Gerente Nacional da Divisão Cana da Nefatim Brasil
Op-AA-09
A expansão da indústria alcooleira, face à grande demanda mundial, é notória, necessária e evidente. Entretanto, a forma extensionista em que se dá esta expansão, buscando, sobremaneira, o avanço da cana-de-açúcar em novas regiões, trará reflexos ambientais, estratégicos, econômicos e sociais, e por este razão, merece reflexões de caráter conceitual.
Ambientalmente falando, os impactos do aumento territorial da área cultivada com cana-de-açúcar, além da liberação ambiental para a instalação de novas unidades agroindustriais, são complicadores, podendo, até mesmo, tornarem-se limitadores a este modelo de expansão, seja pela burocracia ou outros motivos que, muitas vezes, desestimulam o empreendedorismo.
Que os aspectos estratégicos para o país, na capacidade de produção de álcool/energia para atender a demanda local e global são evidentes e que os impactos econômicos e sociais serão sobremaneira importantíssimos para o agronegócio nacional, não restam dúvidas. Porém, existem opiniões divergentes, de como se dará a expansão necessária, e aqui chamaremos a atenção dos leitores, quanto ao aspecto conceitual da exploração do sistema agroindustrial (SAG) da cana-de-açúcar.
Os avanços observados no setor nos últimos 30 anos, no que diz respeito à produtividade/hectare, e extração de álcool por tonelada de cana e por hectare plantado, são significativos, porém, ainda aquém do potencial produtivo da planta de cana-de-açúcar. Toda a pesquisa genética direcionou-se a desenvolver variedades de cana resistentes à seca e rústica, limitando assim, o potencial produtivo da planta. Onde queremos chegar?
O setor desenvolveu-se sem sequer avaliar e observar as vantagens competitivas que o cultivo tecnificado com irrigação de cana-de-açúcar proporcionam, tais como:
a. Aumento de produtividade e longevidade do canavial;
b. Menor área cultivada, reduzindo significativamente os custos relacionados a grandes extensões de terra, como os de aquisição ou arrendamento de terras e a imobilização em máquinas e equipamentos agrícolas;
c. Redução dos custos de administração;
d. Redução no raio médio de transporte da matéria-prima;
e. Redução dos riscos climáticos; da variabilidade dos tipos de solos, que impactam, significativamente, na média geral de produtividade e eficiência da usina;
f. Permite o cultivo tecnificado, explorando maior potencial produtivo;
g. Permite o plantio em qualquer época do ano; dentre outros.
Estima-se que, atualmente, o setor conviva com ociosidade industrial de 15%, provocados essencialmente pela falta de matéria-prima. Nota-se, ainda, acirrada competição por terras ou pela cana-de-açúcar. Ao invés de expansão, por que não organizar e otimizar o parque industrial atual? Novas tendências indicam a necessidade de se otimizar ainda mais, aumentando o período de safra nas principais regiões canavieiras, com o surgimento de variedades super precoces, permitindo passar dos atuais 180, para 210 dias, e ainda a adoção de tecnologias de cultivo, aumentando a eficiência agrícola.
Este feito permite-nos otimizar em 30% o parque industrial instalado. Isto significa ampliar a capacidade de moagem em 130 milhões de toneladas de cana, equivalentes a 10,5 bilhões de litros de álcool, 70% a mais do que a produção atual. Este cenário merece ser melhor estudado e entendido até mesmo antes de se instalar novas unidades industriais, aplicando todas as tecnologias de produção disponíveis.
O cultivo tecnificado de cana-de-açúcar dar-se-ia de forma a adotar tecnologias de irrigação e fertirrigação, utilizadas em grande escala na cana, em inúmeros países no mundo. Das tecnologias disponíveis, na que mais se observa alta viabilidade econômica e tendência de avanço no mundo todo é a fertirrigação, por gotejamento subterrâneo, a qual consiste em utilizar a tecnologia de gotejamento, que, em síntese, é fornecer água e fertilizantes gota a gota, alem de defensivos agrícolas diretamente no sistema radicular da cana, durante todo o ciclo.
Esta tecnologia é utilizada há mais de 40 anos em diversos cultivos, em mais de 125 países e em mais de 8 milhões de hectares. Permite maximização de produção, com menor consumo de água e energia, que outros sistemas de irrigação. A tecnologia permite aumentar em 100% ou mais, a capacidade de produção de biomassa.
O uso da fertirrigação por gotejamento, comprovadamente no mundo e no Brasil, proporciona obtenção de produtividades agrícolas médias de 120-145 toneladas/hectare, ao longo de 12-14 colheitas ou mais, dependendo das condições e manejo adotados. A capacidade média de produção de biomassa sairia dos atuais 5,8 ton/hectare/mês = 70 ton de cana/hectare/ano, para 12-16 ton/hectare/mês = 145-200 ton/hectare/ano. Este aumento é muito expressivo, quando comparado aos atuais índices de 68-70 ton/hectare médios, por 5-6 colheitas, observados no país. Possibilita-se ainda reduzir os custos de produção por tonelada de cana, na ordem de 18-30%.
Em alguns casos, é possível obter retorno do capital investido em apenas 1-3 safras, dependendo das condições analisadas. Ainda quanto aos aspectos de viabilidade, salienta-se que, no Brasil, já se demonstra que os menores custos de produção de tonelada de cana e de ATRs/hectare cultivado, dá-se em usina que adotam o cultivo 100% irrigado.
Sairíamos dos atuais 6.800 litros de álcool/hectare no sequeiro, para algo próximo de 13.000 litros de álcool/hectare cultivado irrigados. Trata-se de mudança significativa no cenário atual de expansão do setor sucroalcooleiro nacional, mostrando e forçando mudanças de conceitos na exploração agrícola.
Estas mudanças, com adoção de tecnologias agrícolas, vêm ao encontro das tendências da evolução da humanidade, dentro de um modelo de sustentabilidade, atendendo às expectativas de crescimento econômico, evolução natural e aumento de competitividade, otimizando os processos produtivos, com reduzidos impactos ambientais. Podemos expandir em área cultivada ou, antes disto, aumentar nossa eficiência agroindustrial. Será questão de atitude. Cabe aí uma profunda reflexão.