É inimaginável que um governo, em uma de suas mais importantes atribuições para as quais fora eleito, consiga, com um único tiro, destruir duas das mais importantes indústrias desse País. Esse feito inigualável no mundo moderno foi conseguido pelo governo anterior, ao promover o congelamento dos preços dos combustíveis, com o objetivo de controlar a escalada da inflação.
O resultado não poderia ser pior. Não só não controlou a inflação, como trouxe um enorme prejuízo às contas da Petrobras e quase arruinou o setor sucroalcooleiro, que acabara de finalizar um importante ciclo de crescimento, resultando em um alto endividamento, e sem nenhuma capacidade de investimento. Com a Petrobras não foi diferente, ainda catalisado pelos desmandos da gestão da empresa, escancarados pela Operação Lava Jato.
Dentre esses e outros legados negativos desse período, o mais preocupante é a estagnação da nossa produção de etanol e de gasolina A, enquanto o mercado dá claros sinais de que vai aumentar significativamente a demanda por combustíveis líquidos no País nos próximos anos. Hoje estamos discutindo um importante programa de abastecimento de combustíveis em meio a uma situação bastante precária entre os principais agentes desse processo.
A estagnação dos investimentos em nossa indústria transformou o País em um dos maiores importadores de combustíveis da atualidade. Importamos quase todos os derivados de petróleo, e ainda uma boa quantidade de etanol. Novos desafios se avizinham em nosso horizonte. O País voltará a crescer, e, com isso, a demanda por combustíveis se tornará muito forte. É a hora de planejarmos esse novo momento de forma organizada, racional e com a mínima intervenção de mercado.
É um desafio imenso, e precisaremos contar com o entendimento de todos os agentes da cadeia de suprimento para que possamos criar um ambiente propício aos novos investimentos, com segurança jurídica, baseada nos marcos regulatórios do programa. O trabalho encabeçado pelo Ministério de Minas e Energia contou com o apoio de toda a cadeia produtiva, incluindo a Petrobras, produtores do setor sucroalcooleiro, produtores de bioadiesel, importadores, distribuidores, terminais, transportadores, revenda e os consumidores, além de todas as esferas do Governo Federal. É um programa que nasce com um apoio maciço de toda a sociedade organizada.
Esse programa sem precedentes tem como cerne a redução gradativa das emissões do conjunto de nossa matriz de combustíveis e a garantia do abastecimento. A diferença principal dos modelos existentes, é que esse processo envolve o consumo direto de um combustível, e não apenas um aditivo, como os demais programas ao redor do mundo. Essa particularidade consiste em ajustar o consumo de um combustível renovável direto nas bombas, de forma competitiva com o derivado de petróleo, trazendo um desafio ainda maior.
As condições de competitividade dos produtos devem estar sempre presentes na escolha do combustível por parte dos consumidores, que, em última instância, decidirão qual produto será consumido em cada região. Sendo assim, o sucesso do programa depende de uma estrutura técnica muito bem fundamentada para que possa funcionar de forma efetiva, e cumprir com as suas diretrizes primárias.
Os investimentos são enormes e as dificuldades não previstas surgirão, pois estamos falando de um produto agrícola concorrendo na bomba com uma commodity mineral extrativa. A interferência indireta do mercado de açúcar e também do câmbio, apenas para simplificarmos as interfaces que um programa desse porte traz, com certeza serão uma prova de fogo para o sucesso do programa.
O setor sucroalcooleiro está em um processo de lenta recuperação e não faltará o comprometimento com o programa para que se possa superar as barreiras que ainda enfrentaremos. É um ótimo momento para reconstruirmos em bases sólidas essa indústria tão importante para o País, e o RenovaBio contribuirá com esse objetivo.
O RenovaBio é o hoje o programa mais ambicioso em curso no País, pois trata-se de nossa segurança energética, que gerará investimentos em infraestrutura, novas usinas, novas fábricas, novas fronteiras agrícolas e, principalmente, milhares de novos empregos altamente qualificados, além de alavancar toda a cadeia complementar do setor sucroalcooleiro.
O RenovaBio é um programa que permitirá a convivência harmoniosa e de forma sustentável entre a indústria sucroalcooleira, a indústria do biodiesel e as demais fontes renováveis junto com a indústria petroleira, em uma visão de complementariedade da oferta da cadeia de suprimento.
Temos um País continental e uma diversidade energética, que precisa ser otimizada. Poderemos ter o que há de melhor de cada combustível, propiciando um desenvolvimento regional bastante sustentável. O sucesso do programa demandará a construção de novas refinarias e usinas de etanol e biodiesel, e poderá se dar de forma a não gerar custos adicionais ao sistema, respeitando a vocação e potencialidade de cada região.
A questão mais desafiadora do programa RenovaBio será a efetivação das metas apresentadas ao longo de seu horizonte. Os constantes desequilíbrios entre as principais commodities será talvez o maior obstáculo a ser superado. A flexibilidade da indústria sucroalcooleira brasileira, pela facilidade com que modificamos o mix de produção entre açúcar e etanol, poderá tornar-se um fator de desestabilização se o programa não estiver preparado para manter a oferta nesses períodos de pressão dos preços internacionais.
Esse é o preço que o setor terá de pagar para garantir a oferta de etanol de forma contínua e crescente ao longo do horizonte do programa. Não podemos cair na tentação dos resultados de curto prazo. Se o modelo for bem estruturado haverá sempre margens para aumentarmos a oferta de etanol e de açúcar, e, principalmente, da cana-de-açúcar, sem que haja a migração desordenada entre os produtos.
A estruturação do programa deve ser consistente para que estejamos preparados para as adversidades que virão, não somente dos preços internacionais do açúcar e do câmbio, mas principalmente pela alta volatilidade dos preços do petróleo. A Petrobras está fazendo um importante trabalho ao alinhar os preços de seus derivados produzidos em suas refinarias do Brasil com os preços internacionais. Isto tem trazido uma pequena porção do universo no qual invariavelmente estaremos inseridos, com ou sem o RenovaBio.
O RenovaBio é a ferramenta que dará o equilíbrio entre produtos tão distintos que competem nas bombas de todo o País. A estrutura tributária atual já nos coloca no caminho certo, embora ainda precise de alguns ajustes, que certamente ajudarão a composição dos valores justos e corretos dos certificados que embasam a estrutura do RenovaBio.
Todos estamos com as mentes abertas e a boa vontade de implementarmos um programa de Estado que ajudará em muito as novas gerações e contribuirá de forma objetiva com o tão almejado crescimento sustentável desse País.