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Evaristo Eduardo de Miranda

Chefe-geral da Embrapa Territorial

Op-AA-67

Dimensão territorial e tendências da cana-de-açúcar entre 2009 e 2020
Coautoria: Paulo Roberto Rodrigues Martinho, 
analista de geoprocessamento da Embrapa Territorial

Entre 2009 e 2019, a cana-de-açúcar apresentou expansão significativa e uma dinâmica territorial desconhecida por muitos atores do agronegócio. Mas o crescimento da área cultivada contrastou com a queda na produtividade, enquanto os outros cultivos apresentaram ganhos consistentes de produtividade. Que estados ganharam importância em área e produção? Qual a dinâmica da cana-de-açúcar no Nordeste e no Sudeste? A tendência é de concentração ou não das áreas de produção canavieira? A partir de dados do IBGE, foi possível identificar e quantificar esses fenômenos territoriais, responder a essas perguntas e indicar as tendências no uso e na ocupação das terras com a cana-de-açúcar no Brasil.
 
Tendências territoriais no Brasil: A área líquida cultivada em cana-de-açúcar cresce há décadas no Brasil. Considera-se a área líquida, pois decréscimos das superfícies cultivadas foram compensados e até ultrapassados pela expansão em outras localidades. Entre 2009 e 2019, a área plantada com cana-de-açúcar no Brasil passou de 8,85 milhões de hectares para 10,11 milhões de hectares: um crescimento territorial líquido de 1.263.580 milhão de hectares ou de 14,3% em 10 anos. A cana-de-açúcar ocupa, hoje, 1,2% do território nacional.

A dinâmica territorial da cana-de-açúcar alterou o uso das terras em 2.242.164 ha entre 2009 e 2019. Nesse enorme território, 22% deixaram de ser cultivados com cana-de-açúcar, cedendo espaço para cultivos anuais e pastagens. Nos outros 78%, ela substituiu diversos uso das terras, desde lavouras temporárias e permanentes até pastagens, conforme Tabela 1. Os aumentos e declínios das áreas de cana-de-açúcar apontam para uma relevante dinâmica territorial do cultivo. O centro de gravidade das áreas cultivadas e da produção deslocou-se progressivamente para o Centro-Oeste. Em 2019, Goiás já representava 10% da produção nacional, com produtividade média de 79,5 t/ha, a maior entre os 10 principais estados produtores, conforme Tabela 1. 
 
Em São Paulo, a área de cana-de-açúcar teve uma expansão de mais 563.000 ha no período. Foi o valor mais expressivo no País, em termos absolutos. Mas, se a área paulista com cana-de-açúcar representava 56,3% do existente no Brasil em 2009, ela passou a representar 54,8% do total nacional em 2019, mesmo com o maior crescimento em termos absolutos. O crescimento relativo da área da cana em outros estados foi bem maior. Em 11 estados da federação, houve aumento da área plantada num total de 1.752.872 ha, ou 19,8% com relação ao existente em 2009, conforme Tabela 2.

Em termos absolutos, após São Paulo, o maior crescimento ocorreu no Mato Grosso do Sul: 441.760 ha. Um salto de 155% em 10 anos. A área de cana-de-açúcar no Mato Grosso do Sul mais do que dobrou no período. Em Goiás, o crescimento foi da mesma ordem, cerca de 422.791 ha, ou 81%. Nesse conjunto dos estados com aumento na área plantada, Minas Gerais também apresentou um crescimento expressivo de 228.423 ha, ou 31,9%.
 
Em 16 estados, houve um recuo na área plantada, num total de 489.292 ha, ou 5,5% com relação ao existente em 2009, conforme demonstra a Tabela 2. Com exceção do Maranhão, isso ocorreu em todos os estados do Nordeste. Os números de retração mais significativos ocorreram em Alagoas: 129.000 ha (29,8%) e, em Pernambuco, 124.000 ha (35,2%), uma redução de mais de 1/3 da área plantada em 10 anos. Outro recuo da área cultivada ocorreu no Rio de Janeiro: 81.618 ha, ou 60,4%, retrato da crise vivida pelo setor no norte fluminense, conforme Tabela 2. 
 
Essas mudanças territoriais implicaram mudanças na liderança dos estados na produção canavieira. Em 2009, os cinco principais estados produtores eram São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Goiás e Alagoas. Em 2019, logo após a liderança paulista, está o estado de Goiás, seguido por Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Paraná. As áreas de produção cresceram em direção do Centro-Oeste e se concentraram nos estados líderes. Em 2009, os cinco estados líderes reuniam 81,9% da área cultivada no Brasil. Em 2019, eles representam 86,6% do total cultivado.

A figura em destaque ilustra essa dinâmica territorial de expansão, estabilidade e contração das áreas cultivadas com cana-de-açúcar nos 27 estados da federação entre 2009 e 2019. A produção da cana-de-açúcar não acompanhou o crescimento da área entre 2009 e 2019. O País passou de uma produção total de 691.606.147 toneladas em 2009 para 752.895.389 toneladas em 2019. A produtividade média caiu, no período, de 78,2 t/ha para 74,5 t/ha, na contramão dos outros cultivos em que a produtividade cresceu de forma sustentável. Entre outros fatores, a crise do etanol, ligada à política de preços dos combustíveis, conduziu a uma crise financeira e de descapitalização. Isso explica, em parte, a dificuldade da maioria das fazendas e usinas em aplicar a tecnologia disponível, renovar canaviais e adotar inovações.
 
Tendências territoriais nos estados: Quatro estados respondiam, em 2019, por 83,2% da produção nacional de cana-de-açúcar: São Paulo (56,5%), Goiás (10%), Minas Gerais (9,7%) e Mato Grosso do Sul (6,9%). A tendência à concentração territorial do cultivo é clara. Em 2009, a cana-de-açúcar era plantada em 59 microrregiões do estado de São Paulo. Em 2019, esse número caiu para 55. Em Goiás, houve um movimento análogo de concentração territorial. De 18 microrregiões com cana-de-açúcar em 2009, o estado passou para 16 em 2019. Minas Gerais e Mato Grosso do Sul mantiveram o mesmo número de microrregiões com cana-de-açúcar entre 2009 e 2019: 66 e 11, respectivamente. No Brasil, 496 microrregiões praticavam o cultivo da cana-de-açúcar em 2009. Em 2019, esse número havia caído para 474. Desse total, apenas 45 microrregiões respondem por cerca de 75% da área plantada em cana-de-açúcar e 43 microrregiões asseguram mais de 75% da produção nacional.

Dessas 43 microrregiões, apenas 4 estão fora do bloco São Paulo, Goiás, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais: duas no Paraná, uma em Alagoas e outra no Mato Grosso. Os estudos realizados apontam o contraste entre o crescimento da área cultivada com cana-de-açúcar e a queda na produtividade entre 2009 e 2019. Em 10 anos, houve um deslocamento territorial do cultivo para o Centro-Oeste, acompanhado de uma concentração territorial das áreas de produção nos estados líderes. A regressão das áreas cultivadas foi generalizada no Nordeste e no Rio de Janeiro. Essa pesquisa foi detalhada por microrregiões, e os processos determinantes na dinâmica territorial observada têm sido estudados. Os dados obtidos estão à disposição de eventuais interessados na Embrapa Territorial.