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Evandro Gussi

Presidente da Unica - União da Indústria de Cana-de-açúcar

OpAA72

A expansão internacional do etanol como solução de baixo carbono
Ao longo da história, o etanol tem sido estratégico em situações adversas. Basta dizer que seu primeiro grande salto no Brasil se deu com o Proálcool, principalmente para garantir o abastecimento em um cenário de escassez. Contudo, sua principal característica foi percebida apenas décadas depois: em um mundo aflito pelos efeitos das mudanças climáticas, percebeu-se que o etanol era capaz de reduzir até 90% das emissões de gases de efeito estufa (GEE), contribuindo, assim, para a mobilidade sustentável. Tudo isso ganhou ainda mais sentido a partir do Acordo de Paris. 
 
Na 21ª Conferência do Clima, em 2015, tornou-se evidente que as ações para reduzir o aquecimento global abrangeriam, necessariamente, a descarbonização do setor de transportes, responsável por quase 25% das emissões. Nessa perspectiva, a experiência consolidada do Brasil, em mais de 40 anos com o etanol, apresenta não apenas uma alternativa energética à gasolina, mas uma solução viável e eficiente para uma das maiores demandas globais – a mitigação da crise climática. A mistura de etanol na gasolina, quando adotada por meio de políticas públicas claras e de longo prazo, pode proporcionar diminuição imediata das emissões no setor automotivo. 

Ao lado da sua contribuição para evitarmos o aquecimento global, o etanol também proporcionou uma bem-sucedida experiência para o controle das emissões de poluentes. É conhecida a sua contribuição, por exemplo, para que a cidade de São Paulo, quarta mais populosa do mundo, seja hoje uma das metrópoles com o menor nível de poluição atmosférica. 
 
Em 2021, a cidade ocupou o 1.779º lugar na lista da IQAir, plataforma que monitora e ranqueia a qualidade do ar dos municípios ao redor do globo. De volta ao tema dos GEE, a presença de 27% do biocombustível na gasolina brasileira garante a redução de 15% nessas emissões. Já o etanol hidratado emite até 90% menos CO2 do que o combustível fóssil. Atualmente, cerca de 46% do consumo de combustível para o ciclo Otto é suprido por etanol, graças à tecnologia flex fuel, presente no País desde 2003. 
 
Em consequência, o uso do etanol no País evitou, nas duas últimas décadas, que mais de 600 milhões de toneladas de CO2eq fossem lançados na atmosfera. Esse volume representa emissões anuais somadas da Argentina, Venezuela, Chile, Colômbia, Uruguai e Paraguai. A título de ilustração, para atingir a mesma economia de CO2eq, seria preciso plantar mais de quatro bilhões de árvores nativas nos próximos 20 anos. 
 
Diante dessas evidências, o Reino Unido decidiu, no ano passado, ampliar a mistura de etanol à gasolina de 5% para 10%, e mais de 60 países adotam ações semelhantes visando melhorar a qualidade do ar. Com um número cada vez maior de países consumindo e produzindo biocombustíveis, temos a oportunidade de transformar o etanol em commodity.
 
Por isso a importância das ações que estimulem os programas nacionais, o que permitiria maiores ganhos de escala, tanto na produção quanto na segurança energética de baixo carbono. Em 2020, iniciamos uma intensa cooperação técnica com a Índia. Desde então, o governo indiano autorizou a venda de etanol puro (E-100) nos postos de combustíveis. Também antecipou em cinco anos, para 2025, a meta de 20% de mistura de etanol no combustível, coroando a sólida parceria que temos desenvolvido com o país asiático. 
 
Com a medida, o consumo de etanol na Índia deve se aproximar de 6 bilhões de litros por ano, com um incremento de 4,11 bilhões de litros se comparado com o consumo atual, tomando como base os dados do EIA (U.S. Energy Information Administration). A decisão da Índia é um passo fundamental para a consolidação do programa no país, gerando benefícios ambientais, econômicos e de saúde pública. Também configura importante conquista no esforço de globalização do etanol, para o que temos nos empenhado, apresentando, em conferências e missões internacionais, o potencial do biocombustível e de suas externalidades positivas.

Passado o período mais preocupante da pandemia por Covid-19, seguimos ampliando o conhecimento sobre o etanol em diversos países. Da Ásia aos nossos vizinhos da América Latina. Demos início, em fevereiro, aos preparativos para uma importante missão para a Guatemala, com o objetivo de promover a produção e o consumo do etanol, como alternativa já testada e economicamente viável para a descarbonização do transporte. A agenda está avançando no país. 

E seguimos o debate no Sustainable Mobility: Ethanol Talks Guatemala, evento promovido em parceria com a APLA, APEX e MRE, para discutir o biocombustível, a exemplo da cooperação com a Ásia. 

Em seguida, partiremos para outros países da América Latina, pois queremos contribuir para a oferta de alternativas sólidas para a redução de emissões de GEE. Nesse contexto, as melhores tecnologias devem ser selecionadas de acordo com as características de cada região: potencial de produção, disponibilidade de infraestruturas, geração de emprego, condições econômicas, entre outros. 
 
Nesse sentido, devemos considerar o potencial da África como a nova fronteira para o etanol no mundo. Com incentivos institucionais adequados, países com forte tradição na produção de açúcar podem desenvolver um programa bem-sucedido para a produção do biocombustível. 

Além de gerar mais empregos e renda no campo, a atividade reduziria a dependência dos combustíveis fósseis e melhoraria a balança comercial, seja pela redução das importações de derivados de petróleo ou por meio das exportações do etanol excedente.
 
Esse cenário aponta um processo de grandes avanços nos próximos anos. Temos espaço para a cultura do “e”, da soma de fontes energéticas renováveis e de diferentes rotas tecnológicas, em lugar de “a ou b”. A redução de emissões de CO2eq é um desafio global, e teremos que dispor de todas as tecnologias para atingir esse objetivo.