Diretor de Elétrica, Automação, Geração de Energia e Tecnologia da Odebrecht Agroindustrial
Não é fácil escrever sobre o nosso setor diante do cenário que estamos tendo que administrar. Buscarei focar na prática da minha vivência diária a estrutura para opinar sobre o aumento da eficiência, da confiabilidade operacional e da redução de custos nos processos industriais do sistema sucroenergético – questões tão particulares à realidade de cada unidade produtora.
O setor sucroalcooleiro sempre teve um importante papel na economia brasileira, e, nos últimos 10 anos, os desafios foram aumentados sobremaneira, notadamente nas questões técnicas e financeira. Antes desse tempo, o setor experimentou um representativo desenvolvimento tecnológico nas áreas agrícolas e industriais, mas essa última década tem exigido o uso de toda a criatividade que seja possível dispor. Iniciando pelos nossos canaviais – área completamente dependente das condições climáticas, hoje já não mais tão definidas e regulares como antigamente –, passou-se a administrar um cenário muito diferente, com a proibição das queimadas, forçando a adaptação ao plantio e corte mecanizados, aumentando o custo do corte, do carregamento e do transporte.
Quis começar minha exposição pela área agrícola para chegar na qualidade da cana que estamos recebendo em nossas indústrias. Temos tido alto teor de impurezas vegetal e mineral, o que nos obrigou a buscar o desenvolvimento de processos e equipamentos que melhor trabalhem sob essa nova característica da biomassa. Detalhes cada vez menores passaram a influenciar a redução ou o aumento da eficiência industrial, um dos quesitos mais importantes para diluição dos custos envolvidos na produção do açúcar, do etanol e da energia elétrica.
Felizmente, a tecnologia aplicada nos equipamentos agroindustriais atuais permite buscarmos essa performance e, consequentemente, a máxima eficiência. Porém sempre teremos pela frente a necessidade de reduzir custos e aumentar a eficiência, para que possamos alavancar recursos para a aplicação em novos projetos – quer através dos investidores, quer de financiamentos. Cada projeto tem suas características individuais, mas três quesitos são direcionais: o local do empreendimento, a equipe envolvida e a época em que irá acontecer.
Não existe uma cartilha que nos defina os certos e os errados. A cada projeto, teremos que inventar uma nova roda. Nosso grupo fez 7 greenfields no Brasil, entre 2007 e 2010, e 1 em Angola, nos quais utilizamos caldeiras de grelha em 67 bar, 520 °C, com um consumo de vapor no processo de 420 kg/t de cana, turbogeradores de contrapressão e condensação, moenda eletrificada (acionamento individual de rolos), sistema de limpeza a seco nas mesas e nas moegas, trocadores regenerativos, em cinco delas com difusor.
Nesta safra 2015/16, demos a partida na primeira fase de um retrofit feito em uma outra unidade no Centro-Oeste. Saímos de uma moagem de 2 milhões de toneladas de cana para 3,5 milhões. Na segunda fase, prevemos alcançar 4,5 milhões e, na terceira, a meta de 6 milhões de toneladas de cana/ano. O conceito foi maximizar nossa produção, com foco em energia elétrica e etanol, mantendo-se a produção de açúcar.
Quando estudamos esse projeto em 2012, buscávamos construir a “usina do futuro”. Muito se falava dela, mas ninguém sabia como, de fato, ela seria. Após um ano de intensas discussões em um sem-número de reuniões, com equipe própria e fornecedores, chegamos ao que imaginamos que pudesse ser esse novo modelo de usina.
Recepção de cana somente em moegas para eliminarmos as esteiras metálicas, reduzindo, assim, custos de instalação e manutenção; sistema de limpeza a seco, com ventilação entre esteiras de lona, para alcançar uma maior eficiência; preparo único somente com desfibrador vertical, reduzindo, assim, também, custos de manutenção; moenda de 104” – a maior do mundo –, eletrificada, com acionamento individual por rolo, para estabelecer um melhor reaproveitamento de camisas, e consequente redução de custo de manutenção – isso em razão da baixa eficiência de tempo agroindustrial da região – 76% –, para consolidar uma alta moagem no período em que a chuva nos permite (1.400 a 1.500 t/cana/h), para cumprirmos a meta de 6 milhões de toneladas de cana na safra; caldeira de leito fluidizado em 105 bar, 545 °C – atendendo às exigências ambientais e, ao mesmo tempo, trazendo maior estabilidade operacional e maior eficiência, ciclo regenerativo aumentando a eficiência da térmica; turbinas de contrapressão para atendimento do vapor de processo e de condensação para maior eficiência na exportação de energia elétrica; saída do vapor da turbina por cima, baixando, assim, a altura da Central de Geração de Energia – reduzindo custo de implantação.
Utilização intensiva de trocadores regenerativos no processo – baixando o consumo de vapor para 380 kg/t/cana; decantador ultrarrápido – para um menor tempo de retenção do caldo. Automação de aproximadamente 80% da planta industrial – utilizando-se SDCD, que já possui redundância de CPU e outras vantagens em relação ao PLC. Com essas novas tecnologias – todas implantadas –, conseguimos aumentar a sobra de biomassa e operar com a térmica durante 11 meses, elevando significativamente a exportação de energia elétrica, sem a necessidade de compra de combustível (biomassa) adicional.
A automação merece destaque. Esse é um dos recursos mais importante para conseguirmos altas eficiências. Temos que aproveitar o enorme desenvolvimento que tivemos nos últimos anos nas tecnologias que envolvem microprocessadores, redes de comunicação, inteligência artificial, máquinas de controle numérico, instrumentos de medição e controle, etc.
Com a automação, garantimos: aumento da segurança, redução dos custos operacionais, melhoria das condições de operação, simplificação das instalações, aumento dos níveis de controle, aumento dos níveis de acompanhamento, dentre outras vantagens. Entretanto, independentemente das múltiplas razões em favor da automatização, desvantagens também existem e tem que ser levadas em consideração.
Não diferente dos demais equipamentos, a automação também exige uma boa análise para escolha da rede, do hardware, do software, dos instrumentos de medição e controle, dos fabricantes e montadores, dentre outros cuidados, pois o cuidado na implantação, seguindo as boas práticas de instalações e manuais dos fabricantes, é fundamental para um bom funcionamento de todo o complexo.
Um quesito importante a considerar nas avaliações nessa etapa é a região geográfica nas quais serão utilizados esses equipamentos, pois será fator importante e talvez até decisivo diante das dificuldades de se contratar e de se reter profissionais com qualificações diferenciadas para intervir no sistema escolhido. Em função da importância, uma questão merece destaque. A palha merece ser mais bem explorada, seja para geração de energia, seja para a produção do etanol 2G, ou ainda outra aplicação.
Algumas empresas vêm trabalhando esse tema. Evoluímos bastante nos últimos anos, mas acredito que temos ainda muito a evoluir, pois, juntamente com a cana e a palha, trazemos muita impureza mineral para dentro da indústria. A terra tem que ficar no campo. Devido à colheita mecanizada, hoje, é imprescindível a implantação de um sistema de limpeza a seco nas plantas industriais. Hoje, depois dessa vivência, afirmo que, em resumo, a “usina do futuro” nada mais é do que a utilização de equipamentos de alta performance e confiabilidade que se encontram no mercado para aquele momento do projeto.
Sabemos que a evolução não para; a cada dia, algo novo está sendo lançado no mercado. Temos que estar atentos e replanejar tantas vezes quantas o tempo ainda nos permitir, pois muitas das aquisições acontecem em um ano e serão implementadas um ou dois anos depois. O planejamento tem papel fundamental para um bom projeto, seja ele um greenfield ou um retrofit de uma planta existente.
Temos disponíveis equipamentos no estado da arte para implantação de projetos que busquem o aumento da eficiência e a redução de custos nos processos industriais em vários segmentos do processo industrial, mas destacaria como de maior resultado o uso de somente moegas para tombamento de cana; de esteiras de lona para transporte de cana; do preparo único, somente desfibrador; de apenas uma linha de extração do caldo, sejam moendas ou difusor; de rolo de alta drenagem “Lotus” – testado no passado e não aprovado, mas hoje está apresentando excelente performance; de caldeiras de 105 bar, 545 °C de leito fluidizado; de precipitador eletrostático, com a caldeira de leito fluidizado passando a ter um EVTE positivo se comparado com lavador de gases; de ciclo regenerativo – que tem que ser estudado juntamente com os fornecedores de caldeiras e turbinas; de decantador ultrarrápido; de trocadores evaporativos de alta performance; de trocadores regenerativos; de condensador evaporativo para a turbina de condensação; de automação agrícola e industrial, avaliar a mais adequada para região onde se encontra o empreendimento; e de secagem de vinhaça.
Considero como fatores extremamente importantes para o sucesso de qualquer projeto:
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o planejamento contínuo até a última fase de decisão;
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investir tempo na formação e na gestão das equipes, buscando montar uma equipe de trabalho que possua qualificação adequada para as mudanças, quer na fase de projetos, quer na implantação, quer na de operação, procurando mantê-la em contínuo treinamento;
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a busca de parceiros que tenham a mesma visão do empreendedor e ofereçam equipamentos de alta eficiência e confiabilidade, que se tenham atenção para o pós-venda – é nessa etapa que você vai, de fato, confirmar se sua escolha foi boa ou não;
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buscar manter baixo turnover e absenteísmo, procurando reter pessoas, sempre desafiando-as e motivando-as;
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ficar atento a melhorias continuadamente;
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ter a segurança como valor;
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e, para completar, exercer real e profundo respeito ao meio ambiente.
Não tenho a pretensão de achar que a minha opinião seja adequada para todo e qualquer projeto. As escolhas têm confirmado terem sido boas para esse projeto, nesse local, neste momento, com essas condições. Um outro projeto exigirá que tudo seja, novamente, questionado. Sempre estaremos buscando a melhor “usina do futuro”.