Gestor de risco em commodities agricolas da Archer Consulting
Op-AA-40
Os desmandos foram muitos; as incertezas, então... Agora, o setor colhe as agruras das decisões (não) tomadas pelo governo, e o que se descortina não é o melhor dos mundos para o setor sucroenergético, que foi deixado à própria sorte, não é de hoje. Tarde demais? O fato é que a crise está aí, e sobrevive quem puder...
Iludido. Essa é a palavra que define o setor, que entrou na onda do então presidente Lula, quando este levantou a bandeira do etanol como o ouro verde brasileiro, o combustível renovável. Em 2007, Lula chegou a batizar o Brasil como a Arábia Saudita do Etanol. Muitos empresários pularam de cabeça nesse delírio, investiram o que tinham e o que não tinham para expandir suas usinas e construir novas unidades.
O que se descortinou depois foi o show de horrores. Lula deu uma rasteira no setor assim que descobriu o pré-sal, talvez já se imaginando com o mesmo poder totalitário do seu guru Chavez, afundando a Petrobras e dilapidando o valor da empresa que, desde que o PT assumiu o poder, perdeu mais de 58% do seu valor e, hoje, assiste a seu nome ser jogado na lama, imerso em escândalos de corrupção estampados nas páginas policiais.
Retornando ao ano de 2005, quando ainda sonhávamos com o etanol como a solução mundial para os combustíveis do futuro, o Brasil produzia 16 bilhões de litros de etanol, enquanto os Estados Unidos chegavam a uma produção de 14 bilhões de litros.
O então presidente George W. Bush determinou prazos para que o volume de produção de etanol fosse aumentado para que o país dependesse menos de combustíveis fósseis. No ano seguinte, capitaneados pelo Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), uma comissão foi formada para traçar um programa detalhado a ser colocado em prática com metas que se estendiam até 2060.
No ano passado, o Brasil produziu pouco mais 27 bilhões de litros de etanol, enquanto os Estados Unidos chegaram à marca de 56 bilhões de litros de etanol de milho. Em oito anos, crescemos 7% ao ano, e os americanos cresceram 19%. Debates sobre subsídios aos produtores de milho à parte, o fato é que os EUA planejaram e executaram.
Aqui, a classe política é boa mesmo de oba-oba. Planejamento é algo muito enfadonho e não angaria votos. E execução depende de gente competente. Sem mencionar aqui que, quando finalmente conseguimos derrubar as barreiras alfandegárias americanas contra a importação de etanol brasileiro, após anos de conversas e debates, vimo-nos na situação de importadores de etanol de milho dos Estados Unidos, motivados pela queda de produção de cana por dois anos seguidos.
Ou seja, o setor pode se esforçar para se inovar, trabalhar com afinco para superar as adversidades, mas conta com a incompetência e a interferência nociva do governo. Vale reforçar, novamente como um mantra, que o setor não precisa de subsídios por parte do governo; bastaria que ele interferisse o mínimo possível e deixasse vingar a lei da oferta e procura.
É assim com qualquer commodity. O produtor de soja conhece bem isso. O produtor de café também. O setor sucroalcooleiro, na parte que se refere ao açúcar, igualmente. Mas, quanto ao etanol, não tem como se proteger contra variações negativas de preços. Como o preço do etanol está vinculado ao preço da gasolina e este depende da canetada de Dilma ou Mantega, o setor fica a ver navios.
A falta de comprometimento por parte do Governo Federal, que procura focar apenas na sua perpetuidade no poder e que se dane o resto, colocou em risco mais do que iminente a sobrevivência do setor sucroalcooleiro. Parcela significativa das usinas está em situação financeira alarmante por ter acreditado no projeto de combustível renovável – que até poderia ter dado certo, não fossem os devaneios e mania de grandeza de Lula, seguido pela grotesca falta de visão e incompetência de sua pupila no poder.
A Agência Nacional do Petróleo (ANP) divulgou, recentemente, o consumo total de combustíveis no mês de fevereiro de 2014. No acumulado de doze meses (março/2013-fevereiro/2014), 31,8 bilhões de litros de gasolina A (sem mistura) foram consumidos – um acréscimo de apenas 0,25% em relação ao mesmo período do ano passado. Já o etanol mostrou um consumo de 11,1 bilhões de litros para o hidratado e 10,1 bilhões de litros para o anidro – aumento significativo em bases anuais de 14,3% e 28%, respectivamente.
No total, o consumo de combustíveis atingiu a marca de 53 bilhões de litros, 7,47% de acréscimo em relação ao ano anterior. Nesse ritmo, assumindo que tudo o mais permaneça inalterado, nos próximos quatro anos, ou seja, até a safra 2017/2018, apenas para atender ao consumo de combustíveis, que deverá somar 17,4 bilhões de litros adicionais no somatório das próximas quatro safras, somente a região produtora do Centro-Sul precisaria crescer 50 milhões de toneladas de cana – algo em torno de 9% ao ano, ou seja, grosso modo, um investimento anual de US$ 7,5 bilhões.
Isso dá uma ideia de como o setor sucroalcooleiro poderia crescer e como se tornaria uma indústria mundialmente pujante; mas, amargando os erros de decisões tomadas a canetadas por um governo populista, dificilmente o setor conseguirá crescer no ritmo esperado. E, tudo isso, graças à falta de competência da equipe da presidente atual, que desconhece o funcionamento básico do mercado de commodities.
Está cada vez mais difícil encontrar, no atual governo, gente comprometida com o desenvolvimento do País. O PT só tem projeto de poder e, para se perpetuar nele, vale tudo, inclusive destruir a Petrobras. Com a desculpa estapafúrdia de conter a inflação e uma visão míope sobre economia, mercado internacional e política, em uma das decisões mais erradas, o governo optou por não permitir os reajustes de preços da gasolina ao consumidor, em linha com o mercado internacional.
O problema é que a sangria provocada na estatal não se circunscreve apenas à empresa. Ela provoca reações em cadeia que produzem efeitos em outros mercados, entre eles o sucroalcooleiro. E, agora, quando lemos as manchetes que afundam a imagem da estatal do petróleo em escândalos, pergunto: alguém ainda acha que esse governo tem um pingo de seriedade para se importar com o que está ocorrendo com o setor sucroalcooleiro?