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Arnaldo Jardim

Deputado federal, vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária e presidente da Comissão Especial de Transição Energética

OpAA83

O combustível do futuro
Em meio à discussão sobre a exploração da Margem Equatorial, o Congresso Nacional fortaleceu, com a aprovação da Lei do Combustível do Futuro, as bases para um desenvolvimento econômico ainda mais sustentável.
 
Localizada entre Amapá e o Rio Grande do Norte, a Margem Equatorial é considerada uma região de elevado potencial petrolífero, especialmente depois das descobertas de petróleo e gás natural por Colômbia, Guiana, Guiana Francesa e do Suriname – países fronteiriços. Com reservas que podem chegar a 10 bilhões de barris, a Margem é a principal aposta da Petrobras após o esgotamento do pré-sal. Para o Governo é mais uma oportunidade de fortalecer a economia, trazer novos investimentos e gerar empregos.
 
Apesar de toda a riqueza gerada, há sempre uma polêmica quanto ao potencial da indústria petrolífera de desenvolver regiões em que se localiza, em grande medida por ser uma atividade que provoca fracos encadeamentos com demais setores produtivos e cujas elevadas receitas inibem a diversificação da economia. Pode-se dizer que o petróleo enriquece nações, mas nem sempre essa riqueza implica em prosperidade econômica e social para a população. A Noruega e a Venezuela são dois exemplos extremos que nos ajudam a corroborar esta afirmação.

Em 2006, a Petrobras anunciou a descoberta do pré-sal, transformando o Brasil no oitavo maior produtor de petróleo do mundo e o primeiro da América Latina. Para explorar a gigantesca jazida petrolífera, a empresa foi imediatamente capitalizada pela União com a promessa de que a riqueza gerada alimentaria o Fundo Soberano Nacional, criado pela Lei nº 11.887/2008, cujos recursos garantiriam investimentos em saúde e educação e, principalmente, na redução da desigualdade. 

Passadas duas décadas, a produção de petróleo cresceu, e muito, saltando de 1,7 milhão de barris/dia, em 2006, para 4,3 milhões de barris diários, em 2024, dos quais 78% foram provenientes dos reservatórios do pré-sal. Os investimentos em áreas prioritárias, entretanto, não se concretizaram e, em 2019, o Fundo foi extinto pela MP 830/18 para que seus recursos fossem utilizados no pagamento da dívida pública. O que se viu, na verdade, foi a criação de ilhas de riqueza pelo país sem melhorias expressivas em seu IDH, como é o caso do Norte Fluminense, onde encontramos prefeituras muito ricas e regiões muito pobres.

Estudos demonstram que a expansão da indústria do petróleo no estado do Rio de Janeiro promoveu o deslocamento da população rural para as cidades litorâneas, onde encontraram mercado de trabalho com poucas oportunidades para trabalhadores desqualificados.

Além disso, os salários mais altos praticados pelo setor inflaram os preços locais de bens e serviços, promovendo um aumento significativo no custo de vida na região. O petróleo, além de não oferecer alternativas de emprego sustentáveis no longo prazo, pode prejudicar gravemente as condições de vida da população se seus recursos não forem utilizados para diversificar e fortalecer a economia local.

Em contraste a um modelo de exploração com pouco efeito multiplicador, que gera pouco emprego e concentrador de riqueza na mão de petroleiras e de governos, mais preocupados em aumentar os gastos do que em investir em alternativas futuras, temos a indústria do biocombustível tão eficiente na produção de combustíveis renováveis quanto a Petrobras na perfuração de poços profundos e que promove desenvolvimento e industrialização nas regiões mais interioranas do país.

Depois de 60 anos produzindo biocombustíveis, o Brasil acumulou conhecimento suficiente para revolucionar o setor. Em 2024, quebramos, mais uma vez, recorde na produção de etanol, totalizando 36,8 bilhões de litros. São 345 unidades produtoras de etanol de cana e 22 unidades de milho em funcionamento, distribuídas em mais de 1200 municípios brasileiros. 
 
No Biodiesel, mais uma marca histórica com a produção de 9,1 bilhões de litros e um parque industrial que conta, atualmente, com 68 usinas, presentes em todas as regiões do país. Os benefícios econômicos e sociais dessa produção podem ser traduzidos em números. Segundo a Unica, o setor sucroenergético gera mais de 730 mil empregos diretos e, somados os empregos indiretos, são cerca de 2,2 milhões de empregados na cadeia da cana-de-açúcar. Conforme a entidade, a existência de uma planta de etanol no município eleva o PIB médio per capita no ano de instalação da usina em US$ 1.098, enquanto o das 15 cidades mais próximas tem acréscimo médio de US$ 458.
 
A produção do biodiesel é igualmente virtuosa. Atualmente, há, aproximadamente, 76 mil famílias contratadas no PNPB (Programa Nacional de Produção e Uso de Biodiesel), que promove a inclusão da agricultura familiar por meio do Selo Combustível Social. São mais de 200.000 empregos diretos e melhoria na renda das famílias beneficiadas. O Brasil já substitui 50% da gasolina consumida e 14% do diesel fóssil.  

Tudo isso, antes mesmo de a Lei do Combustível do futuro, que tive a honra de relatar, produzir seus efeitos e ampliar ainda mais a participação dos biocombustíveis na matriz energética nacional. Estimam-se investimentos da ordem de 200 bilhões de reais para a produção dos já consagrados etanol e biodiesel e para fomentar a produção de SAF (Sustainable Aviation Fuel), Diesel Verde, Biometano e combustíveis sintéticos. Segundo Ministério de Minas e Energia – MME, com o aumento de etanol na mistura, de 27% para 30%, acabaremos com a nossa dependência da importação de gasolina A.

Não sou contra a exploração da Margem Equatorial, cujos recursos, se bem aplicados, podem, sim, mudar o patamar de desenvolvimento do Brasil. Difícil é entender, considerando o efeito multiplicador da cadeia de produção dos biocombustíveis, o porquê da distribuição tão irregular dos subsídios do governo federal ao setor de energia. Dos R$ 99,81 bilhões destinados em 2023, R$ 81,74 bilhões (82%) foram alocados para o petróleo e gás, enquanto R$ 18,06 bilhões (18%) foram destinados às energias renováveis.

O potencial do Brasil para a produção de combustíveis renováveis é gigantesco. Podem ser produzidos 9 bilhões de SAF, suficientes para atender ao mercado interno e demanda internacional, e 120 milhões de m³/dia, que substituirão até 70% do diesel consumido no país. Precisamos aumentar os investimentos e explorar esses atributos. 

O petróleo certamente vai acabar, e somente os países que investiram em um modelo mais sustentável poderão ser protagonistas da nova economia.