Senador da República Federativa do Brasil
Op-AA-34
Quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva venceu as eleições presidenciais em 2002, havia muitas expectativas em relação ao seu governo. Ao longo dos oito anos de mandato, muitas das promessas de campanhas foram cumpridas, outras, frustradas, ações inovadoras foram empreendidas, porém, certamente, poucos poderiam imaginar que o ex-metalúrgico, ex-líder sindical, já em seu segundo mandato, chamaria os usineiros do setor sucroalcooleiro de heróis nacionais.
Naquela ocasião, no início de 2007, Lula exaltava a atenção que o etanol vinha adquirindo no cenário internacional e destacava o fato de o seu governo possuir uma política séria para o setor. Em verdade, o ex-presidente fez muito mais do que elogiar: além de incentivar a produção nacional de álcool, viajou pelo mundo promovendo o etanol brasileiro e buscando novos mercados para o produto nacional. Em março do mesmo ano, durante a visita do ex-presidente George W. Bush ao País, Lula assinou um acordo de cooperação em etanol com os EUA, o que selou uma parceria estratégica entre os dois países, que detinham mais de 70% da produção mundial do combustível.
É forçoso reconhecer que, a partir da segunda metade da década passada, a conjuntura mundial era outra. Havia viabilidade econômica e política para o avanço dos biocombustíveis. O preço do petróleo crescia de forma consistente, desde o início do governo Lula, superando o patamar de US$ 40 o barril, em meados de 2004 – preço em que se torna competitivo o etanol brasileiro. Em 2007, o barril salta de US$ 65 no começo do ano para quase US$ 100 em dezembro.
Em 11 de julho de 2008, o barril do petróleo Brent atinge US$ 143,95. Além da atratividade financeira, havia também, nos idos de 2007, grande motivação política em favor do etanol, afinal, no mesmo ano, foi apresentado o Quarto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas – IPCC, afirmando que o homem é responsável pela elevação da temperatura do planeta. A terceira parte do documento mostrou que é possível deter o aquecimento global se a humanidade reduzir de 50% a 85% as emissões de dióxido de carbono (CO2) até a metade do século.
Para tanto, sugeriu o investimento em energias limpas e a diversificação da matriz com fontes renováveis não convencionais, como biomassa, eólica e solar. O IPCC indicou também o uso de veículos mais eficientes como uma maneira de reduzir as emissões no setor de transportes, principalmente se abastecidos com biocombustíveis como o álcool ou o biodiesel.
Diante de tantos incentivos, o etanol tornou-se quase unanimidade, e o Brasil passou a ser visto como líder mundial em combustíveis renováveis e exemplo de matriz energética limpa. Falou-se, inclusive, em tornar o etanol uma commodity mundial.
Com todo esse sucesso, vieram as críticas e os questionamentos promovidos, em grande parte, pelos setores ameaçados pelo avanço do etanol. Primeiramente, acusou-se a indústria sucroalcooleira de promover o desmatamento da Amazônia para plantar cana-de-açúcar.
Em seguida, as relações trabalhistas no setor foram questionadas e, por fim, veio a acusação de que a produção de etanol promovia a concorrência entre alimentos e combustíveis.
O governo brasileiro trabalhou de forma intensa para responder a cada um dos óbices apresentados ao etanol. Foi elaborado e aprovado o zoneamento agroecológico para a cana-de-açúcar, o qual veta o plantio da cultura nos biomas Amazônia e Pantanal.
Foram criadas leis, algumas delas estaduais, definindo prazo para a mecanização integral das lavouras de cana. E ainda foram apresentados números que evidenciaram o equívoco de acusar o etanol brasileiro de competir com a produção de alimentos.
Por iniciativa do Presidente Lula, o Brasil se dispõe a organizar, em 2008, uma conferência internacional para tratar dos biocombustíveis. Seria, na avaliação do governo brasileiro, a oportunidade de responder a todos os questionamentos e consolidar a opção dos biocombustíveis como parte da solução contra o aquecimento global.
Dessa forma, em novembro de 2008, ocorre, na cidade de São Paulo, a “Conferência Internacional sobre Biocombustíveis: os biocombustíveis como vetor do desenvolvimento sustentável”. Antes, porém, na manhã do dia 15 de setembro de 2008, o banco de negócios Lehman Brothers, então o quarto maior dos Estados Unidos, surpreendeu o mundo ao anunciar a sua quebra. Iniciava-se a pior crise econômica internacional desde 1929. Com ela, a trajetória recente do etanol e, por consequência, do setor sucroalcooleiro nacional começava a mudar.
A fraca repercussão do tão esperado evento de São Paulo já dava mostras do tamanho da crise mundial e do impacto que produziria em todos os setores de energia renovável. O barril do petróleo caiu, em 2009, abaixo dos US$ 50, reduzindo, significativamente, a atratividade do etanol e das demais fontes alternativas de energia. Em seguida, quando a crise econômica dificultou o acesso ao crédito, o setor sucroalcooleiro passou a perder fôlego.
No ano passado, a produção de cana, depois de anos subindo a um ritmo de 10,4%, caiu a 550 milhões de toneladas, deixando 150 milhões de toneladas de capacidade ociosa nas usinas. Por mais inusitado que possa parecer, o Brasil passou de exportador a importador de etanol e justamente no momento em que a indústria nacional logrou êxito numa de suas batalhas comerciais mais antigas: o fim das barreiras alfandegárias para a entrada do produto nacional nos EUA.
Depois de ter sido considerado o propulsor do etanol no mundo, o Brasil agora vive uma fase de retrocesso no setor. Além das dificuldades externas, o etanol brasileiro tem enfrentado perdas de produtividade, devido aos severos problemas climáticos e aos aumentos acentuados nos custos de produção, sem falar na incapacidade de competir com os preços da gasolina no mercado doméstico.
São conhecidos os problemas e são necessárias soluções. É impensável negligenciar um setor em que o País possui tanta capacidade e experiência. Todos os predicados que levaram o etanol a ser visto como opção extraordinária de energia limpa e renovável em 2007 permanecem atuais. Os desafios com o aquecimento global se mantêm.
A capacidade de gerar renda em países pobres permanece, e até mesmo o preço do barril de petróleo voltou a atingir valores superiores aos US$ 100. Mais do que isso tudo, o Brasil continua sendo detentor da tecnologia mais avançada existente no setor.
A cana-de-açúcar continua sendo o insumo mais vantajoso para a produção de combustíveis renováveis.
É capaz de produzir etanol, açúcar e, ainda, com a queima do bagaço, gerar energia elétrica além da necessidade de operação de qualquer usina, tornando-se, inclusive, uma verdadeira alternativa para a nossa matriz energética.
É preciso voltar a tratar o etanol de forma estratégica, pensando o setor no médio e longo prazo. Todos os agentes envolvidos devem, o quanto antes, sentar-se à mesa, buscar soluções para os problemas imediatos e planejar o futuro.
O Governo Federal deve liderar esse processo, e o setor produtivo deve unificar o seu discurso. Não há espaço, diante da urgência do assunto, para ações isoladas ou para soluções pontuais. A indústria sucroalcooleira do País deve se unir e buscar uma agenda prioritária, comum a todos os produtores, independentemente da sua região. O etanol proporciona ao País ganhos econômicos e sociais e promove, mundialmente, a sustentabilidade ambiental. O Brasil ainda é um dos principais líderes nesse setor. É nossa responsabilidade trabalharmos para continuar assim.