Gestor do BDF - Bioenergy Development Fund
Op-AA-11
O Brasil teve, ao longo da sua história, alguns ativos considerados globais pelos investidores. Todos tiveram em comum: valor reconhecido mundialmente e percepção pelo mercado de uma demanda futura maior que a capacidade de produção. Esses ativos (pau-brasil, café, ouro...) são vistos pelos investidores internacionais como tão valiosos e estratégicos, que se tornam globais, e transcendem às fronteiras e aos cálculos de riscos, ligados à sua localização.
Assim, um poço de petróleo tem valor reconhecido mundialmente, pouco interessa se está localizado nos EUA ou na África. O álcool é um sério candidato a se tornar um ativo global. A maioria dos investidores já o tem como tal. Porém, para ratificar essa promoção e gerar as riquezas e benefícios prometidos, enfrentará alguns desafios.
O ano de 2006 foi importante, pois, além da manutenção dos altos preços do petróleo, ele deverá ficar na memória como o ano da conscientização do mundo sobre as mudanças climáticas, ligadas às emissões de CO2. Esse ponto é fundamental para o álcool, apesar de ser usado como combustível há mais de 40 anos, ele sempre foi considerado uma alternativa cara e o Proálcool visto como uma experiência brasileira, localizada, sem impacto global. Pas sérieux, diria De Gaulle.
Agora, as coisas estão mudando. Primeiro, o álcool brasileiro tornou-se competitivo e uma alternativa à gasolina, como aditivo ou substituto. Segundo, os benefícios ligados à redução das emissões de CO2 são agora reconhecidos mundialmente. Deixou de ser uma solução puramente brasileira. Virou Sérieux!
Se o uso do álcool como aditivo à gasolina difunde-se por razões ecológicas, a matriz energética mundial resultante irá garantir, aos produtores, um mercado cativo gigantesco. Porém, o álcool não é uma commodity agrícola como as outras, e disso resulta a maioria dos problemas a serem enfrentados. O álcool, como todos os combustíveis, mexe com a matriz energética dos países, e, portanto, tem um aspecto estratégico e de segurança nacional.
Por isso, sua introdução na matriz energética obriga-nos a responder a três perguntas básicas: quais são as fontes de suprimento nacionais, quais são os fornecedores estrangeiros potenciais, e até que ponto esses fornecedores são confiáveis? Lidar com fontes de energia renováveis, fabricadas a partir de biomassa, é muito diferente de lidar com energias fósseis.
Os fluxos de produção dependem de fatores exógenos não controláveis, como a chuva e seguem os ciclos de produção das safras. Os problemas ligados à segurança do abastecimento estão hoje no centro do debate sobre biocombustíveis e, com ele, o papel dos investidores “globais”. Para tentar responder à primeira pergunta, estamos assistindo à criação de indústrias nacionais de produção, usando diversas fontes de matéria-prima.
O fato de algumas terem um custo de produção bem acima do aferido no Brasil é irrelevante, pois os países interessados no álcool precisam ter, antes de qualquer coisa, o controle das fontes estratégicas de produção. Eles estão prontos a pagar por isso, muitas vezes, através de subsídios. Uma vez assegurada a principal fonte de abastecimento, podem-se criar mecanismos de importação e exportação, que resultam na criação de um mercado internacional residual.
E, com isso, a criação do mercado livre, a consagração como uma Commodity Global. O Brasil tem tudo para ser a estrela desse novo mercado, se puder mostrar para o mundo que é capaz de produzir e entregar grandes volumes, por muito tempo. Apesar de ser um ator evidente desse novo mercado, a capacidade do Brasil transformar a cana em ouro no futuro dependerá de sua habilidade em promover mudanças.
Algumas estão nas mãos do governo, outras dependem da iniciativa privada, outras dos esforços conjuntos dos dois. Outras ainda são culturais. Porém, essas mudanças são obrigatórias para o Brasil maximizar o seu enorme potencial. O trem já está andando e os mercados estão acelerando o processo. A questão do álcool não é mais só brasileira, virou global, assim como os problemas e as soluções.
O país atrai os investidores pelo tamanho e condições climáticas, assim como pela história de sucesso na produção de álcool. Mas, isso não basta. Ainda falta um quadro legislativo e fiscal claro, assim como empresas grandes, consolidadas e transparentes, capazes de receber e gerir bilhões de reais e cumprir metas globais.
Mas, a maior revolução do setor está acontecendo agora, dentro das próprias empresas. Num mercado em pleno crescimento, e que já começou sua consolidação, os empresários são os guardiões dos interesses e dos valores dos investidores. Espera-se deles o bom uso do volume de dinheiro que está entrando no setor, a fim de se conseguir o objetivo maior: virar global e ocupar o centro do mapa.
O Brasil é um país volátil. Os atores globais querem investir e trabalhar com empresas que são capazes de atingir metas de crescimento, seguindo padrões internacionais, e lidar com as especificidades locais. Alguns empresários terão que promover uma transformação (drástica em alguns casos): passar de um modelo de negócios familiar e local, para um padrão internacional, que depende menos do poder de algumas pessoas.
Trazer perenidade à empresa é o sonho da maioria dos empresários, porém pode se revelar difícil manter a identidade e o dinamismo e ao mesmo tempo se adaptar às novas regras do jogo. O mercado financeiro é impessoal, não se negocia com ele. Ele julga. Às vezes com atraso, mas sempre acaba julgando. Por isso, se preparar bem para essa nova fase corporativa será o próximo desafio dos empresários do setor.
Abrindo-se ao mundo, as empresas brasileiras obterão massa crítica para investir em produção e logística, bem como oferecer aos parceiros comerciais as garantias de volume e de performance que hoje inexistem. Resolvendo estes problemas, tornar-se-ão atores globais fundamentais e capazes de criar e distribuir renda.