perante a comunidade comercial internacional, que passa a olhar para o Brasil com alguma desconfiança, e que não está entendendo qual a lógica do Governo Federal em incentivar o uso do álcool combustível brasileiro mundo afora e, contraditoriamente, limitar suas exportações.

Os compradores de álcool, principalmente do mercado externo, estão na expectativa de que o Governo use de bom senso, e postergue a criação do estoque estratégico para um momento mais adequado, e não provocando, agora, uma disparada de preços, que seria desastrosa para os planos de consolidar o Brasil como o grande supridor mundial de combustível renovável.

Os consumidores de álcool no mercado externo não têm o interesse vil de adquirir álcool do Brasil, com os preços nos limites de baixa, opção que não é construtiva para um mercado duradouro, já que fragiliza muito a saúde financeira das usinas. Mas também não têm interesse em adquirir produto no limite máximo de preço, pois isso reduz muito a demanda dos consumidores.

Chegamos, então, à conclusão de que o estoque estratégico é salutar para o mercado, pois regulará os preços do produto, evitando distorções exageradas de preço, desde que tais estoques sejam criados no momento adequado. Aproximadamente 90 unidades estão em construção ou em projeto no Brasil, para entrarem em operação nos próximos 5 anos.

Esta é a prova principal de que o empresariado brasileiro está apostando fortemente no crescimento desse setor, acreditando na manutenção do livre mercado e comprometendo-se com o atendimento, principalmente, do consumidor do mercado doméstico, que com  o advento dos veículos flexíveis, passou a ter um equilíbrio de forças entre produtor e consumidor. O grande beneficiado desta nova realidade é, sem dúvida, o consumidor final.

O Brasil está no momento crucial de assumir, definitivamente, postura e atitude bastante profissional, madura, estável e duradoura, perante o mercado internacional. Devemos nos mirar, principalmente, nos países mais desenvolvidos do primeiro mundo, que criam regras e políticas claras e que perduram durante muitos anos, permitindo que empresários possam ter um planejamento de longo prazo, para suas empresas.

A atitude do Brasil de respeitar os movimentos de preço e, principalmente, os contratos de exportação firmados pelas empresas e, além disso, de ter lógica nas decisões a serem tomadas, permitirá que o setor sucroalcooleiro brasileiro consolide-se como o maior e mais importante player do mercado internacional de combustível de fonte renovável.

Não podemos esquecer que o setor sucroalcooleiro brasileiro vive atualmente seu melhor momento dos últimos 20 anos (talvez de toda sua história!), e não é justo que seja agora tomado por vilão. Justamente agora, que a Petrobrás obteve a grande vitória da auto-suficiência em petróleo, e destaque-se: ajudada, em muito, pela participação do álcool combustível na matriz energética nacional, que reduz significativamente nossa dependência de combustíveis fósseis, e coloca-nos na vanguarda mundial na utilização de combustível de fonte renovável e também no cumprimento das metas do Protocolo de Kyoto.

O setor sucroalcooleiro do Brasil é, como todos os outros setores e atividades privadas deste país, capitalista e democrático, focado em resultados e lucros, e com o objetivo primordial de rentabilidade do capital investido pelos empresários nas suas empresas. Se não for assim, deixará de ser um setor privado, deixará de existir o livre mercado e deixará de existir o empresariado brasileiro que crê no futuro e aposta no Brasil. Viva o mercado livre!