Diretor-geral do ONS
Op-AA-35
Em dezembro de 2012, a participação das usinas hidroelétricas na matriz de energia elétrica brasileira era de aproximadamente 78%; as usinas térmicas (carvão, gás natural, óleo, nuclear e biomassa) respondiam por cerca de 20%, e as eólicas, apenas 2%.
A matriz de energia elétrica é expandida, na sua maior parcela, por meio dos leilões públicos de energia nova para o Ambiente de Contratação Regulada - ACR, reaIizados pelo Ministério de Minas e Energia - MME, a ser contratada ao menor preço por todas as distribuidoras que declaram os montantes necessários de nova oferta para o atendimento do consumo de seus clientes cativos.
O governo também pode fazer leilões de energia de reserva, ou seja, independentemente das necessidades declaradas pelas empresas distribuidoras. Os leilões de energia de reserva estão baseados, em geral, na geração eólica e na biomassa de bagaço de cana-de-açúcar.
No contexto desse processo, nos próximos cinco anos, até 2017, a participação da geração térmica deverá evoluir para algo em torno de 31.000 MW, o que representará 22% da nossa capacidade instalada, já contratada na forma de leilões de energia nova. A realização, nos próximos anos, de outros leilões de energia nova (chamados de leilões A-3, realizados com três anos de antecedência em relação à entrada em operação) ainda poderá aumentar essa participação até 2017.
No horizonte 2013/2017, o destaque é o crescimento da participação das usinas eólicas, que atingirão o montante de cerca de 8.300 MW, o que representará um aumento de aproximadamente 325%, representando 5,7% da nossa matriz de energia elétrica. Historicamente, nossa matriz sempre teve predominância da hidroeletricidade e, em razão do regime altamente sazonal dos nossos rios, com abundância de água em cada estação chuvosa (entre novembro e abril) e recessão em cada estação seca (entre maio e outubro), foram construídos importantes reservatórios de acumulação plurianual de água, justamente para compensar essa diferença de períodos das chuvas. Assim, a água guardada no período chuvoso vira energia na estação seca, podendo, inclusive, ser utilizada nos anos seguintes.
Merece destaque também a complementaridade hidrológica entre as regiões do País, razão pela qual as extensas linhas de transmissão – hoje em torno de 100.000 km em tensão igual ou superior a 230 kV, conhecida como Rede Básica do Sistema Interligado Nacional (SIN) – cumprem importante função de firmar energia no sistema, como se fossem usinas virtuais. Essa característica peculiar do SIN permite, inclusive, a postergação de investimentos em nova geração de energia, o que não seria possível sem um sistema de transmissão que interconectasse todo o território nacional e sem a atuação de uma organização como o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que coordenasse o despacho hidrotérmico buscando o atendimento à demanda ao menor custo com confiabilidade.
Já nas últimas décadas, as exigências ambientais para a construção de novos reservatórios de acumulação tornaram praticamente inviável a construção de usinas hidrelétricas de regularização. Com isso, a maioria das novas usinas passou a ser o que se conhece por usina "a fio d'água", ou seja, só geram energia elétrica com a água que chega, não podendo estocar os excedentes na estação chuvosa, gerando menos na estação seca.
Esse novo paradigma da matriz brasileira exigiu (e exigirá) a construção das chamadas fontes complementares, ou seja, aquelas que compensam a baixa geração hidrelétrica nas estações secas, tais como as usinas a biomassa, que geram na safra da cana-de-açúcar, entre maio e outubro, as usinas eólicas, que apresentam maior disponibilidade de ventos na estação seca, e as usinas térmicas convencionais (gás natural, nuclear, carvão e óleo), que, em princípio, mantidas as condições de logística de entrega e disponibilidade do combustível, apresentam uma boa previsibilidade de operação e, dependendo do montante instalado, representam um "seguro" importante para o SIN em condições de secas mais severas.
Esse é o grande trade-off que a sociedade brasileira terá de enfrentar: ou se decide pela construção de reservatórios de acumulação de água, mesmo com menor capacidade de acumulação do que aqueles construídos em décadas passadas, para se precaver de secas severas, ou serão necessariamente construídas novas usinas térmicas, para não ficarmos tão dependente das estações chuvosas e, com isso, reenchermos nossos reservatórios de acumulação, para que possamos garantir o atendimento à demanda, mesmo nas condições hidrológicas não favoráveis em períodos úmidos.
Com o objetivo de viabilizar a agregação de fontes térmicas convencionais, torna-se necessário, em função da localidade e da disponibilidade dos recursos naturais, promover leilões regionais por fontes. Dessa forma, seria equacionada a questão de diferentes riscos hidrológicos regionais, como é o caso da região Sul, e reduzida a extensão da rede de transmissão.
Logicamente, as usinas eólicas e, futuramente, as solares são alternativas bastante interessantes para diversificar nossa matriz de produção, mas são fontes intermitentes, ou seja, em algum momento, deixa de ventar ou o sol não é suficiente para manter a geração instalada. Nesses momentos, outros recursos têm de estar prontamente disponíveis para que os consumidores de energia sejam plenamente atendidos, o que conduz à implantação de usinas termelétricas convencionais.
Hoje, esse é um dos maiores desafios do setor elétrico brasileiro. Como conviver com as fontes intermitentes quando elas atingirem participação significativa na nossa matriz de produção? Vemos duas alternativas: ou instalamos usinas térmicas a óleo para imediatamente serem acionadas (usinas de backup), e, assim mesmo, alguma parcela já deveria ficar ligada como reserva girante, que é uma geração que pode ser instantaneamente utilizada, ou deixamos essa reserva por conta de usinas hidráulicas, bem mais rápidas para o aumento instantâneo de sua geração, desde que tenhamos água suficiente para que essa oferta maior seja atingida, ou seja, é fundamental que as novas hidrelétricas tenham reservatórios de acumulação.
Para energias renováveis não convencionais, entendemos por pertinente a busca da expansão que leve em conta o mínimo custo global, observando conjuntamente as opções de geração e os investimentos associados em transmissão. Esse aspecto da transmissão seria identificado com antecedência, alocando-se preferencialmente a geração nas localidades em que menos se necessitaria da expansão das redes de transmissão e distribuição.
Diversificar a matriz é muito importante para o País. É uma diretriz que irá permitir preparar a indústria de energia elétrica para o dia em que nosso potencial hidrelétrico esteja todo aproveitado (só exploramos, até hoje, cerca de 30% do economicamente aproveitável). Portanto todas as fontes de energia serão sempre bem-vindas, mas a equação de responsabilidade ambiental tem um custo para a sociedade, e, em última instância, caberá a ela eleger a solução que irá pautar o desenvolvimento econômico do País de forma sustentável, contribuindo para a modicidade tarifária e reduzindo as desigualdades sociais.